O Brasil ocupa a sexta colocação em um ranking de 57 países
em que fazer o transporte de carga é mais arriscado, segundo pesquisa realizada
este ano pelo comitê de transporte de cargas do Reino Unido – o Join Cargo
Committee. O país só perde para regiões conflagradas e em guerra, como Síria,
Líbia, Iêmen, Afeganistão e Sudão do Sul. Os dados foram apresentados durante
seminário “Ilegal, e daí?”, realizado pelo jornal O GLOBO, em parceira com
Extra, Valor Econômico e revista Época. Para o
procurador do Ministério Público Federal José Maria de Castro Panoeiro, as
quadrilhas de roubo de carga e contrabando estão estruturadas em cadeias de
distribuição, que financiam grupos, organizados como empresas.
Essa estrutura funciona como se fosse uma empresa. Em geral,
ataca-se a ponta, mas isso não resolve o problema porque você prende um
receptador que é só uma peça na engrenagem. Você tem que desmontar a máquina,
mas precisa de um trabalho de investigação. Hoje, em 90% dos casos, processo
criminal é de prisão em flagrante, não tem trabalho investigativo — observa
Panoeiro.
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O presidente do Conselho de Controle de Atividades
Financeiras (Coaf), do Ministério da Fazenda, Antônio Gustavo Rodrigues,
revelou que um dos desafios para enfrentar os cartéis de criminosos é rastrear
o dinheiro e o produto da lavagem de dinheiro:
— Tem que haver o casamento da área jurídica com econômica.
Nós monitoramos as movimentações suspeitas e transações financeiras, mas nem
toda operação suspeita é ilegal e muitas são feitas por grandes empresas
constituídas. Quando o recurso entra no banco, é possível rastrear sua origem.
Mas o dinheiro vivo é muito difícil de se identificar — ponderou Rodrigues.
Para a presidente da Comissão de Segurança Pública da
Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), deputada Martha Rocha (PDT),
o roubo de cargas no estado se transformou em uma forma de diversificação dos
negócios do tráfico de drogas.
— As organizações criminosas estão utilizando o roubo para
financiar a compra de armas. Somente este ano, os caminhões que transportam
cargas de uma empresa fabricante de biscoito e macarrão, com sede na Pavuna,
foram roubados 47 vezes — lembrou a deputada.
CIGARROS: METADE É CONTRABANDEADA
Entre os cinco produtos mais roubados nas estradas do Rio de
Janeiro está o cigarro. Neste mercado, a indústria estima que hoje metade do
que é vendido no país seja resultante de roubo ou contrabando.
— No Rio, já não entregamos em diversas áreas da cidade. No
Rio Grande do Sul, nós fechamos uma fábrica por causa do contrabando, e
reduzimos em 30% a compra de fumo e matéria-prima de agricultores. O imposto no
Paraguai é de 16%, aqui é de quase 80%. O produto do Paraguai chega aqui com um
terço do preço, e 70% dos produtos contrabandeados no Brasil têm origem nesse
país vizinho. Além disso, essa prática põe em risco toda política de saúde
pública brasileira em relação ao cigarro, na medida em que o produto ilegal tem
compostos proibidos pela Agência Nacional de Vigilância em Saúde (Anvisa) —
ressalta Liel Miranda, Presidente da Souza Cruz.
No varejo, o roubo e o contrabando de produtos têm elevado
os custos das empresas e aumentado o preço cobrado ao consumidor, ou ainda tem
levado ao desabastecimento de algumas áreas da cidade do Rio. Com seu principal
centro de distribuição localizado em uma área conflagrada da Zona Norte, o
grupo chileno Cencosud, que opera o supermercado Prezunic, calcula um aumento
de 400% no número de ataques aos caminhões transportadores de alimentos e
produtos, no ano passado.
— Montamos um comitê de crise de prevenção de perdas para
coibir o roubo de cargas. Em duas horas, o veículo é abordado e esvaziado para
depois ser comercializado em feirões livres. Isso leva ao aumento do custo do
frete, necessidade de implementar a segurança privada, mudar janelas de
entrega, sistema de comboios de veículos, alteração de rotas. E parte da
população opta por comprar produtos mais baratos no mercado ilegal – alerta
Marco Aurélio Prometti, diretor do Prezunic.
O procurador do Ministério Público Federal José Maria de
Castro Panoeiro defendeu a responsabilidade coletiva na compra de produtos
roubados e contrabandeados:
— É reponsabilidade de quem compra e, por isso, é preciso
difundir uma cultura da noção de coletivo. Cada um pensa em si, somos
individualistas, mas por trás do mercado ilegal está a eliminação do mercado
legal — ressalta Panoeiro.
O seminário “Ilegal, e daí?”, realizado pelo jornal O GLOBO
em parceira com Extra, “Valor” e “Época”, tem patrocínio de Enel, Light, Souza
Cruz e Sindicom.
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