O Globo – O já reduzido investimento que o Brasil destina anualmente para infraestrutura — de transporte, logística, energia, telecomunicações e saneamento — encolheu em mais de 11% entre 2017 e 2020, para R$ 115,2 bilhões. É o equivalente a apenas 1,55% do PIB do país, a menor fração destinada ao setor desde 2010, segundo levantamento feito pela Inter.B Consultoria.
O estudo também investigou a defasagem, por setor, dos investimentos — ou seja, a diferença entre o quanto foi aplicado e o quanto seria necessário para ter infraestrutura moderna e sustentável. E chegou à conclusão que este hiato é maior justamente nas áreas mais relacionadas ao bem-estar geral da população: saneamento e transportes, este último com forte impacto em mobilidade urbana.
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O economista Claudio Frischtak, que coordenou a pesquisa, destaca que deficiência em serviços de infraestrutura derruba a produtividade de estudantes e trabalhadores. Na ponta, isso freia a atividade econômica.
— Afeta a economia no curto e no médio prazo. Tem grandes externalidades. Quando o investimento na Cedae estiver pronto, por exemplo, (com acesso a saneamento básico) as pessoas ficarão menos doentes, haverá menos falta à escola, menos afastamento do trabalho, maior produtividade do trabalhador.
Investimento público
O Brasil investiu em média 2,01% ao ano em infraestrutura desde 2001. Seria necessário dobrar, para 4,24% ao ano, esse volume de investimentos para modernizar e ampliar o estoque de infraestrutura existente no país. As lacunas são maiores em transportes, que receberam apenas 0,65% do PIB e precisariam de 2% do PIB; e em saneamento, que obteve 0,91% do PIB, mas deveria ter 0,44% do PIB.
— O país investe pouco e não investe bem. Enquanto não se resolver o problema de governança em infraestrutura e o Estado souber investir bem, não tenho certeza de que colocar mais recursos vai resolver — alerta o economista Claudio Frischtak, à frente da Inter.B e que coordenou a pesquisa.
Nos últimos quatro anos, o investimento em infraestrutura de transporte tombou em quase 28,5%, para R$ 32,2 bilhões. No caso da mobilidade urbana, os aportes despencaram 62%, para R$ 3,8 bilhões.
O segmento, avalia Frischtak, deixa claro que os problemas na área de infraestrutura no país não estão apenas no pouco recurso financeiro. Ele destaca obras com 30 a 40 anos de idade, em média, e baixo nível de manutenção, resultando em perdas em eficiência, aumento de gastos de operação e riscos aos usuários.
— O tombo de demanda na pandemia levou a um colapso em mobilidade urbana. Afetou a capacidade de investimento das empresas. Trouxe incerteza, mas pesa a ausência de atuação do poder público. É preciso criar um ambiente institucional que aumente a produtividade dos investimentos. Há má regulação. Falta foco em projeto, fiscalização, monitoramento de operação — diz ele.
Com a crise trazida pela Covid-19, continua Frischtak, licitações foram remodeladas e adiadas. O poder público deve, contudo, buscar medidas inovadoras para suprir as demandas em cada área.
Em mobilidade, o uso do bilhete único metropolitano, por exemplo, reduz o custo do transporte de forma relevante para o trabalhador, ao mesmo tempo em que o uso de um pedágio urbano poderia garantir recursos para serviços específicos, lista ele.
Dos R$ 115,2 bilhões investidos em infraestrutura em 2020, menos de 30% vieram de recursos públicos, a menor fatia desde 2010. Em tempos de aperto fiscal e escassez financeira, o capital privado é importante, diz o economista, mas não pode suprir toda a demanda em infraestrutura.
Segundo o levantamento, o conjunto da infraestrutura existente no país representa hoje 35,9% do PIB — embora tenha chegado a 53,7% em meados da década de 1980. Para cobrir a depreciação e modernizar esse estoque existente hoje, é preciso que ele alcance o equivalente a 60,4% do PIB.
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