O desempenho do setor agropecuário será o principal responsável pelo crescimento esperado para o Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre deste ano, mas as boas notícias vindas do campo não devem ficar restritas a esses três meses iniciais. A expectativa de analistas é que fatores como o clima e a baixa base de comparação em relação a 2016 continuem dando frutos até dezembro, fazendo com que a produção agrícola cresça, na pior das estimativas até agora, 6%. Mesmo a crise institucional deflagrada no fim da semana passada, com as denúncias contra o presidente Michel Temer, não devem atrapalhar o dinanismo do setor. Na avaliação de alguns analistas, o real um pouco mais desvalorizado, pode até ajudar.
“A agropecuária vai dar uma pancada no PIB”, diz José Carlos Hausknecht, sócio da MB Agro consultoria. O carro-chefe dessa recuperação devem ser os grãos. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estima que a produção desses itens será 26,2% maior este ano na comparação com 2016, chegando a 233,1 milhões de toneladas. Esse crescimento é quase tão grande quanto as 56 milhões de toneladas de soja produzidas anualmente na Argentina, destaca Nelson Rocha Augusto, presidente do Banco Ribeirão Preto (BRP). Mesmo com tamanha magnitude, é consenso entre analistas que alcançar esse número é algo factível.
“No primeiro trimestre, a produção de soja salta aos olhos”, diz Felipe Novaes, analista setorial da Tendências. A expectativa da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) é que a produção cresça 15,4% em relação a 2016. Para a Tendências, mais de 75% do crescimento esperado para o PIB deve vir da agropecuária. Até quinta-feira, a consultoria estimava alta de 0,3% da atividade neste ano, mas o número ganhou viés de baixa depois da crise política instalada pela delação premiada da JBS.
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“Já dá para matar no peito e dizer: a safra [do primeiro trimestre] foi muito grande. Só falta ver se ela foi muito grande ou gigante”, diz Rocha Augusto. O cenário mais provável é que os três primeiros meses do ano concentrem boa parte da produção agropecuário, mas isso, segundo especialistas, não significa um “soluço”. Ou seja, o cenário é bom para os 12 meses.
A partir de meados do segundo trimestre, com ainda mais força no terceiro, é o milho quem deve puxar o carro, com alta de 40% em relação ao ano passado. “A safrinha virou safrona”, diz Hausknecht, da MB Agro. Somados, milho e soja representam 89% da produção de grãos.
Parte dessa recuperação se deve ao clima. Se em 2016 o regime desfavorável de chuvas gerou quebras de safra, em 2017 a situação é oposta. “Neste ano, choveu no lugar certo, na hora certa”, diz Rocha Augusto, do BRP.
Outro fator que influenciou esse crescimento foi a alta dos preços, que, justamente em função das quebras de safra do ano passado, incentivou os agricultores a ampliarem a área de plantação. Em 2016, o PIB agrícola caiu 6,6%. As estimativas do boletim Focus para este ano estão em alta de 6%, mas o BRP calcula aproximadamente 6,5% e a Tendências espera 7%.
A supersafra de milho e soja terá ainda efeitos indiretos para o interior do país. Um deles é que a grande oferta desses itens, principais insumos para a ração de animais, barateará a produção bovina. “As perspectivas para a carne são muitos boas”, diz Novaes, da Tendências. O setor foi levemente abalado pela Operação Carne Fraca, no fim de março, mas deve voltar com força nos próximos meses.
Outro fator positivo é o dinheiro que o grande volume de vendas deve trazer para o campo. Segmentos como a fabricação de máquinas agrícolas, transportes e serviços têm tudo para ser alguns dos mais beneficiados. “Uma safra dessas pode não dinamizar a região metropolitana de São Paulo ou do Rio de Janeiro”, diz Felippe Serigati, professor do MBA em Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas. “Mas, sem dúvida alguma, no interior do país quem carrega o piano é o setor agropecuário.”
As regiões que mais se beneficiarão caso os resultados positivos sejam confirmados serão principalmente o Centro-Oeste e o interior de Estados como o Paraná e Santa Catarina.
Uma nuvem sempre presente no horizonte agrícola é o clima. Há, por exemplo, alguma chance de um retorno do El Niño no segundo semestre. Mas, ainda assim, o otimismo continua grande. “Se São Pedro colaborar, as coisas têm tudo para saírem bem”, diz Serigati.
As próprias denúncias deflagradas contra o presidente Michel Temer, que têm o potencial de abortar a recuperação econômica do país, podem ter até efeito oposto na agropecuária.
Novaes, da Tendências, já havia chamado a atenção para os desdobramentos positivos que uma desvalorização cambial traria para o setor. “Isso tende a favorecer o produtor nacional”, disse. Em um momento de demanda interna fraca, “as exportações são estratégicas para conseguir escoar toda essa produção”.
Hausknecht, da MB, diz que o fortalecimento do dólar diante do real beneficia a atual safra, mas principalmente “as perspectivas para as safras seguintes”. A consultoria tem estimativa de alta de 8% para o PIB agrícola neste ano, mas já planejava revisá-la para cima. Agora, esse novo cenário ganhou mais força. “Para o setor agropecuário não é ruim o que está acontecendo”, diz.
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