Se caminha para superar os Estados Unidos e assumir a ponta da produção mundial de soja em grão e para fortalecer sua liderança nas exportações da commodity nesta safra 2019/20, ndependentemente dos rumos das relações comerciais entre Washington e Pequim, o Brasil tem pela frente um cenário também positivo para as vendas dos principais derivados da oleaginosa, sobretudo em razão da tendência de aumento da demanda por farelo e óleo no mercado interno no próximo ano.
Foi o que sinalizou a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) em encontro com jornalistas ontem em São Paulo, quando questões como as elevação das tarifas sobre as exportações na Argentina, as incertezas que ainda cercam os preços dos frentes do país ou uma eventual extinção do acordo que proíbe que as grandes tradings comprem a matéria-prima de áreas desmatadas na Amazônia depois de 2008 foram colocadas como pontos de atenção, mas não como fatores capazes de influenciar de forma importante o avanço do segmento.
Como informou na sexta-feira, a Abiove estima que a colheita nacional de soja alcançará 122,8 milhões de toneladas em 2019/20, 4,2% acima de 2018/19 e volume 27,1% maior que o previsto pela Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) para aquele país na temporada (96,6 milhões). Segundo a entidade, as exportações brasileiras do grão deverão crescer 3 milhões de toneladas e chegar a 75 milhões no ano que vem, ante as 48,3 milhões de toneladas projetadas pelo USDA para os embarques americanos. Como calcula um preço médio das vendas externas estável em US$ 360 por toneladas, a Abiove projeta a receita das vendas externas do grão do Brasil em US$ 27 bilhões, ante os US$ 25,9 bilhões previstos para 2019.
Tendo em vista que em 2018 as exportações do grão bateram o recorde de US$ 33,2 bilhões, referentes a 83,3 milhões de toneladas, a recuperação será apenas parcial, mas ainda porque a demanda da China, que lidera com folga as importações mundiais de soja, deverá continuar menor do que já foi em virtude da epidemia de peste suína africana que tem reduzido o plantel de porcos do país de forma expressiva – e, com isso, também a demanda chinesa por farelo para rações para alimentar os animais. A Abiove manteve sua previsão apesar de EUA e China terem anunciado na sexta-feira um armistício na guerra comercial que travam desde meados de 2018, num sinal de que não acredita que o Brasil perderá espaço no mercado de seu maior parceiro no segmento.
A entidade também garante que o volume previsto continuará a ser garantido com a continuidade da moratória da soja na Amazônia, já que as tradings continuam a não comprar o grão de área desmatadas no bioma depois de 2008. E vê fretes mais caros no ano que vem, mas sem interrupções no escoamento.
Mesmo em relação aos preços, afirmou André Nassar, presidente da entidade, o entendimento sino-americano poderá provocar mudanças apenas modestas, já que uma possível valorização mais sustentada na bolsa de Chicago tende a ser compensada pela redução dos prêmios nos portos brasileiros. “De qualquer forma, defendemos desde o início que uma guerra comercial entre EUA e China é ruim, porque gera distorções no nosso mercado, até pelos subsídios concedidos por Washington a seus produtores, e incertezas na economia global”, disse.
E, se não teme perder mercado para a soja em grão na China mesmo que o arrefecimento da guerra, a Abiove renovou suas esperanças de que o país asiático abra seu mercado para o farelo de soja brasileiro. Aparentemente existe boa vontade para tal, mas o fato é que o acordo fitossanitário necessário para que a porta seja aberta ainda não foi assinado.
Enquanto isso não acontece, as boas perspectivas para o derivado se concentram no mercado doméstico, já que as exportações de carnes de frango e suína estão em alta – por causa da China -, o que tem estimulado o incremento da produção desses animais no Brasil.
Nesse contexto, a Abiove projeta que a produção doméstica de farelo somará 33,5 milhões de toneladas em 2020, 1,1 milhão a mais que o volume estimado para este ano. Como as exportações deverão cair de 15,8 milhões para 15,3 milhões de toneladas na comparação, o aumento tende a ficar no país. No caso do óleo de soja, é o aumento do percentual obrigatório da mistura de biodiesel no diesel para 12% a partir de março que anima a indústria – a entidade prevê que a produção vai crescer de 8,6 milhões para 8,8 milhões de toneladas, enquanto calcula que as exportações deverão recuar de 1 milhão para 300 mil toneladas.
O cenário é mais favorável para os derivados, mas a indústria ainda enfrenta problemas com créditos de ICMS acumulados que não consegue utilizar – 100% do farelo vendido no mercado doméstico é desonerado, e há crédito presumido, por exemplo. Esperamos que a reforma tributária em discussão resolva esse problema, caso contrário as margens serão reduzidas”, afirmou Nassar. Dado o atual panorama do mercado doméstico, a Abiove não acredita que as novas taxas sobre as exportações argentinas terá influência relevante sobre os negócios das companhias instaladas no Brasil.
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