Há 100 anos, em 2 de fevereiro de 1913, as portas do Grand Central Terminal, o principal terminal ferroviário de Nova York, foram abertas oficialmente ao público, depois de mais de 10 anos de construção e a um custo superior a US$ 2 bilhões, em valores atuais.
O terminal nasceu da política local, da ousadia arquitetônica, do exercício impiedoso do poder pelas grandes empresas e de um projeto de engenharia visionário. Nenhuma outra edificação corporifica a ascensão de Nova York de modo tão vívido quanto o Grand Central.
Abaixo, a história de seu nascimento, um excerto do livro Grand Central: How a Train Station Transformed America, de Sam Roberts, crítico de urbanismo do New York Times, que sai este mês pela Grand Central Publishing.
A ideia que resultou no Grand Central Terminal ocorreu a William Wilgus com um clarão repentino, ele recordou décadas mais tarde. Foi a ideia mais audaciosa que já tive.
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Wilgus, engenheiro chefe da New York Central Railroad desde 1899, havia supervisionado a dispendiosa reforma do Grande Central Depot, anos antes.
Nascido em Buffalo em 1865, ele estudou por dois anos com um engenheiro civil de sua cidade e mais tarde fez um curso de desenho técnico por correspondência, na Universidade Cornell. Sua criatividade lhe valeu postos cada vez mais importantes em uma sucessão de ferrovias, e por fim o posto que veio a ocupar na New York Central.
Uma colisão fatal em 1902, na qual um trem local matutino vindo de White Plains atingiu o vagão traseiro de um trem vindo de Danbury, Connecticut, que estava parado no túnel da Park Avenue, causando a morte instantânea de 15 passageiros, havia convencido Wilgus de que já não era possível operar um caótico pátio ferroviário de dois quarteirões de largura em uma área que estava se tornando o coração da maior cidade dos Estados Unidos.
Em carta de três páginas a W. H. Newman, o presidente da ferrovia, datada de 22 de dezembro de 1902, Wilgus, que então tinha 37 anos, recomendou uma solução audaciosa e extravagante: demolir a Grand Central Station existente e substituir as notórias locomotivas a vapor usadas pela ferrovia por trens elétricos.
Os avanços tecnológicos da proposta eram claros. A eletricidade requeria menos manutenção. Ao contrário das locomotivas a vapor ou, posteriormente, a diesel, os trens elétricos não necessitavam portar combustível ou maquinaria para gerar potência. A eletricidade permitia que os trens acelerassem mais rápido, o que era claramente vantajoso para um serviço de trens de subúrbio que operava principalmente com jornadas curtas.
Outra vantagem, que em retrospecto parece evidente, explica o motivo que tornou a sugestão de Wilgus tão revolucionária e, por fim, fez com que sua adoção fosse inevitável: os motores elétricos produziam menos vapores nocivos e nenhum vapor ou fumaça sufocante. Além disso, como o engenheiro explicou na carta, a eletricidade torna desnecessários os abrigos para trens usados no passado, porque viabilizava a instalação de trilhos subterrâneos.
Sem a fumaça, a cinza e as brasas, os pátios ferroviários podiam ser expandidos sem que terrenos maiores fossem necessários, com a criação de plataformas em dois níveis, o inferior para os viajantes de subúrbio e o superior para os trens de longa distância.
Trecho do livro:
“Mas no dia da inauguração não deve ter sido possível parar para observar por muito tempo. Os funcionários da ferrovia estimaram que, até as 16h do domingo, 2 de fevereiro de 1913, mais de 150 mil pessoas haviam visitado o terminal, desde a abertura das portas, à 0h.
O primeiro trem a partir foi o Boston Express n° 2, às 0h01min. O primeiro a chegar foi um trem local da linha do Harlem. O primeiro passageiro a comprar uma passagem foi F. M. Lahm, de Yonkers.
A Grand Central foi divulgada como a primeira grande estação sem escadas, com a circulação de passageiros conduzida por meio de rampas suaves projetadas para acomodar a todos, dos viajantes velhos e enfermos aos pequeninos que caminham de mãos dadas com as mães, de homens carregados de bagagens que eles se recusam a confiar até mesmo aos mais gentis dos funcionários a mulheres com vestidos de longas caudas.
Todo esse fluxo se dirigia às 32 plataformas do piso superior e às 17 do piso inferior (às quais 66 e 57 conjuntos diferentes de trilhos acorriam, respectivamente), passando por um saguão principal de 84 metros de comprimento, 37 metros de largura e 38 metros de altura, flanqueado por paredes transparentes de 27 metros de altura, pontuadas por passarelas de vidro que conectavam os escritórios instalados nos cantos do terminal.
O teto côncavo oferecia uma visão do firmamento, de Aquário a Câncer, no céu de outubro – 2,5 mil estrelas, 59 das quais iluminadas, e duas largas bandas douradas representando o eclíptico e o Equador. Por diversos meses, os pintores debateram sobre como comprimir o firmamento em um teto cilíndrico, porque a versão criada pelo artista Paul Helleu parecia mais adequada a um domo, e eles conduziram experiências para encontrar o tom correto de azul.”
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