Celulose fechou ciclo, diz Votorantim

A
venda do negócio de celulose, concluída na quinta-feira à noite, com a
transferência do controle da Fibria para o grupo Suzano, representou apenas o
fim de um ciclo desse negócio para o grupo Votorantim, diz João Miranda,
presidente da companhia, em entrevista ao Valor. Com o aval dos acionistas – a
família Ermírio de Moraes – e o suporte de sua equipe de executivos, Miranda
comandou as negociações. “Não foi desalavancagem de dívida que nos levou a
isso. Estamos, e ficaremos ainda mais ao longo deste ano, confortáveis
financeiramente”, afirmou. Ele ressaltou que, como gestora de ativos, com
presença no controle e co-controle de vários negócios, a companhia e seus
acionistas têm esse conceito como orientador, para sair de certos negócios e
entrar em muitos outros, na hora oportuna. “O grupo não está definhando,
ao contrário, vem se realinhando”. Com receita na casa de R$ 26 bilhões, e
líder em alguns setores, vai completar em 2018 seu centenário de fundação.
“Temos um grande futuro pela frente”, diz executivo.

 

Abaixo,
integra da entrevista:

 

Valor:
Por que a Votorantim decidiu ir adiante com a combinação de Fibria e Suzano?

João
Miranda: A Votorantim tem se transformado continuamente ao longo de sua
história. Começamos a cem anos atrás como uma empresa têxtil, depois aumentamos
o escopo de nossas atividades e nos tornamos um conglomerado em setores de base,
como cimento, siderurgia, mineração e metalurgia de alumínio, zinco e níquel.
Foi assim que demos a nossa contribuição ao desenvolvimento industrial
brasileiro, gerando valor com competitividade e eficiência e também criando
empregos de qualidade. Ao final dos anos 80, adicionamos investimentos no setor
agrícola exportador, com celulose e citricultura. Em 2001 iniciamos o processo
de internacionalização, adquirindo a primeira operação de cimento fora do
Brasil. Desde então, seguimos esse caminho e hoje temos presença geográfica
diversificada. A geração de energia elétrica renovável já ganha espaço e sua
participação crescerá significativamente.

 

Valor:
E os vários desinvestimentos, como e por quê aconteceram?

 

Miranda:
Durante esse longo período e sempre por razões eminentemente estratégicas e que
visaram balancear o nosso portfólio de ativos, saímos de negócios têxtil, de
distribuição de energia, de aços planos (U siminas), dentre outros do grupo.

 

Valor:
Foi isso, ou um motivo de maior relevância, que levou o grupo à decisão de
deixar Fibria, resultado de consolidação que fez no setor?

 

Miranda:
A decisão de combinar a Fibria com a Suzano e reduzir nossa participação
societária na empresa resultante não foi trivial. Em primeiro lugar, a Fibria é
uma referência e líder em seu segmento: tem gestão executiva competente e
amplamente reconhecida, com capacidade de crescer e criar valor; é comprometida
com a sustentabilidade e com a criação de impacto social positivo e um nível de
governança que a distingue muito positivamente. E uma forte vertente inovadora,
iniciada na pesquisa e desenvolvimento clonal, que se expande para usos
alternativos da fibra de eucalipto.

 

Valor:
Então, por que, com esses atributos da Fibria, o grupo seguiu com a combinação
das empresas?

 

Miranda:
Para a Votorantim, foram dois os principais argumentos na decisão. O motivo
dominante diz respeito à decisão dos acionistas da Votorantim de reduzir a
exposição agregada do portfólio a negócios cíclicos, assim minimizando a
exposição a fatores exógenos, como câmbio e preço de commodities. A segunda,
mais específica à transação com Suzano, se refere à geração de sinergias
esperadas de R$ 8 bilhões a R$ 10 bilhões em valor presente, cuja partição, com
o negócio, foi capaz de resultar em uma operação equilibrada. Boa para todos.
Além disso, o compromisso com a meritocracia, a potencialização conjunta da
inovação, sustentabilidade e práticas de governança de alto padrão.

 

Valor:
Podemos esperar a venda de outras empresas da Votorantim?

 

Miranda:
Sempre se poderá esperar ajustes em nosso portfólio, adicionando ou
desinvestindo de negócios ou empresas. Contudo, vale lembrar que nosso capital
é paciente e nosso propósito inegociável. Somos uma holding de investimentos
permanentemente capitalizada, que visa retornos superiores, com respeito à
natureza e às pessoas, além de buscar sempre criar impacto social positivo.
Essa é a forma de ser da Votorantim e esse é o DNA das nossas empresas,
inclusive da Fibria.

