Marcus Quintella*
À primeira vista, o título assertivo deste artigo pode parecer rigoroso e implacável. Todavia, o seu conteúdo pretende apenas mostrar o atraso dos transportes públicos das grandes cidades brasileiras. Cabe ressaltar que não estou criticando o caso brasileiro, apenas constatando fatos e fazendo comparações com grandes cidades pelo mundo afora. Os sistemas de transporte público das regiões metropolitanas brasileiras apresentam grandes diferenças organizacionais e gerenciais, defasagens tecnológicas, distorções sociais e incompetências políticas, tanto em relação às cidades de países desenvolvidos, como França, Alemanha, EUA e Espanha, quanto às cidades de países emergentes, como Chile, Argentina e México.
Para que o leitor tenha idéia do que estou falando, vou tomar o exemplo de Barcelona, que possui cerca de seis milhões de habitantes e possui um magnífico sistema de transporte público, denominado de Transportes Metropolitanos de Barcelona – TMB, composto por metrô, trens suburbanos e regionais, veículos leves sobre trilhos (bondes elétricos), ônibus urbanos e turísticos, funiculares e táxis. O TMB é coordenado e gerenciado por uma única entidade, a Autoridade de Transporte Metropolitano – ATM, que utiliza um sistema de integração, com um único bilhete, que permite ao usuário fazer transbordos nos sistemas de metrô, trens, bondes e ônibus, durante uma hora e quinze minutos. Em complemento ao TMB, a infra-estrutura viária da cidade possui avenidas largas, com faixas segregadas para ônibus e táxis, ciclovias demarcadas, muitos estacionamentos subterrâneos e mergulhões e bons sistemas de sinalização e de semaforização. Não existem, obviamente, transportes alternativos e clandestinos, visto que o poder público não dá espaço para tais anomalias, simplesmente porque atende com competência e eficácia as demandas por transporte da população.
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Para matar de inveja os cidadãos metropolitanos brasileiros, há ainda segurança pública, dentro e fora dos veículos de transporte e tudo funciona nos horários pré-estabelecidos. Os usuários do TMB podem comprar seus bilhetes integrados em todas as estações dos bondes e metrô, através de eficientes máquinas que aceitam cartões de crédito e dinheiro ou nas bilheterias tradicionais do metrô. Os congestionamentos são raros ou toleráveis, mesmo nas horas de rush.
Aí, o caro leitor pode argumentar que Barcelona pertence a uma cultura avançada, de Primeiro Mundo etc e tal. Concordo, mas eles começaram tudo isso um dia e vieram evoluindo progressivamente para atingirem o estágio atual. Ao longo do tempo, os espanhóis, assim como os demais povos europeus, perceberam que o transporte público competente, abrangente, econômico, rápido, seguro, confiável e confortável é um magnífico vetor de tranqüilidade e felicidade para a população, além de ser um importante gerador de empregos, redutor de pobreza, estruturador urbano e promotor de desenvolvimento econômico.
Por que Barcelona e outras grandes cidades espanholas, como Madri, Sevilha e Bilbao, além de outras metrópoles européias, como Paris, Londres, Bruxelas, entre outras, possuem excelentes sistemas de transporte público? Por que os países europeus investem tanto em transporte público?
Caro leitor, as questões acima podem ser respondidas de forma simples e objetiva: porque os políticos e governantes europeus são inteligentes, competentes e comprometidos com os interesses de suas populações e perceberam que o transporte público é fundamental para a vida das pessoas; porque não são imediatistas e pensam no longo prazo e conhecem bem os benefícios decorrentes de um sistema de transporte público saudável e humanizado.
*Marcus Quintela é engenheiro.
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