Agro brasileiro avança, mas não pode ficar deitado em berço esplêndido

Funcionário descarrega milho no Porto de Santos - Foto Eduardo Knapp - Folhapress

Folha de S. Paulo (Coluna) – Em 2010, a Rússia importava o correspondente a US$ 3,9 bilhões do Brasil em alimentos. Foi, por muitos anos, o principal mercado da produção suína do Brasil. Atualmente, os russos importam apenas US$ 1 bilhão em alimentos do país.

A Arábia Saudita, que chegou a adquirir alimentos no valor de US$ 2,2 bilhões em 2015, vem também reduzindo esses gastos no Brasil.

Ambos os países, Rússia e Arábia Saudita, implementaram programas para diminuir a dependência externa de alimentos, o que também foi feito pela União Europeia.

Desde 2010, as importações de alimentos dos países do bloco europeu caíram de US$ 13,3 bilhões para US$ 11,9 bilhões no mercado brasileiro.

O grande parceiro para o Brasil hoje é a China, que elevou as compras de alimentos no país de US$ 8,84 bilhões, em 2010, para US$ 29,29 bilhões, em 2020. Mas os chineses também buscam reduzir essa dependência externa.

Essa busca por uma oferta maior de alimentos internamente é normal, embora os países sempre vão fazer ajustes entre produção e importação, segundo Pedro de Camargo Neto, produtor e ex-secretário de Política Agrícola no governo de Fernando Henrique Cardoso.

“O Brasil foi bem nos últimos 30 anos, mas como estará daqui a 30?, pergunta.

Nas últimas décadas, o país evoluiu devido a novas tecnologias, Lei Kandir, ocupação do Centro-Oeste e melhoras na infraestrutura. Grandes importadores, como a China, contudo, estão investindo pesado na agricultura, afirma ele.

Para Camargo, além do uso da tecnologia da informação, no que o Brasil também avança, os chineses vão além da biotecnologia e investem em RNA, que promove a indução de resistência das plantas, permitindo a redução das perdas econômicas causadas pelas doenças de forma específica e eficiente.

Para Camargo, o Brasil avançou muito na agropecuária, mas não pode, a partir de agora, ficar deitado eternamente em berço esplêndido.

Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura, concorda com Camargo. “Se ficar deitado em berço esplêndido, vai morrer afogado no colchão.”

Rodrigues e Camargo veem essa questão da busca por uma autossuficiência alimentar como normal, embora muitos países vão continuar dependentes de importações. Eles acrescentam, no entanto, que sustentabilidade e questão climática são quesitos que tomam corpo dia a dia e que devem ser levados a sério pelo setor.

A questão da sustentação alimentar sempre foi uma preocupação dos países, mas estava meio adormecida. Foi despertada pela pandemia, afirma Rodrigues.

Para ele, não falta alimento no mundo, mas ele está mal distribuído. Os países estão buscando essa sustentação alimentar porque a ausência dela é o primeiro fator de instabilidades sociais e políticas.

Tanto para Rodrigues como para Camargo, a sustentabilidade também passou a ser tema preponderante para a agropecuária. “Virou uma questão política para os mercados”, diz o ex-ministro. E o Brasil precisa seguir essa linha da sustentabilidade, afirma.

A importância do país na oferta mundial de alimentos é grande, mas os produtores não devem entender que o mundo vai ficar sempre dependente do Brasil.

Com tecnologia e capital, a produção agropecuária pode avançar em várias partes do mundo. Uma delas é a África, segundo Rodrigues. Apesar dessa possibilidade, Camargo vê a expansão na África um pouco mais complicada do que a que ocorreu no Brasil.

O avanço no país foi facilitado pela extensão territorial. No continente africano, as fronteiras entre os países podem ser uma barreira.

A Ásia e a própria América Latina têm condições de novas expansões agrícolas e de aumento de produtividade, em vista da chegada de novas tecnologias, diz Rodrigues.

Para Camargo, o país ainda está envolvido em questões como o desmatamento ilegal no momento, mas é necessária uma avaliação de longo prazo.

A questão climática existe e influencia. É dúvida até como vai afetar os diferentes países. Os Estados Unidos, por exemplo, para adequar a produção às metas de sustentabilidade, vão investir bilhões nessa questão.

Na avaliação do ex-secretário de Política Agrícola, haverá um aumento dos subsídios para os americanos, embora ele deva estar mais voltado para a adequação interna do que para uma concorrência externa.

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/vaivem/2021/05/agro-brasileiro-avanca-mas-nao-pode-ficar-deitado-em-berco-esplendido.shtml

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