 

Valor:
As ações de Fibria caíram no dia do anúncio, enquanto as de Suzano subiram. A
transação foi boa para os acionistas de Fibria?

 

Miranda:
A possível combinação de Suzano e Fibria vem despertando a atenção há algum
tempo. Some-se a isso, as corretas e tempestivas comunicações e fatos
relevantes levados a conhecimento do mercado pela Fibria e Suzano sobre uma
possível transação. Segundo analistas, essa exposição colocou a Fibria no
centro da disputa entre dois contendores. Certa ou errada, essa interpretação
dos fatos, elevou o preço das ações da Fibria antes da transação. Assim,
segundo os mesmos, o que ocorreu na última sexta-feira, quando foi assinada a
transação entre os acionistas de ambas, foi uma correção técnica de preços das
ações das duas empresas, convergindo para a avaliação relativa considerada na
transação, incorporando a expectativa de sinergias.

 

Valor:
E especificamente para os acionistas da Fibria?

 

Miranda:
Negociamos em conjunto com BNDES uma transação para todos os acionistas da
empresa, controladores ou minoritários, que poderão realizar uma monetização
significativa [mais de 83% do valor total em caixa] e ao mesmo tempo manter uma
exposição à empresa resultante. Ganha também o mercado de capitais com uma
empresa resultante competitiva globalmente, sólida, com governança madura e com
expressivo “free float” de 53%.

 

Valor:
Como a família Ermírio de Moraes reagiu à saída desse negócio, formado ao longo
de 30 anos?

 

Miranda:
Com muita naturalidade – e consenso -, consciente de que pôde agregar valor à
Fibria e aos seus acionistas, logo após ter completado mais um ciclo de
expansão, com nova linha na fábrica de Três Lagoas (MS).

 

Valor:
Para onde vai a Votorantim e o que será feito com os recursos da venda das
ações da Fibria?

 

Miranda:
As empresas Votorantim têm investido anualmente cerca de R$ 3,5 bilhões de
reais (sem considerar a Fibria) e seguem com grande capacidade de geração
própria de recursos, os quais em grande parte reinvestidos. Temos comprovada
capacidade de gerar alternativas de investimento dentro e fora do Brasil e estamos
atentos aos riscos e oportunidades de investimento derivados da nova economia.
Um exemplo bem concreto neste momento é a energia renovável. Já temos a
plataforma montada com mais de 500 MW em eólica em operação e um portfólio de
projetos para mais que dobrar no curto prazo. Em parceria com o CPP-IB [fundo
canadense] vamos investir mais de R$ 3 bilhões nos próximos anos na sua
expansão.

 

Valor:
Que tipos de negócios o grupo olha como oportunidades de investir, adotando a
estratégia de uma gestora de portfólio de ativos?

 

Miranda:
Nossas reflexões estratégicas na companhia, em diálogo constante com os
acionistas, o conselho de administração e o grupo de diretores executivos, vão
da análise dos negócios tradicionais aos de marca, como bens duráveis, até áreas
de novas tecnologias. Como se fôssemos recriar a Votorantim Novos Negócios [que
teve uma carteira de empresas na década passada e que foi vendida], mas num
outro conceito e dimensão. Há um desejo sim de ir para negócios mais leves em
capital financeiro e mais intensivos em capital humano e intelectual.

 

Valor:
E os negócios tradicionais, como cimento, mineração (zinco e alumínio) e suco
de laranja?

 

Miranda:
Eles passam por uma transformação digital que levará a uma maior produtividade
e qualidade de serviços aos clientes. Vimos neles potencialidades de
crescimento. Abrimos o capital da Nexa (ex- Votorantim Metais, de zinco e
outros metais) e podemos crescer em cimento nas Américas, com novas fábricas,
expansões das atuais e até com aquisições. Em suco de laranja temos, por
exemplo, um mercado enorme na Ásia a ser desbravado.

 

Valor:
Como o grupo, financeiramente, deve chegar ao fim de 2018?

 

Miranda:
Chegaremos a um nível de endividamento, medido na relação dívida líquida sobre
Ebitda [lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização], inferior ao
alvo de 2 vezes definido em nossa política. Sem considerar qualquer recurso
[cerca de R$ 8,55 bilhões, além de 5,67% de ações da Suzano] advindo da
transação. Assim, estaremos confortáveis em tomar todo o tempo necessário entre
assinatura e conclusão do negócio para avaliar como melhor alocar o capital.

