Artigo: VLT ou BRT, eis a questão!

*Ivan Durão, economista


Salvador vive um momento histórico com a possibilidade de resolver um dos mais crônicos problemas de mobilidade urbana da cidade, utilizando-se das verbas destinadas a preparar a cidade para a Copa do Mundo de 2014, o transporte público de passageiros, o mais deficiente dentre as principais capitais brasileiras. Aliás, Salvador é pródiga em desperdiçar oportunidades. Ao longo do tempo tivemos bem próximos de resolver, de forma estrutural e definitiva, o Sistema. Vale lembrar que já tivemos ônibus elétricos eficientes atendendo a  todos os bairros da Cidade Baixa e linhas de bondes, corredores naturais para implantação de um moderno sistema de VLT, além de obras importantes para a cidade, tais como as avenidas de vale, implantadas a partir de estudos do EPUCS, fechamento e cobertura dos canais de algumas avenidas de vale que deveriam ser utilizadas inicialmente para circulação de ônibus em corredores exclusivos e, posteriormente, como vias para equipamentos de maior capacidade, como metrô ou VLT, por exemplo.


É do conhecimento de todos a importância econômica que o setor de transporte de passageiros por ônibus exerce na cidade e sua influência em discussões sobre esse assunto, até porque, cerca-se sempre de técnicos qualificados para defender seus legítimos interesses. Ocorre que interesses privados, nem sempre se confunde com interesses coletivos, já que não é seu papel, necessariamente, defendê-los. Porém, o poder público tem obrigação de atuar em busca de soluções que permitam maximizar a apropriação pública dos investimentos em infraestrutura.


No caso particular, sabemos que Salvador cresce aceleradamente em direção aos municípios vizinhos Lauro de Freitas e Simões Filho, caracterizando-se um forte processo de conurbação urbana, devendo-se ainda considerar o município de Camaçari, com forte participação populacional e econômica na RMS, motivo pelo qual a integração de qualquer sistema de transporte a ser implantado não pode desconsiderar essa interrelação nos movimentos de origem e destino dos deslocamentos metropolitanos.


Ao longo dos anos, vários (e bons) estudos foram elaborados sobre esse tema, principalmente através da CONDER, que, no final da década de 70 e início da década de 80 estudou e formulou excelentes propostas para o setor, com uma concepção, já àquela época, que contemplava o necessário caráter metropolitano para o Sistema. Porém, infelizmente, apesar de muito esforço e de muitos recursos despendidos ao longo dos anos, continuamos dependente de um modelo anacrônico, ineficiente e impróprio para as necessidades dos usuários, que são diretamente mais penalizados, apesar de não serem os únicos, já que todos sofrem com o excesso de ônibus nas vias, em linhas, de desejos duvidosos, talvez explicados se for levado em consideração o modelo de remuneração do sistema, com forte participação da quilometragem rodada. Aliás, a questão da remuneração do serviço e do modelo tarifário passa ao largo das preocupações dos gestores públicos, haja vista a pretensão de incluir o metrô no sistema de tarifa única, com recursos do FUNDETRANS, insuficientes para remunerar a diferença entre tarifa preço e o custo por passageiro do modal ônibus. A inserção neste “Fundo” de um modal de custo operacional mais elevado desequilibraria definitivamente o modelo de compensação tarifária vigente. Vale salientar que em todas as cidades do mundo onde existem sistemas de transporte de alta capacidade, as tarifas são subsidiadas já que, o benefício econômico para as cidades é superior ao custo financeiro do subsídio.


Aspectos importantes nessa questão, como a municipalização do sistema ferroviário, que só se vê na Bahia, e do modelo de operação do próprio pretenso metrô pelo município, também modelo só visto na Bahia, demonstram o descaso com o assunto, já que, aspectos primários são desconsiderados quando da formulação dessas propostas, que, via de regra, são elaboradas com visão pontual, de interesses políticos eleitoreiros de resultados duvidosos, ou para atender vaidades pessoais do tipo “fui eu que fiz”, as quais, no médio ou longo prazo levam a problemas para esses gestores através dos órgãos fiscalizadores da aplicação de recursos.


Temos uma nova oportunidade, talvez a derradeira nessa guerra por escassos recursos públicos para investimentos em infraestrutura de transporte em nosso Estado, e, desperdiçá-la para atender interesses menores, de quem quer que sejam, será um erro histórico que deverá marcar os gestores do momento para o resto da vida. A desculpa de prazo ou de valor de investimento comparando-se esse ou aquele modal reveste-se como pano de fundo para justificar a decisão, que se não houver responsabilidade e compromisso, mais uma vez, não será a melhor para os soteropolitanos. Já assistimos a esse filme em outros momentos e todos sofrem com os equívocos das decisões do passado. Vamos lutar pelo VLT, utilizando como preconizado, o canteiro central da Avenida Paralela. Não foi para postos de combustíveis que o canteiro central foi concebido. Já basta o absurdo que foi feito com a via exclusiva do corredor da Av. Bonocô, que foi desprezado e construído uma via elevada, sem nenhuma justificativa técnica convincente. Não é possível que na Bahia o absurdo continue a prevalecer sempre.


Portanto, entendo que temos que considerar a intermodalidade sim, até porque o modal ônibus é imprescindível para alimentar o sistema de maior capacidade, atingindo regiões com características exclusivas para esse tipo de equipamento. O trem suburbano precisa ser modernizado e sua operação ampliada até Camaçari, passando por Simões Filho e o VLT tem que ter sua operação concebida até Lauro de Freitas, com todos os sistemas integrando-se e com construção de estações de passageiros, com transbordos em locais bem definidos e com estacionamentos bem dimensionados para automóveis, de forma a permitir que os usuários de veículos particulares possam migrar para o Sistema, permitindo desafogar o caótico trânsito da cidade. Aliado a tudo isso, torna-se necessário investimentos de custos relativamente baixos, para eliminar cruzamentos e semáforos para pedestres em avenidas de grande fluxo, sejam nos vales ou nas avenidas estruturais existentes em alguns bairros de cumeada. É importante incluir no escopo de intervenções obras de engenharia de tráfego que levem em conta a eliminação de gargalos que dificultam a circulação de veículos em pontos largamente conhecidos por todos, que não cito para não me alongar demais, porém todos bem identificados.


Essas são algumas questões que coloco como contribuição para a reflexão de todos, como cidadão dessa cidade e como técnico que participou de muitos dos estudos e projetos elaborados, e que, nesse momento percebe uma nova oportunidade para solução dos problemas relacionados ao tema e entendendo que as discussões não assumem a dimensão técnica que deveriam assumir, girando em torno de questões que visam atender interesses menores. Reduzir a discussão apenas à imposição de um modal (o BRT) que foi eficiente em outras cidades há mais de dez anos atrás, e que, nessas cidades já estão sendo repensados e sendo estudadas alternativas de substituição, seria o mesmo que retroceder no tempo, levando Salvador, mais uma vez, a perder o “bonde da história”.


O poder público precisa decidir em favor da cidade e de seus habitantes, encontrando formas de equacionar as questões financeiras, agilizar a emissão de licenças ambientais, dos processos licitatórios que, necessariamente, deverão ser mais flexibilizados, e, dessa forma, implantar um sistema que, de fato, resolva definitivamente a questão da mobilidade em nossa cidade, ou seja, levar o metrô até Cajazeiras, levar o trem metropolitano até Camaçari, implantar o VLT nos principais corredores estruturais e modelar um eficiente conjunto de linhas alimentadoras por ônibus, que consolide o Sistema, a

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