Valor Econômico – O avanço do capital privado no setor de logística tem feito os investimentos na área baterem recordes. As concessões e parcerias público-privadas (PPPs) realizadas em transportes nos últimos dois anos elevaram o volume de investimentos em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), bateram recorde em 2023 e podem crescer mais ainda neste ano, segundo estudo da consultoria Pezco Economics.
Entre 2003 e 2022, o total de recursos aplicados em logística ficou estabilizado em 0,52% do PIB. Em 2023, o percentual subiu para 0,56% e deverá atingir 0,62% em 2024, ou R$ 72 bilhões, nas projeções de Frederico Turolla, sócio da consultoria. O impacto dos leilões de Estados e União, como a licitação do Trem Intercidades realizado pelo governo de São Paulo no fim de fevereiro e as concessões de rodovias do Paraná, poderá adicionar 0,43 ponto percentual ao PIB do país em 2024. No ano passado, as estimativas da Pezco Economics apontam que os investimentos em infraestrutura cresceram 1,82% em termos reais e deverão crescer mais 8,3% neste ano. Os investimentos em transportes são o principal motor dessa expansão, com alta de 4% no ano passado e de 14,7% prevista para este ano, conforme a consultoria.
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Os investimentos previstos para 2024 na área de transporte devem somar R$ 72 bilhões, sendo que 65% desse montante é oriundo dos leilões realizados por Estados e União no ano passado – os 35% restantes vêm de recursos de concessionárias privadas e dos orçamentos públicos. As projeções da Pezco apontam que os leilões são uma das principais razões para a estimativa de crescimento de 3,7%, neste ano, da formação bruta de capital fixo. A contribuição do setor de transportes para o PIB em 2024 deve ser de 0,3 ponto percentual.
“Este número reflete apenas os leilões recentes, porque um importante volume dos investimentos ocorre através de empresas públicas e privadas sob operações já contratadas ou que não passam por leilão”, diz Turolla. O PIB setorial de transporte, armazenagem e correio registrou alta de 2,6% em 2023. Para 2024, Turolla projeta alta do PIB setorial de 4,21%. “Os novos leilões deverão adicionar ainda mais força a esse movimento nos próximos anos”, acrescenta. Nas contas das concessionárias de rodovias, é esperado que a extensão dos trechos concedidos, hoje em torno de 28 mil km, venha a quase dobrar nos próximos cinco anos, tornando o programa de concessões brasileiro um dos maiores do planeta.
Os dados recordes de investimentos refletem as licitações, um movimento que deve se intensificar. Em fevereiro, o governo paulista licitou o maior projeto de mobilidade urbana do país: o trem que interligará duas das maiores regiões metropolitanas do Estado, São Paulo e Campinas. O Consórcio C2 Mobilidade sobre Trilhos, composto pela empresa chinesa CRRC e pela brasileira Comporte, que administra o metrô de Belo Horizonte, venceu o leilão para construir e operar o trem que deve ligar as cidades em um trajeto de 101 km. O consórcio foi o único a apresentar proposta, com desconto de 0,01% na contraprestação – valor a ser pago pelo Estado, de R$ 8,06 bilhões. O edital previa que o vencedor seria quem oferecesse o maior desconto. Já o investimento do governo paulista foi mantido em R$ 8,98 bilhões.
São Paulo se prepara para licitar outro grande projeto: 213,5 km de rodovias do lote Litoral Paulista, que liga o Alto Tietê ao litoral sul. O edital, lançado em dezembro e republicado em fevereiro, prevê o leilão em abril. O projeto envolve investimento de R$ 4,3 bilhões e prazo de concessão de 30 anos. O novo modelo de concessão contará com pórticos do sistema automático livre, também conhecido como free-flow, em vez das praças de pedágio. O free-flow permite a cobrança de tarifa sem a necessidade de cabines ou barreiras físicas, ou seja, o motorista não precisa parar o veículo para realizar o pagamento. “O Brasil vive um momento de intensa discussão sobre a adoção do sistema de free flow e São Paulo e União estão buscando liderar essa corrida, que trará maior eficiência e fluidez”, afirma Daniel Keller, sócio da Una Partners.
O governo federal também prepara mais leilões para este ano. Uma das maiores expectativas é sobre a concessão de mais dois lotes de rodovias no Paraná. No início deste ano, foram assinados contratos de concessão de dois trechos de rodovias no Estado, que somados movimentarão R$ 30 bilhões em investimentos. O Pátria foi vencedor do leilão do primeiro lote ofertado, com 473 km que fazem a conexão entre a região metropolitana de Curitiba, o centro-sul do Estado e os Campos Gerais. O Consórcio Infraestrutura EPR, formado pela empresa de infraestrutura Equipav e pela gestora de fundos de investimentos Perfin, venceu o lote 2, que contempla 605 km em trechos que ligam Curitiba ao litoral e o Norte Pioneiro a Ponta Grossa.