 

http://www.valor.com.br/empresas/5392789/celulose-fechou-ciclo-diz-votorantim

 

Leia
Mais: O momento certo para formar a gigante global

19-03-18
– Valor Econômico

Valor
Econômico – Companhia nasce com valor estimado de R$ 83 bilhões após a união
com a Fibria, líder mundial de produção de celulose de fibra curta de eucalipto

 

O
empresário David Feffer, neto do fundador do grupo Suzano, Leon Feffer, soube
aproveitar o momento para fazer o negócio mais esperado do setor de celulose e
papel, no Brasil e no mundo, e conseguir o resultado que pretendia. Essa é a
avaliação predominante a respeito da tacada que leva a família Feffer ao
comando de uma companhia com valor estimado em R$ 83 bilhões, resultado da compra
da Fibria pela Suzano.

A
Suzano assume a liderança mundial no ranking dos produtores de celulose de
eucalipto, vinda da quinta posição. Objetivo primordial da transação para os
Feffer era que saíssem como os grandes industriais desse setor, no qual foram
pioneiros. E conseguiram: terão 46,4% do capital após a aquisição de 100% da
Fibria, que será paga 85% em dinheiro e 15% em ações da empresa que controlam.

Apesar
de muitos no mercado terem duvidado, por ser a Suzano menor que seu alvo, a
família Feffer fez a maior aquisição já realizada no mercado de capitais
brasileiro – com Fibria avaliada em R$ 50 bilhões (ações mais dívida líquida) –
com baixa alavancagem financeira e reduzida diluição de controle.

A diminuição
da fatia dos Feffer na empresa será de apenas 3,6% com a emissão de ações
necessária ao pagamento da operação. Hoje, possuem pouco mais de 51%.

Para
a transação, a empresa fará compromissos de US$ 9,2 bilhões. Mas os exercícios
de preço de celulose para 2018 apontam que sua dívida líquida após o negócio
deve oscilar entre 3,1 e 4,1 vezes o Ebitda consolidado das duas operações, sem
considerar as sinergias. O índice é bem mais confortável que os 7,5 vezes da
criação da Fibria, após a aquisição da endividada Aracruz pós-crise dos
derivativos cambiais de 2008.

Três
fatores determinantes, na avaliação de fontes envolvidas na transação e de
espectadores, tornaram esse resultado possível: a curva da celulose no mercado
global, a migração da Suzano para o Novo Mercado e a presença do BNDES como
sócio de empresas desse setor, que o banco há décadas elegeu como prioritário.

Quando
decidiram levar a Suzano para o Novo Mercado, no fim de julho, com uma
estrutura societária simplificada, as negociações de Feffer e Schalka com
representantes do grupo Votorantim e BNDESPar, donos da Fibria, começaram a
ganhar corpo.

David
Feffer sempre foi visto como um típico controlador brasileiro, centralizador de
poder e valor. Após a reorganização das finanças da Suzano, na gestão de
Schalka, a percepção começou a mudar e a valorização em bolsa continuou com a
adoção de uma estrutura de capital só com ações ordinárias.

Os
primeiros diálogos ocorreram em torno de uma combinação societária de empresas.
Mas não evoluíram. Estava impossível colocar na mesma equação o interesse de
todos: os Feffer no comando, Votorantim em busca de um modelo para monetizar o
ativo o máximo possível; e o desejo da BNDESPar de usar o direito de saída
conjunta. Então, entre o quarto trimestre de 2017 e o começo deste ano, o preço
médio de venda de celulose encorajou a Suzano, assessorada por Itaú BBA e Riza
Capital, a almejar o controle total Fibria.

Às
vésperas do Carnaval no Brasil e do Ano Novo Chinês, a Suzano levou à
Votorantim a primeira proposta de compra, na qual a parcela em dinheiro seria
de R$ 38,3 por ação e o restante em ações da Suzano. Há cerca de dez dias, essa
fatia em dinheiro subiu para R$ 52,50 por papel – e não se alterou mais.

A
corrida final do negócio, após a PE fazer proposta concorrente, deixou evidente
o papel estratégico do BNDES. O banco, dono de 29% da Fibria e 7% da Suzano,
fez sua escolha: combinou a maior venda de ações de sua história, de R$ 8,5
bilhões, com a manutenção de uma fatia relevante, de 11% da Suzano mais Fibria,
e o controle do capital nacional. A proposta sem garantia de recursos deu
segurança para decidir-se pela Suzano.

Aos
61 anos, David imprimiu seu nome na história do grupo, ao lado do avô, fundador
do negócio em 1939, e do pai, Max Feffer, que revolucionou o setor ao investir
em celulose a partir do eucalipto.

 

– Fonte: http://www.valor.com.br/empresas/5392779/o-momento-certo-para-formar-gigante-global



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