Às vésperas de completar 40 anos de fundação, abatida pela operação Lava-Jato da Polícia Federal e por uma dívida financeira que monta R$ 8 bilhões, a OAS, empreiteira de origem baiana, planeja voltar às origens: ser somente uma empreiteira. O plano é focar sua atuação na realização de obras como rodovias, hidrelétricas, pontes, ferrovias e portos.
Ontem, depois de verificar que não havia outras saídas, a empresa dos sócios César Mata Pires e Aldemário Pinheiro, ante à falta de acesso a crédito para rolar suas dívidas desde novembro, entrou com pedido de recuperação judicial no fórum João Mendes, na cidade de São Paulo. O pedido, que aguardará alguns dias até a aprovação do juiz que analisar a ação, envolveu nove empresas.
Entraram no processo de recuperação a holding OAS S.A., que reúne a maioria do endividamento, a Construtora OAS, e as holdings de investimentos, infraestrutura e empreendimentos (área imobiliária), entre outras.
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Ficaram de fora da ação outras nove empresas, as quais tocam negócios como arenas multiúso, de meio ambiente, estaleiros, óleo e gás e de defesa.
Desde novembro, quando foi lançada a fase da operação Lava-Jato que investiga pagamentos de propinas na Petrobras por parte de empreiteiras e de outros fornecedores da estatal, diversas companhias da construção pesada começaram a enfrentar dificuldades de acesso a crédito no mercado. As empreiteiras tinham contratos sob suspeitas, principalmente nas obras das duas grandes refinarias de petróleo – Abreu e Lima, em Pernambuco, e Comperj, no Estado do Rio.
A decisão de recorrer à proteção da Justiça foi tomada nos primeiros dias de março, quando se verificou que um outro plano de reestruturação do grupo ficou mais difícil de se concretizar, afirmou, ontem, Diego Barreto, diretor de Desenvolvimento Corporativo da Construtora OAS. Segundo ele, notou-se também que os potenciais interessados em aquisição de ativos que foram colocados à venda queriam uma segurança jurídica para fazer propostas de compra e fechar negócios.
Esses grupos, lembrou Barreto, enxergavam numa ação de recuperação judicial essa segurança que buscavam. Um dos ativos mais atraentes dos que foram lançados ao mercado era a participação de 24,4% da OAS na holding Invepar, que opera diversas concessões de infraestrutura, entre elas o Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP), o maior do país.
No fim de novembro e em dezembro, explicou o diretor, ficou claro para a empresa que as fontes de acesso a crédito, devido aos efeitos da Lava-Jato, secaram de vez. E a OAS, “afetada duramente por essa realidade” tinha dívidas de R$ 1,5 bilhão (principal e juros) para serem quitadas neste ano e a maioria delas seria refinanciada. “Como a holding passou a contar com seu próprio caixa, o caminho foi suspender todos os pagamentos financeiros a partir de janeiro”, disse Barreto.
Com isso, toda a dívida foi acelerada, hoje atualizada em R$ 8 bilhões com a variação cambial. Conforme a OAS, 69% desse valor são com “bondholders” (investidores estrangeiros). A maior parte do passivo restante está com instituições financeiras (14%) e com investidores do país (11%).
A venda de ativos – que pode ocorrer durante a aprovação do plano e ou mesmo durante, sempre com a autorização do juiz da ação – é um dos pilares para solucionar a situação financeira da empresa. Somente a fatia da OAS no capital da Invepar é avaliada no setor de concessões em no mínimo R$ 2,7 bilhões. É de longe considerado o mais atrativo dos seus ativos colocados à venda.
Conforme a empresa, vários candidatos manifestaram interesse pela sua parte de 24,44% na Invepar. Mas os executivos da empresa não quiseram dizer quantos – “há nacionais e estrangeiros”, disseram – nem confirmar nomes que surgiram no mercado, como o grupo canadense de infraestrutura Brookfield.
O capital da Invepar, que é dona do principal aeroporto do país, o Aeroporto Internacional de Guarulhos, além do metrô do Rio e de concessões de rodovias, é dividido com três fundos de pensão – Previ, Funcef e Petros. Os sócios têm direito de preferência sobre a participação da OAS quando ela chegar a um acordo com um potencial comprador.
Outros ativos colocados na prateleira de venda do grupo são as divisões de óleo e gás (61%), o Estaleiro Enseada, que divide com Odebrecht, UTC e a japonesa Kawasaki (17,5%), a OAS Soluções Ambientais (100%), as duas arenas multiúso (Dunas, no Rio Grande do Norte, e Fonte Nova, na Bahia) e os projetos da área imobiliária, tocados pela OAS Empreendimentos (80%), que entrou na recuperação. Na óleo e gás, a OAS tem como sócio o fundo FI-FGTS, gerido pela Caixa, com 39%. Na divisão imobiliária, a parceira é a Funcef, com 20%. E na Arena Fonte Nova o sócio é o grupo Odebrecht, com 50%.
Fundada em 1976, a construtora – que será o carro-chefe de negócios do grupo na nova fase – responde por cerca de 80% do faturamento do grupo, mas só por 5% do total da dívida, disse Fábio Yonamine, presidente da OAS Investimentos. No ano passado, a receita líquida do grupo ficou em torno de R$ 9 bilhões – o balanço financeiro ainda não foi publicado.
Segundo ele os negócios de concessões demandam muito capital intensivo e forte alavancagem financeira, enquanto a construção pesada tem mais liquidez e menor necessidade de capital. E a OAS, lembrou, tem grande nisso.
Barreto, diretor corporativo da holding, disse que o plano de recuperação judicial prevê que, com os recursos obtidos da venda dos ativos, mais caixa do grupo – valor que não evitou revelar – e o fluxo de caixa da construtora, em dois anos é possível sair da recuperação judicial. “Acreditamos que isso será possível”.
Ele disse que este será um ano difícil, pois a construtora tem uma carteira de obras de R$ 17 bilhões. E não deverá receber novos contratos. Por isso, o faturamento deverá ficar entre R$ 7 e R$ 8 bilhões. “A situação econômica do país não nos permite vislumbrar novos contratos em 2015”. Devido à não renovação de contratos, cerca de 15 mil trabalhadores não foram recontratados. Na área corporativa, 149 pessoas, de um total de 800, foram demitidas.
Ao mesmo tempo, no exterior, que responde por 20% da receita, a atividade nos 20 países será fortemente reduzida. Apenas alguns países, como o Peru. “O foco será o Brasil, sem detalhar”, afirmou.
O diretor informou que a receita da empresa depende apenas 2% de contratos da Petrobras e que, com a ação judicial aprovada, estará apta a obter contratos. Hoje, a empresa está na lista das vetadas pela companhia estatal.
Estão assessorando a OAS nessa operação a G5 Evercore e os escritórios de advocacia Mattos Filho e Dias Carneiro, no Brasil, e White & Case, no mercado americano.
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