MP que muda contratação de obras é criticada

BRASÍLIA- Está nas mãos da presidente Dilma Rousseff a decisão de sancionar ou vetar a Medida Provisória 678, depois de o Congresso Nacional ter ampliado praticamente de maneira irrestrita o alcance do Regime Diferenciado de Contratações (RDC) ao longo de sua tramitação. Na proposta original, o governo propunha a ampliação desse regime para obras de Segurança Pública, como presídios. Entre os parlamentares, o RDC ganhou um escopo muito maior, incluindo obras de mobilidade urbana e infraestrutura logística. Na prática, segundo especialistas do governo e do setor da construção, o RDC poderá ser usado em todo tipo de obra, seja pelos governos federal, estaduais e municipais.

A ampliação do RDC por meio da MP vem suscitando polêmicas, principalmente por ser, na prática, um meio de se driblar a Lei de Licitações. Para o Sindicato da Arquitetura e da Engenharia (Sinaenco), por exemplo, a ampliação do RDC é contrária à transparência prevista na lei atual. O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR) convocou mobilização para pressionar a presidente a vetar a ampliação do RDC, “por entender que promiscuidade entre projeto e obra é indutora de reajustes e superfaturamento”.

No setor privado, segundo articuladores do Congresso, a ampliação do RDC é patrocinada principalmente pelas grandes empreiteiras, muitas delas envolvidas na Operação Lava-Jato. O regime prevê a necessidade de manter sigilo sobre orçamentos de obras e uma modalidade conhecida como contratação integrada, que tende a dificultar o ingresso de novos competidores.

A proposta enfrenta resistência entre arquitetos e urbanistas. Para Sérgio Magalhães, presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), o problema do RDC está justamente na contratação integrada. Segundo ele, essa modalidade aumenta os prazos e custos das obras, e diminui a qualidade.

— Ela transfere a responsabilidade de fazer o projeto e a obra para a empreiteira. Há um conflito inerente entre o que se pretende como projeto e os interesses de uma empresa — diz Magalhães, que questiona a fiscalização: — Vai fiscalizar o que, se está tudo sob controle do empreiteiro?

Presidente do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade, Washington Fajardo apresenta visão semelhante.

— Damos privilégio ao mais barato, ao mais prático e rápido. Precisamos, sim, desburocratizar os processos, mas não podemos fazê-lo em detrimento da qualidade. Temos os desafios do século: mudança climática, concentração urbana, desigualdade no território. Eles não serão enfrentados assim.

A polêmica cresce à medida que o Congresso já vem debatendo reformas para a Lei 8.666. Depois de o Senado ter patrocinado uma grande discussão sobre o tema, neste ano a Câmara tem em curso uma comissão especial para colocar sob apenas uma lei as previsões da 8.666, do RDC e do regime de contratações da Petrobras. Não bastasse o emaranhado de normas, nas últimas semanas o Ministério da Fazenda passou a elaborar um projeto de lei para criar mais um novo regime de contratação de obras consideradas estratégicas para o país.

RDC FOI CRIADO PARA AGILIZAR OBRAS DA COPA

Originalmente, o RDC foi criado também por Medida Provisória para agilizar obras da Copa de 2014. Depois, o RDC foi ampliado para as obras da Olimpíada de 2016 e para ser aplicado nas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que têm ações de mobilidade e estradas, por exemplo. Em seguida, o governo previu o modelo para obras do Sistema Único de Saúde. Em outras oportunidades, o governo federal já tentou ampliar o RDC indiscriminadamente, sem sucesso. Mas, pela proposta aprovada no Congresso, o RDC poderá ser usado até em contratos de aluguel do governo com o locador. Ou seja, antes de o governo entrar no imóvel, o dono poderá reformar por meio do RDC.

A MP trouxe “jabutis”, como renegociação de dívida de produtores de álcool e até regras para beneficiar os cartórios. O relator da MP e autor das mudanças foi o líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO). A MP original tinha dois artigos, com uma proposição em meia página e saiu do Congresso com oito artigos, distribuídos em cinco páginas. 

Na votação do Senado o líder do DEM na Casa, Ronaldo Caiado (GO), liderou um lobby para incluir a renegociação de dívida de produtores rurais no âmbito do Programa Nacional do Álcool. Os parlamentares reagiram, mas Caiado venceu e incluiu a renegociação no texto final. Há previsão também de novas regras no registro de protesto de títulos em cartórios. Especialistas disseram que as regras beneficiam os cartórios, com pagamento de mais taxas pelos usuários.

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