O ano da virada para a infraestrutura

Valor Econômico (Coluna) – O ano de 2021 deverá ser um ponto de inflexão para o investimento em infraestrutura no Brasil, o que é contundentemente evidenciado de várias formas.

Desde a década de 1980, o estoque de infraestrutura brasileiro decresce de forma estrutural, de um pico de 58% do PIB a desalentadores 36% atuais, mostrando que nem mesmo a depreciação de quase 4% a.a. é reposta pelos insuficientes 1,55% do PIB investidos em 2020. O resultado são custos desproporcionais, gargalos competitivos e baixa produtividade. Pelo menos 4,25% do PIB deveriam ser direcionados ao setor para se alcançar um estoque mínimo de 60% do PIB até 2040 e proporcionar um crescimento econômico sustentável.

Na oferta de funding, a lei 12.431/11 teve como um dos propósitos o desenvolvimento do mercado de títulos privados de renda fixa de longo prazo diante da necessidade de recursos alternativos para diminuir o déficit do investimento em infraestrutura, cujo crédito se concentrava nos bancos públicos de desenvolvimento, como o BNDES e o BNB. O sucesso da iniciativa é evidenciado pelo crescimento do volume e número de emissões, além da liquidez desta classe de ativos no mercado secundário. O volume negociado pelo estoque chega duas vezes àquele das debêntures não-isentas.

Além da limitada capacidade do governo de investir dadas as restrições fiscais, os desembolsos totais e para infraestrutura do BNDES decrescem estruturalmente desde 2013, abrindo espaço para o mercado de capitais protagonizar o financiamento para infraestrutura. O cenário fica ainda mais claro em 2017 com a criação da Taxa de Longo Prazo (TLP) como base para os novos empréstimos do BNDES, aproximando o custo do funding subsidiado pelo Tesouro a taxas de marcado. Ainda, o BNDES se posiciona como um banco de serviços, buscando fomentar o mercado privado através da estruturação de projetos e provendo garantias e reforços de crédito.

No caso do BNB, com atuação limitada à área abrangida pela Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste, o total de desembolsos de R$ 16 bilhões em 2018 caiu para apenas R$ 6,6 bilhões em 2020, basicamente por questões de contenções orçamentárias e redirecionamento de recursos a outros setores.

Também se faz necessário comparar as alternativas de investimentos que concorrem pelos bolsos dos investidores e mais uma vez o momento é favorável às emissões incentivadas de projetos de infraestrutura. Com a elevação das taxas de juros e inflação, o investimento em renda fixa de longo prazo indexado a índices de preço desponta como uma alternativa.

Olhando agora para o lado da demanda, nem mesmo a pandemia foi capaz de deter a grande leva de leilões e projetos oferecidos por meio de concessões, PPPs e desestatizações. A carteira do Programa de Parceria de Investimentos (PPI) cresce constantemente e o empenho do Executivo nesta frente tem surtido bons frutos demonstrados pela acirrada competição dos leilões, elevados ágios de outorga e montantes totais a serem investidos que lastrearão o promissor mercado de emissões incentivadas de longo prazo pelas próximas décadas.

Não se pode deixar de citar a agenda legislativa, que vem ganhando destaque aprovando importantes projetos de lei que trazem segurança regulatória para o investimento em infraestrutura, com o novo marco do saneamento, o marco do gás, nova lei de concessões e PPPs e mais recentemente o PL 2.656/20, que cria uma série de debêntures de infraestrutura objetivando atrair investidores institucionais para este mercado de longo prazo.

Entre as principais medidas do PL, citamos (i) a transferência do benefício tributário ao emissor, aumentando o retorno dos títulos e atraindo investidores institucionais; (ii) isenção do imposto de renda sobre os rendimentos das debêntures de infraestrutura (‘withholding tax’) para atração de investidores não residentes; e (iii) ampliação do prazo atual de 24 meses para 60 meses para demonstração dos gastos passíveis de reembolso para fins de emissão.

Adicionalmente, por meio do Decreto 10.387/20, projetos com benefícios ambientais e sociais passam por um processo simplificado e acelerado de aprovação (fast track) junto aos respectivos ministérios competentes para a emissão de debêntures de infraestrutura, alinhando a agenda ESG com a demanda dos investidores. De acordo com dados do Ministério da Economia, o total de emissões de debêntures incentivadas temáticas desde a primeira em 2017 soma R$ 15 bilhões, sendo 34% apenas no primeiro semestre de 2021. Após o decreto, saneamento e transportes foram setores que debutaram no segmento temático, somando-se a energia elétrica.

Concluímos que as debêntures incentivadas têm se mostrado muito efetivas no financiamento da infraestrutura nacional e que deverá haver grande demanda e oferta nos próximos anos. Uma forma inteligente os investidores ganharem exposição a este mercado é por meio de fundos de investimento, cujas carteiras de ativos são geridas por gestores profissionais. O destaque são os FI Infra listados que são fechados, grande vantagem para proteger o fundo de ondas de resgate, e com cotas negociadas em bolsa, com liquidez em dois dias úteis, fomentando este mercado tão importante e promissor.

Victor Tâmega é gerente sênior de Infraestrutura da Rio Bravo Investimentos

Fonte: https://valor.globo.com/coluna/o-ano-da-virada-para-a-infraestrutura.ghtml

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