Projeto para cobrir linha férrea é um equívoco

Enquanto os hospitais do município agonizam, as ruas estão
cada vez mais esburacadas e mal iluminadas, logradouros exibem sinais de má
conservação e calçadas são tomadas por camelôs, o prefeito Marcelo Crivella
anuncia um mirabolante projeto para construir uma “cidade suspensa” sobre a
linha férrea, inicialmente entre a Central do Brasil e a Estação da Leopoldina.
O plano seria erguer, sobre a ferrovia, prédios comerciais e residenciais, numa
área de um milhão de metros quadrados. Para tentar viabilizar a ideia, Crivella
assinou um acordo com a empresa russa Olympic City Group, que fará — segundo a
prefeitura, sem custos para o município — uma proposta de parceria
público-privada (PPP) para o empreendimento. O estudo deve ficar pronto em seis
meses.

O custo da obra é estimado em R$ 8 bilhões, aproximando-se
do valor da Linha 4 do metrô (General Osório-Jardim Oceânico), que tem 16
quilômetros de túneis, seis estações, e consumiu cerca de R$ 10 bilhões. Pelos
planos de Crivella, os recursos seriam viabilizados por meio de uma PPP
semelhante à do Porto Maravilha, com emissão dos chamados Certificados de Potencial
Adicional de Construção (Cepacs). Em outras palavras, incorporadores pagariam
para construir além do permitido pela legislação.

Embora tenha combinado já com os russos, a prefeitura terá
de se entender também com a União, proprietária de áreas incluídas no projeto;
com o estado, que é o poder concedente da ferrovia, e com a SuperVia, que
ganhou concessão para explorar a linha e as estações.

Além disso, convém lembrar que os Cepacs não são uma solução
mágica para a recorrente falta de recursos destinados a obras de
infraestrutura. De fato, essa foi a estratégia adotada pela prefeitura no
Porto, onde uma área histórica e degradada foi revitalizada às vésperas da
Olimpíada, transformando-se num dos novos polos de lazer e turismo do Rio,
ainda com um vasto potencial a ser explorado, principalmente no que diz
respeito à construção de moradias.

Mesmo assim, a PPP não ficou imune à crise. Sem conseguir
vender os Cepacs, a Caixa parou de fazer repasses à concessionária, que
precisou interromper temporariamente a manutenção da área. Nesse período, os
serviços foram assumidos pela prefeitura. Ou seja, não existe custo zero.

O sistema de trens do Rio precisa, sim, de melhorias, não
estéticas, mas operacionais. Existem projetos para revitalizar a linha,
dando-lhe padrão de metrô e aumentando o conforto, o que poderia recuperar a
importância que a ferrovia já teve. Cobri-la, certamente, não seria a solução.

Antes de assumir a prefeitura do Rio, Crivella disse que o
ciclo das grandes obras havia chegado ao fim, e que era hora de “cuidar das
pessoas”. O faraônico projeto da Central do Brasil não se encaixa nesse
discurso. Mais sensato seria cuidar das pessoas que procuram — e não encontram
— atendimento nos débeis hospitais da cidade.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*



0