Alegando riscos estruturais, o governo do Rio de Janeiro solicitou que a Justiça reconsidere a decisão liminar (provisória) que impede o estado de gastar mais dinheiro público na obra da Estação Gávea do metrô. A construção da plataforma, que faz parte de trecho da Linha 4 do transporte, está parada desde 2015.
O documento da Procuradoria Geral do Estado (PGE) solicitando que o Judiciário revise o despacho, assinado em 7 de maio, foi obtido com exclusividade pelo G1.
A vontade da PGE esbarra no Ministério Público do Estado (MPRJ), que pediu que a operação seja interrompida ao apontar superfaturamento de R$ 3 bilhões na obra. Além disso, o órgão quer que a concessionária seja responsável pelos gastos.
Para concluir a estação, o Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) estima que seriam necessários mais R$ 700 milhões dos cofres públicos. O cálculo é da Subsecretaria de Auditoria e Controle de Obras e Serviços de Engenharia do TCE-RJ.
Em janeiro, a 16ª Vara de Fazenda Pública do Rio proibiu, na liminar, novos gastos do governo na obra. Isso porque, quinze dias antes, o TCE havia liberado novos investimentos.
Já a PGE se baseia em nota técnica da Rio Trilhos, empresa pública que fiscaliza o Metrô e os trens. O documento “atesta os riscos graves” de manter a obra paralisada.
O texto diz que há “possíveis consequências nefastas à integridade física de pessoas que habitam os edifícios do entorno” das obras.
O buraco de obras do Metrô Gávea foi inundado em janeiro do ano passado até que a obra fosse retomada, o que não ocorreu. A medida seguiu recomendação de um laudo técnico contratado pela própria concessionária Rio-Barra, responsável pela construção da Linha 4.
O documento garantia que, durante cinco anos, a obra poderia ficar inundada. Ou seja, até 2023. A nota técnica da Rio Trilhos deste ano vê o caso de forma diferente.
“Há risco de as estruturas da obra da Estação Gávea, hoje inundadas, ruírem e colocarem em perigo vidas e a estrutura de prédios lindeiros [próximos à obra]”, diz o parecer obtido pelo G1.
O pedido de reconsideração da liminar é assinado pelo chefe da Procuradoria de Serviços Públicos, Flávio de Araújo Willeman.
Em nota, a PGE informou que “está agindo pelos interesses do Estado e da população fluminense com toda diligência e em todas as frentes judiciais/administrativas”. A Concessionária Rio-Barra, responsável pela Linha 4, disse que “não foi notificada” e “por isso, não pode comentar”.
Já o MP informou que “vem se manifestando judicialmente” contra o investimento do governo na obra e que “os custos não recaíram sobre a concessionária, mas apenas sobre o Estado”.
Além disso, afirma que há “alternativas para custear as obras com recursos do setor privado, sem onerar mais os cofres públicos”.
O G1 pediu um posicionamento do governador Wilson Witzel (PSC) sobre o assunto, mas ainda não obteve resposta. A reportagem também questionou de onde sairia o dinheiro, mas não houve um posicionamento até a última atualização desta reportagem.
Desde 2017, há pedido para concessionária pagar obra
O G1 apurou que o pedido da PGE gerou uma nova discórdia no TCE-RJ. Isso porque o Ministério Público Especial de Contas, ligado ao TCE-RJ, também é contra os gastos públicos na obra.
A insatisfação ocorre principalmente porque, desde agosto de 2017, os procuradores fizeram quatro pedidos para a obra ser concluída às custas da concessionária – sempre com urgência.
Agora, os procuradores solicitam que o pedido seja analisado de maneira definitiva pelo próprio TCE para que os gastos não saíam dos bolsos dos contribuintes.
A concessionária da Linha 4 do Metrô chegou a ter os bens retidos, por conta do superfaturamento apontado pela Corte, mas o próprio TCE-RJ determinou o desbloqueio.
O Ministério Público Estadual (MP-RJ) defende que o Estado não pode realizar os gastos com as obras, entre outros motivos, por conta da crise financeira:
– decreto de calamidade pública obriga priorizar saúde, educação e assistência social
– impossibilidade de obter novos empréstimos
– ausência de dotação orçamentária para o gasto
– Plano de Recuperação Fiscal inviabiliza o pagamento
– Estado não pode tomar assumir o risco sozinho
– possibilidade da concessionária bancar a obra
‘Montanha de absurdos’
Em agosto, o G1 mostrou um pedido de suspensão dos contratos de concessão das linhas 1, 2 e 4 do Metrô. A representação do Ministério Público Especial de Contas foi negada pelo TCE-RJ.
Os procuradores dizem que “superabundam” motivos para a anulação e falam em “montanha de absurdos”. A representação citava:
– monopólio das concessões em um só grupo empresarial;
– superfaturamento de R$ 2,3 bilhões na Linha 4 (atualizados, chegam a R$ 3 bi);
– aumento do aporte público na obra;
– dificuldade de calcular o valor justo da tarifa com base no lucro da concessionária, porque os documentos que baseiam este cálculo sumiram, segundo os procuradores.
“A nossa única dúvida é quanto ao adjetivo para qualificar o que foi escrito acima: um descalabro, um absurdo ou um escândalo?”, concluem os procuradores no documento obtido à época pelo G1.
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