Mais dois lotes, que abrangem mais de mil km de extensão de rodovias no Paraná, podem ser licitados ainda em 2024. Eles já estão em análise pelo Tribunal de Contas da União (TCU), último passo antes de ser publicado o edital para o leilão na B3. Os investimentos previstos são de R$ 35,1 bilhões, com quase 600 km de duplicação, além de terceiras faixas, contornos e outras obras. As concessões terão validade de 30 anos.
O governo federal ainda prepara a licitação para trecho da BR-040 que liga as cidades de Belo Horizonte e Juiz de Fora, em Minas Gerais. O edital foi aprovado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) no fim de agosto e a expectativa inicial do Ministério dos Transportes era realizar o leilão ainda em 2023. No entanto, foram feitas mudanças no edital que acabaram postergando o prazo. O projeto, que pode ser licitado neste primeiro semestre, soma R$ 8,8 bilhões em investimentos nos 232 km de extensão da via.
O ministro dos Transportes, Renan Filho, disse que o governo federal pode fazer 13 licitações neste ano. O governo de São Paulo começa a avaliar duas licitações para substituir a ViaOeste, uma das maiores concessões da CCR, responsável pelo Sistema Castello-Raposo, que chega ao fim em março de 2025. Poderá envolver mais de R$ 15 bilhões em investimentos. A carteira de projetos da União e governos estaduais terá reflexos sobre o mercado. “Há licitações de mais de R$ 50 bilhões previstas este ano e as empresas já têm projetos ganhos anteriormente. Como ficarão os players tradicionais? Irão participar de quais lotes? Veremos novos entrantes? Os projetos têm desafios e riscos diferentes e o dinheiro não é ilimitado”, pondera Keller, da Una Partners.
Ewerton Henriques, diretor de infraestrutura do Banco Fator, lembra que os grandes players nacionais estão digerindo os ativos adquiridos ou analisando os seus ativos que serão relicitados. “Nesse aspecto, podem surgir novos players. Porém vale salientar que esses novos projetos são de grandes somas, o que dificulta um pouco a entrada dos grupos de pequeno e médio porte”, afirma.
A CCR, maior grupo privado do setor, ganhou em 2021 a relicitação da Via Dutra, um grande projeto, e não fez oferta no leilão do trem urbano entre São Paulo e Campinas. Já a Ecorodovias saiu vencedora em 2022 do leilão rodoviário do noroeste paulista, um ativo relevante que reúne 660 km de estradas que interligam cidades como São José do Rio Preto, Araraquara, São Carlos e Barretos.
Novos grupos que estrearam há menos tempo começaram a ganhar posição. O Pátria ingressou no setor em 2017, ao abocanhar um lote de rodovias do centro-oeste paulista, um trecho de 570 km entre Florínia (na divisa SP-PR) e Igarapava (na divisa SP-MG). Em 2020, ganhou o leilão do corredor Piracicaba-Panorama, também em São Paulo, com pouco mais de 1,2 mil km de rodovias. No ano passado, levou um lote das rodovias do Paraná, licitadas pela União, reforçando sua posição entre as maiores.
O leilão do Paraná do ano passado reforçou ainda a presença da Equipav, cujos acionistas ultimamente estavam dando mais atenção à expansão da Aegea na área de saneamento. A Equipav se uniu à Perfin (que no setor de transmissão geralmente atua com a Alupar) para obter o lote 2 das rodovias do Paraná. Estão ainda com concessões estaduais em Minas Gerais – contratos do Triângulo Mineiro, a PPP do Sul de Minas e o lote Varginha-Furnas –, que juntas somam R$ 8,1 bilhões em investimentos e R$ 7,7 bilhões em despesas operacionais previstas.
Já o grupo italiano INC SpA fez sua estreia no Brasil no segmento de infraestrutura em 2022, ao vencer o leilão de concessão do Rodoanel Metropolitano de Belo Horizonte, em Minas Gerais. Os italianos disputaram com o consórcio Novos Caminhos BH, liderado pelos chineses da China Railway Construction Corporation (CRCC). “Nos próximos meses, com os resultados dos leilões, veremos quais licitações terão sucesso e quais as empresas avançarão”, diz Keller.
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