Não há mais trem para Jaçanã, o tranqüilo bairro do extremo norte da cidade, onde o sambista Adoniran Barbosa foi encontrar uma rima (Moro em Jaçanã./ Se perder esse trem/ que sai agora às onze horas,/ só amanhã de manhã). Chegar lá, agora, só de ônibus. O percurso pode ser sobre trilhos, a partir da estação da Luz do metrô, até o fim da linha 1-Azul em Tucuruvi. A partir daí, é preciso saber que ônibus tomar. Telefona-se, então, para o 156 da prefeitura. Por favor, como se chega a Jaçanã, a partir da estação da Luz?. Jaçanã… Um momento…O senhor sabe o nome da empresa, o número da linha, o endereço?. Senhorita, quero tomar o metrô na Luz, ir até Tucuruvi e, de ônibus, chegar à praça central de Ja-ça-nã. Você pode me dar alguma ajuda?. Einteindo…Vou consultar o sistema. (Um minuto). Não consta Jaçanã. Não posso lhe dar uma informação que não consta do sistema.Está bem, obrigado. A Prefeitura agradece e vou lhe passar a avaliação do nosso serviço. Aguarde um momento. (Entra uma gravação)… A Prefeitura de São Paulo pergunta como avalia o nosso serviço. Se positivo, tecle 1. Se negativo, tecle 2. A Prefeitura agradece. Boa tarde. (O repórter se absteve).
Faltavam quatro minutos para as onze da noite e o metrô que passa na direção Tucuruvi tem poucos passageiros em pé e absorve umas cem pessoas que estão na plataforma da estação da Luz. O metrô das onze chega rigorosamente no horário e está absolutamente lotado*. Só há lugar em pé, num aperto conhecido de outras experiências em horários de pico. A maioria dos passageiros é de estudantes. O metrô passa pelo rio Tietê, a estação do Carandiru e, em Santana, o que era superlotação passa a ser apenas lotação. Na Parada Inglesa é possível viajar sentado, mas na próxima estação será o fim da viagem de 15 minutos de duração.
O terminal do metrô em Tucuruvi tem várias saídas. Se optar pela rua Parnari, estará no caminho certo dos ônibus que fazem ponto na esquina pouco iluminada. Há três ônibus no local, mas ninguém sabe dizer se o Jaçanã é um deles. Ainda se está nesse difícil trabalho de apuração, quando alguém fala mais alto. Esse que acabou de chegar passa por lá, mas é intermunicipal, é R$ 3,30. Entra-se no ônibus sem perguntar de onde vem e para onde vai. O trocador dá uma informação mal-humorada, vem de Mairiporã e se destina a uma incompreensível vila de Guarulhos.
O ônibus está com todos os assentos ocupados por gente sonolenta. Um jovem entra com uma lata de cerveja. Ele e o repórter são os únicos passageiros em pé. Uma moça pergunta: O senhor vai para onde? Jaçanã, na praça? Eu lhe aviso quando chegar. Oito minutos depois, o ônibus pára na avenida Guapira, ao lado da praça central de Jaçanã. Às onze e trinta e cinco, Jaçanã está adormecida, as poucas pessoas vistas na praça acabaram de descer dos ônibus que vêm de Guarulhos. Na esquina em frente à praça, garçons e copeiros limpam o salão ainda iluminado do restaurante Arábia, que acabou de despedir os últimos fregueses.
* Isso acontece com freqüência. Para desafogar o sistema, o Metrô costuma liberar um comboio vazio a cada quatro superlotados.
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