Editorial: Ceder e conceder

Causa desânimo a sucessão de reveses no início do programa de privatizações de Dilma Rousseff.


O desalento, porém, não deveria obscurecer as perspectivas auspiciosas dessa que é enfim uma oportunidade de despertar a economia brasileira de sua letargia de quase três anos. Mais importante, os insucessos não devem servir de pretexto para a exacerbação de conflitos entre governo e empresas.


A presidente lançou o seu plano de concessões de infraestrutura de modo tanto improvisado como enviesado pela tentação do “microgerenciamento” estatal, para recorrer a uma expressão usada recentemente pelo FMI para caracterizar a política econômica brasileira.


Isto é, o programa de privatização de ferrovias, rodovias e aeroportos e a reorganização dos portos são prejudicados pela relutância do governo em se retirar da gerência dos empreendimentos e conceder liberdade para que empresas procurem a melhor equação de preços e custos, sem o que não há, estritamente, privatização.


O plano de concessão de rodovias está sendo redimensionado. Será menor que o esperado pelo governo, que subestimou custos e superestimou receitas, mas virá.


Mais relevante para a desobstrução das artérias econômicas, o programa de ferrovias corre risco de infarto.


O modelo prevê que empresas privadas construam trilhos e instalações de apoio. Uma estatal, de má reputação, compraria os direitos de uso da ferrovia e os revenderia a usuários finais. O governo corrigiu fragilidades legais, mas as empresas relutam em investir sem garantia firme de que, ao longo de décadas, a estatal faça sua parte.


Para diminuir a resistência privada, o governo oferece mais subsídios. Há dúvidas de que, mesmo que atraia investidores, tal modelo seja de interesse público.


No caso dos portos, demandas e críticas dos investidores chegam aos milhares; Estados e empresas vão à Justiça contra o plano do governo, que reconfigura, licita e relicita dezenas de áreas portuárias em diversas situações contratuais.


O problema tenderá ao beco sem saída caso o governo mantenha a animosidade e os investidores não recuem em sua disposição litigante. Investimentos estão sendo suspensos devido a esse conflito.


Ingenuidade amadorística e pressa politizada na busca de resultados causaram os insucessos do governo. O decorrente descrédito não apenas reforçou a desconfiança do setor privado como tornou mais agressivas, se não indevidas, várias de suas reivindicações.


Não parece viável a revisão apressada de programas, por imenso que seja o atraso para a infraestrutura. Tanto governo como investidores devem esfriar os ânimos.


Mais relevante é melhorar a qualidade do plano de concessões, para reconquistar a confiança das empresas e conduzir negociações em termos razoáveis, que garantam retorno para o negócio e protejam o bolso do público.

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