A expansão e a prestação de serviços do metrô paulista foi tema de audiência pública hoje (6) promovida pelo Ministério Público Estadual. A desapropriação e o reassentamento das famílias que foram ou ainda serão removidas de suas moradias por causa das obras do metrô foram os assuntos mais discutidos entre os participantes. O caso mais preocupante atualmente é o das famílias que moravam ou ainda moram nas comunidades do Buraco Quente e do Comando, próximas à Avenida Água Espraiada, na zona sul da capital, onde serão feitas obras de ampliação da Linha 5- Lilás do Metrô.
“As negociações não foram claras e transparentes para toda a população, ou seja, teve pessoas que receberam valores muito irrisórios; outras receberam valor dito alto, de R$ 119 mil, que é o teto para dez anos de moradia e benfeitorias na sua casa. Mas isso foi exceção. A regra foram valores muito baixos, entre R$ 30 mil e R$ 60 mil”, disse Geilson Sampaio, representante da Comissão de Moradores do Buraco Quente e Comando e do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos.
Sampaio morou no Buraco Quente por 25 anos, até que se casou e passou a viver em outro local. Mas sua mãe, que viveu na comunidade por mais de 35 anos, saiu de lá por causa das obras do metrô, passando a morar com ele. “Estamos brigando pelo valor máximo da indenização. Ela teve que sair de lá, a casa dela foi demolida, e está morando comigo. Estamos agora negociando uma casa da Cohab”, disse.
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Segundo Sampaio, 421 famílias que viviam nas duas comunidades foram cadastradas pelo Metrô. A maior parte delas já deixou o local. “Sou a favor do acesso, do progresso, mas não da obra como está sendo feita. Sou usuário do metrô e sei da facilidade que ele possibilita. Porém a obra, em si, não deveria acontecer de forma que o direito ao transporte passe por cima do direito à moradia. Uma coisa deve falar com a outra”, ressaltou.
O bombeiro civil Adriano da Paz vive no Comando há 37 anos. “Nasci lá e estou lá até hoje. Estou esperando o Metrô resolver. Até agora não tem resposta nenhuma para a gente poder tomar outro rumo na nossa vida”, falou. O caso de Adriano é ainda mais complicado. A casa que ele construiu no Comando para viver com a ex-mulher está hoje alugada. E o Metrô ainda não reconheceu o seu direito como proprietário do imóvel.
“Separei, e fui morar com a minha mãe [também no Comando] e aluguei a casa [onde morava]. E eles [Metrô] dizem que a pessoa que está alugando a casa não precisa de casa. Então, o meu caso está sendo estudando. Aliás, 28 casos estão nessa mesma situação”, disse. De acordo com Adriano, o local onde vive foi invadido pelas famílias há cerca de 40 anos. Mas há uma ação tramitando na Justiça há nove anos, de usocapião, para o reconhecimento de posse.
O secretário estadual dos Transportes Metropolitanos, Jurandir Fernandes, admitiu que a grande dificuldade no processo não é a desapropriação das famílias, mas o reassentamento. “Na desapropriação existe todo um procedimento de uma avaliação do imóvel. O Metrô é muito criterioso e, quando há contestação, judicializamos e a Justiça decide. A questão do reassentamento é mais complexa porque há normas. O reassentado tem necessidade de permanecer nas proximidades e nem sempre se encontra áreas próximas de onde ele está. Existem também algumas situações mais difíceis, como aqueles reassentados que tm um negócio, um bar ou uma hospedaria e que também é preciso valorar isso quando se discute a questão do reassentamento”, declarou. Mas segundo o secretário, todas as pessoas que estão sendo afetadas com as obras do metrô estão sendo atendidas.
Para atender às famílias das comunidades do Buraco Quente e do Comando, o secretário propôs a uma reunião na próxima semana. “Temos que achar o melhor caminho”, disse. A reunião foi marcada para as 10h da próxima sexta-feira (14), com a participação do Ministério Público.
Moradores da região de Paraisópolis também fizeram a mesma queixa sobre a desapropriação e o reassentamento das famílias. Mas, segundo o Metrô, lá a situação não é tão emergencial quanto a do Buraco Quente e do Comando, já que deverão ocorrer poucas desapropriações e a obra ainda deverá demorar a começar.
De acordo com o secretário, até 2030 as obras que estão previstas em toda a rede do Metrô paulista deverão estar concluídas. A Agência Brasil procurou o Metrô para ter informações sobre quantas famílias, no total, deverão ser desapropriadas por causa das obras, mas até o momento não obteve retorno.
Problemas, como o de superlotação, também foram discutidos durante a audiência. Segundo o Metrô, uma das causas da superlotação é a maneira como a população está distribuída pela cidade, com os empregos concentrados na região central e as pessoas vivendo, em sua maioria, na periferia. O Metrô reconhece a superlotação das linhas e avalia que a solução para o problema virá com a expansão da rede.
O promotor de Justiça Maurício Antônio Ribeiro Lopes, da área de habitação e urbanismo, disse que a audiência pública é importante para o Ministério Público ter clareza dos projetos do Metrô e para a sociedade se manifestar sobre uma obra que afeta a sua vida.
“Temos inúmeros inquéritos civis que versam sobre o Metrô e a prestação de serviços públicos relacionados à mobilidade urbana. Achamos que esta era a oportunidade tanto para o Ministério Público obter alguns esclarecimentos sobre planejamento do Metrô e como é feita a expansão da rede, os problemas que vem enfrentando e como está solucionando esses problemas, como também para a sociedade civil trazer suas críticas e seus pedidos de esclarecimentos. Queremos fazer uma aproximação entre o Metrô, Ministério Público e a sociedade civil”, disse.
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