O investimento em projetos de infraestrutura sustentável é um caminho que o Brasil deveria seguir para promover a recuperação da economia no pós-pandemia, defendeu ao Valor o ex-representante do Brasil no Banco Mundial Rogério Studart, que hoje é pesquisador do World Resources Institute (WRI), um centro de estudos (think tank) para a chamada economia de baixo carbono.
O economista avalia que esse pode ser um caminho para atração de recursos privados internacionais para os projetos de infraestutura, dado que a sustentabilidade é uma exigência em muitos fundos de investimento no exterior. Segundo ele, o governo também deve entrar com recursos, dentro de suas limitações, mas teria principalmente o papel de articulador dos projetos.
Os investidores estrangeiros todos hoje têm mandato de sustentabilidade. É preciso que o Brasil faça um plano de infraestrutura com sustentabilidade, que atraia tecnologia de ponta, disse, listando áreas como eficiência energética, mobilidade urbana, saneamento, limpeza de nascentes dos rios, replantio de nascentes, preservação de manguezais, que não exigem projetos grandiosos.
Isso tudo pode gerar um volume de empregos inacreditável, afirmou. Assim que abrir, a economia há condições de criar milhares de empregos fazendo isso, pequenos projetos, e depois partir para os grandes projetos.
Segundo Studart, a questão ambiental hoje é vista também como um fator de risco para a reputação de empresas e investidores, afetando a disposição para projetos de longo prazo. Os investidores privados hoje temem investimento em infraestrutura no Brasil. É muito risco. E com infraestrutura sustentável o Brasil pode atrair mais capital privado.
Hoje em dia, a discussão internacional é de diversificação de portfólio. O capital está saindo de infraestrutura tradicional para projetos sustentáveis, disse, completando que o Brasil precisa de recursos públicos mais para gerar bons projetos verdes e que conta com desenvolvedores de qualidade, como BNDES e Febraban.
Ele recentemente publicou na página do WRI texto defendendo que o Brasil já se prepare para o momento pós-pandemia usando esse caminho. Não podemos deixar de começar a nos planejar para o Brasil durante e após a pandemia. Afinal, as projeções econômicas indicam que estamos lidando com um impacto semelhante ao de uma guerra,disse no artigo também assinado por dois outros funcionários do think tank, Sebastian Keneally e Bruno Calixto.
O texto lembra que há muitos anos o Brasil convive com uma crise de investimentos públicos e privados em infraestrutura social e econômica, que caíram de mais de 5% do PIB nos anos 80 para menos de 2% do PIB, volume insuficiente até mesmo para cobrir a depreciação do estoque existente.
Este baixo investimento, por sua vez, se traduz não só em uma baixa produtividade e competitividade, mas também na baixa qualidade e cobertura de serviços públicos fundamentais – como transporte coletivo, saneamento, conectividade e estruturas de educação e saúde, afirma. Sem medidas extraordinárias, a crise atual somente tende a agravar essa tendência, completam os autores.
É nesse contexto que ele aponta o desafio de ampliar os investimentos que envolvam sustentabilidade. Estimativas mostram que a cada 1% gasto em infraestrutura há um retorno de até 3% em PIB em dez anos e de até 8% em 30 anos. Se essa infraestrutura considerar critérios
ambientais, climáticos e sociais, ela ainda potencializa a eficácia dos resultados. São investimentos que representam utilização inteligente de escassos recursos públicos, que preservam o capital natural do país, e que têm maior chance de mobilizar recursos privados, nacionais e internacionais, afirmam os autores.
O artigo aponta que o primeiro passo é fortalecer a capacidade de planejamento, utilizando instituições públicas e privadas, além de se obter apoio e financiamento nacional e multilateral para promover melhoria da qualidade dos projetos de Estados e municípios. A questão aqui é, portanto, transformar essas capacidades dispersas em mecanismos articulados de promoção de um plano nacional de investimentos em infraestrutura de qualidade, diz.
Studart e seus colegas destacam que é preciso também maximizar a oferta de financiamento de longo prazo, utilizando os limitados recursos públicos para mobilizar recursos privados.
É importante notar que o Brasil vem desperdiçando há anos oportunidades de mobilizar recursos em infraestruturas sustentáveis. Em 2019, a emissão global de títulos verdes foi estimada em US$ 257,5 bilhões, um recorde em relação aos anos anteriores, comentam, apontando ainda que a maioria está concentrada na Europa, na América do Norte e na Ásia-Pacífico, especialmente na China.
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