Em 30 de novembro de 2010 o Valor publicou reportagem dizendo que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva iria “passar longe” do desejo de inaugurar a ferrovia Transnordestina antes do final do seu mandato que terminaria um mês depois. Pois a presidente Dilma Rousseff, que assumiu em 1º de janeiro de 2011, também corre sério risco de passar pelo mesmo dissabor. A menos que se reeleja para um novo mandato na Presidência da República.
A obra caminha em ritmo lento, incompatível com sua conclusão prevista para novembro de 2014. O governo discute com a concessionária, a Transnordestina Logística (controlada da Cia. Siderúrgica Nacional- CSN), uma saída para acelerar os trabalhos, conforme apurou o Valor.
A Transnordestina, com 1.728 quilômetros de extensão, ligando o Porto de Suape, em Pernambuco, a Eliseu Martins, no cerrado do Piauí (incluindo um ramal de aproximadamente 600 quilômetros entre Salgueiro (PE), e o porto de Pecém, no Ceará), é obra prioritária do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
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A presidente Dilma já deixou claro que pretende inaugurá-la no seu atual mandato. A ferrovia destina-se a escoar a produção agrícola (soja, principalmente) e mineral (gipsita) do Sertão e do Cerrado nordestinos pelos dois portos, levando combustíveis e fertilizantes no retorno.
De acordo com informações obtidas pelo Valor, o número de pessoas trabalhando na obra caiu de aproximadamente 11 mil em setembro do ano passado para cerca de 4 mil atualmente. O presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Construção de Estradas de Pernambuco (Sintepav-PE), Aldo Amaral, confirmou a redução de empregos, sem detalhar números, e afirmou que o fato decorreu da redução do ritmo das obras.
O avanço da colocação de dormentes e trilhos (superestrutura) sobre as áreas já com infraestrutura (terraplanagem, drenagem, etc) pronta avança a um ritmo inferior a um quilômetro por dia, embora haja capacidade para avançar a 2,5 quilômetros. O trecho de aproximadamente 600 quilômetros entre Salgueiro (PE), e Pecém (CE) entregue parcialmente à construtora cearense EIT, está parado.
O Ministério dos Transportes informou apenas, por e-mail, que “o governo está avaliando, juntamente com a concessionária, as alternativas de aceleração das atividades de campo”. De acordo com as informações obtidas pelo Valor, há um descompasso no fluxo de caixa do empreendimento, não estando claro que ponto impede o aumento da velocidade da obra.
A Transnordestina Logística e a Construtora Odebrecht, que assumiu a execução de grande parte da ferrovia em 2009 com a missão de agilizar sua conclusão, pediram o envio de perguntas por e-mail, mas não quiseram se pronunciar. Segundo o Ministério dos Transportes, “o projeto está sendo reavaliado pelo governo de modo a garantir a continuidade do alinhamento entre o cronograma físico e o cronograma financeiro do empreendimento”.
O valor original da ferrovia, de R$ 4,5 bilhões, posteriormente reavaliado para R$ 5,4 bilhões, está com novo descompasso. Em nova reavaliação, do governo e da subsidiária da CSN, o número estaria naca de R$ 7,5 bilhões. A maior parte da obra é financiada pelo BNDES e pelo Banco do Nordeste do Brasil (BNB), que gerencia também recursos de fundos regionais – o FDNE e o Finor. A parte contratada com o BNDES, de R$ 900 milhões, já foi toda liberada até o fim do ano passado para agilizar a obra no seu início.
O BNB, com contratos de aproximadamente R$ 3 bilhões, informou que vem liberando o dinheiro na medida da comprovação técnica das obras e que foi comunicado pela Transnordestina da necessidade de um “aporte adicional” de recursos que está em negociações. O assunto, segundo informações, está em discussão no Ministério da Fazenda, sob a responsabilidade do ministro Guido Mantega.
Nas negociações estaria em jogo uma fórmula pela qual o governo assume, por meio de debêntures conversíveis em ações, uma parcela maior do que a que já assume, os riscos financeiros do empreendimento, de modo a não gerar impacto negativo no balanço da CSN.
Atualmente, além de parado o trecho Salgueiro-Pecém, de bitola mista (larga, de 1,60 metro, e estreita, de 1 metro), não foram iniciados os dois trechos das pontas da via entre Piauí e Pernambuco, somente de bitola larga. A obra em andamento abrange o trecho de Arcoverde (PE) até Paulistana (PI), com aproximadamente 600 quilômetros, dos quais cerca de 250 estão prontos.
Sem uma ligação portuária, o trecho atual, do ponto de vista econômico, liga nada a coisa nenhuma. Daí a importância de agilizar pelo menos o trecho de aproximadamente 270 quilômetros entre Arcoverde, cidade que fica na divisa entre o Sertão (semiárido) e o litoral-agreste (úmido). Como nesse trecho o período chuvoso concentra-se entre abril e setembro, para que ele ainda possa ser concluído no atual governo é considerado essencial pelos especialistas que a obra possa ser iniciada e a todo o vapor em outubro deste ano.
O problema, além do descompasso financeiro, que estaria sendo solucionado, é que nem o trecho que liga ao porto e nem o que liga o Sertão ao Cerrado piauiense têm ao menos projeto executivo.
A ligação com o porto de Pecém enfrenta uma dificuldade adicional: o traçado previsto para a ferrovia pode precisar de modificação por incompatibilidade com obras de contenção das enchentes do rio Ipojuca que frequentemente flagelam a região. No lado do Piauí, entre Paulistana e Eliseu Martins, trecho de aproximadamente 300 quilômetros, o problema maior para o início das obras está nas desapropriações, fato que afeta também o trecho cearense. Essa questão cabe aos governos estaduais.
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