Há pouco mais de um mês, a SuperVia, concessionária de transportes ferroviários, foi parar no horário nobre da tevê numa situação delicadíssima. Três agentes terceirizados pela companhia no Rio de Janeiro foram flagrados por uma câmera da Rede Globo açoitando grupos de usuários dos trens metropolitanos. As cenas chocaram o País. O que não se sabe é que a situação da companhia nos últimos anos era tão frágil que, segundo critérios de análise de resultados, a empresa nem sequer estaria de pé se não fosse a injeção de recursos dos fundos controladores.
A DINHEIRO apurou que, em dezembro passado, a SuperVia informou à Agetransp, agência reguladora da área de transportes, que registrava prejuízo acumulado de R$ 604 milhões nos últimos cinco anos, até 2007. Ela é concessionária há mais de uma década e o contrato com o Estado do Rio expira em 2023. Portanto, para dar um fôlego extra, era preciso elevar em mais de 11% o preço das passagens em janeiro de 2009, como permite o contrato de concessão. Era mais que o dobro da taxa do último reajuste ocorrido em janeiro de 2008.
Para completar, durante o período de negociação com o governo estadual, a SuperVia ficou sem parte dos recursos previstos para investimentos na operação. A companhia foi obrigada a cancelar uma oferta de FIDC (fundos de recebíveis) no valor de R$ 150 milhões. O volume seria aplicado em infraestrutura e pessoal, por exemplo, como novos vagões e treinamento, mas a falta de liquidez do mercado atrapalhou os planos.
A empresa informou à agência reguladora do setor que acumulou, em cinco anos, perdas de R$ 604 milhões. O primeiro lucro operacional só veio em 2008
DINHEIRO NOVO: investimento de R$ 150 milhões, em estrutura e pessoal, está sendo negociado para o segundo semestre
Ao se considerar essa série de fatos envolvendo a companhia, fica a sensação de que ela está fora dos trilhos. O fato é que nos últimos dois anos a empresa tem redobrado o esforço para sair da má fase e virar a página. Pertencente à Rio Trens Participações, do grupo Rio Trens Corporation (controlado por quatro fundos estrangeiros de investimento), a SuperVia iniciou em 2007 o que ela chamou de “reestruturação administrativo- operacional visando à racionalização de custos”.
O plano incluiu redução de níveis hierárquicos, eliminação de diretorias e gerências e implantação de um programa de metas para corte de gastos, segundo a diretora financeira da SuperVia, Lucia Cavalcanti. Foi instalado o modelo de orçamento base zero, que ganhou notoriedade em empresas privadas como a AmBev e o Pão de Açúcar.
Os primeiros resultados começam a aparecer. As despesas gerais e administrativas encolheram de R$ 56,6 milhões em 2006 para R$ 36,7 milhões em 2007. Dados recentes mostram alguma melhora nos resultados da empresa. O primeiro lucro operacional veio no ano passado, no valor de R$ 35,6 milhões. A dificuldade de fazer a virada da empresa estava no fato de ela ter ficado tão descapitalizada. Empresas que apresentam cinco anos consecutivos de prejuízo líquido e, simultaneamente, patrimônio líquido negativo por três anos seguidos, não são consideradas saudáveis, segundo critérios do Novo Mercado da Bovespa.
E esse era exatamente o caso da SuperVia. “Não há integração de transportes no Rio. Onibus e trens concorrem entre si até hoje e isso afetou os resultados da companhia”, diz Marina Mello, professora de economia da PUC-RJ. Para não ter de congelar investimentos, depois de cancelar a emissão dos recebíveis neste ano, a companhia decidiu buscar outros caminhos para a entrada de novos recursos. Mas o dinheiro ainda não entrou.
“A empresa está negociando em três frentes para a captação dos mesmos recursos [R$ 150 milhôes]. A SuperVia espera ter, no segundo semestre de 2009, os recursos aprovados”, diz Cavalcanti. Após o processo de privatização dos anos 90, as concessionárias vencedoras tiveram de injetar gordas somas de dinheiro nas empresas e estruturas concedidas. Por isso, o retorno do capital investido é demorado. A SuperVia precisou da ajuda da controladora, a Rio Trens, para liquidar uma dívida de R$ 26 milhões com o Unibanco.
A instituição transferiu o crédito para a controladora. Com a Light, a dívida declarada de R$ 165 milhões em 2006, está sendo paga em mais de 90 parcelas. É longo o caminho até a estação lucro.
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