A rentabilidade e as garantias de demanda do Trem de Alta Velocidade (TAV) entre São Paulo e Rio ainda geram dúvidas para as empresas detentoras de tecnologia para o trem-bala e demais interessados em participar do projeto. Representantes de grupos que pretendem formar consórcios para participar do edital marcado para 29 de julho afirmaram nesta segunda-feira (18), durante seminário na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que têm encontrado dificuldade para atrair investidores.
“Temos grande interesse nesse projeto, queremos contribuir para que esse seja um projeto nipo-brasileiro simbólico, mas para fazer isso temos que ter uma liderança e parceria com empresas locais”, disse Kazuhisa Ota, diretor da Mitsui, que está coordenando a formação do consórcio de empresas japonesas que pretendem disputar a concorrência com a oferta da tecnologia do sistema Shinkansen, em operação no Japão desde 1964.
“O principal problema hoje ainda são as garantias de demanda e os riscos financeiros do empreendimento”, afirmou Marco Missawa, da alemã Siemens, que já vendeu projetos de trens de alta velocidade para países como China, Rússia, Espanha e Reino Unido.
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“É um projeto diferente em muitos aspectos e as empresas brasileiras têm certa preocupação de entrar”, acrescentou Paulo Benites, do Grupo Trends, empresa brasileira que se associou a um grupo de empresas coreanas, que desenvolveram uma tecnologia própria a partir do modelo da francesa Alston.
Cinco grupos internacionais interessados
Segundo o diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Bernardo Figueiredo, que também participou do seminário “Trem de Alta Velocidade”, pelo menos cinco empresas internacionais já demonstraram interesse em participar do projeto.
“Nós temos tecnologia alemã, francesa, japonesa, coreana e a espanhola. Essas cinco querem participar, estão discutindo, estão fazendo propostas e estão negociando”, disse. Pelas regras do edital, vencerá a concorrência o consórcio que oferecer a menor tarifa. A ANTT espera atrair pelo menos três consórcios.
O projeto, de 500 quilômetros de extensão, prevê a interligação dos aeroportos de Viracopos (Campinas), Guarulhos (São Paulo) e Galeão (Rio de Janeiro).
Apesar das dúvidas e dificuldades relatadas pelos representantes das empresas no encontro na Fiesp, todos disseram que pretendem participar do leilão e que não vêem motivos para novos adiamentos.
O representante da Mitsui, disse que o grupo tem mantido conversas com “mais de três construtoras”. “Como é uma licitação de concessão e não de só construção, temos de definir primeiro o investidor, que seria o empreendedor do negócio, e o parceiro na construção civil”, disse Ota. “Mais de 70% do custo de investimento é obra civil”, completou.
Segundo ele, por se tratar de um projeto de longo prazo, a concessionária responsável pelo trem-bala precisa ser liderada por empresas brasileiras. “Japoneses, franceses, quem seja o detentor da tecnologia, podem contribuir para transferir o know-how de tecnologia, de operação e manutenção. A concessionária tem que fazer esse empreendimento em 40 anos e tem que a entender cultura brasileira”.
ANTT prevê rentabilidade de 10,5% ao ano
Para a Simens, a rentabilidade prevista para o projeto está abaixo do padrão internacional. “Não é uma rentabilidade que está num padrão que o investidor internacional realmente tem interesse”, disse.
Segundo a ANTT, a expectativa é que o projeto assegure rentabilidade de 10,5% ao ano nos 40 anos da concessão caso o custo do projeto fique em até R$ 33 bilhões. O custo do projeto está estimado em R$ 33,1 bilhões. O BNDES oferecerá uma linha de crédito especial de R$ 19,4 bilhões. Além disso, o governo participará diretamente do projeto com R$ 3,4 bilhões, a partir da criação de uma empresa estatal que integrará o consórcio. O edital prevê ainda uma liberação de até R$ 5 bilhões para uma repactuação de juros do empréstimo caso haja frustração de receita.
“O investidor hoje ele pede pelo menos 12% a 14% de retorno; 10,5% não parece pouco, mas talvez para o investidor seja”, disse Missawa. “A gente vê com um pouco de preocupação a questão do negócio ficar de pé pelo tempo que tem que ficar”.
De acordo com ele, a Siemens ainda está analisando de que maneira irá participar da disputa. “Pode ser que a gente forme um consórcio, onde a Siemens tenha uma participação financeira minoritária e outros parceiros com interesse exclusivamente financeiro reequilibrem essa equação. Não está fechado”, disse.
Segundo Benites, as empresas coreanas fizeram um estudo de demanda que apontaram números diferentes do projetado pelo governo. Ele não revelou, no entanto, se para o grupo a demanda será maior ou menor do que a previsão do governo de 33 milhões de passageiros no primeiro ano de operação do trem-bala.
“A licitação está dando flexibilidade, posso mudar o traçado, posso fazer um estudo de demanda diferente, mas isso traz junto a responsabilidade de assumir riscos”, disse o presidente do Grupo Trends.
Segundo ele, os coreanos também estão atrás de parcerias com investidores brasileiros, mas não há mais dúvida sobre o interesse na licitação. “Agora é saber como participar. Tem uma série de discussões que são negociais”, disse. “Até novembro, estávamos na discussão se valia à pena ou não. Hoje, estamos um passo a frente, que é: com quem vamos casar e em qual condição”.
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