A Andrade Gutierrez (AG), entre as empresas brasileiras, é apontada como uma das que podem ter mais dificuldades nesta crise. A Lucror Analytics avalia que elas estão relacionadas aos problemas no setor de construção, que é um dos mais cíclicos. Mas aponta ainda o pouco acesso da empresa a crédito, por conta dos problemas relacionados à Lava Jato. No campo financeiro, a empresa não tem hedge (proteção cambial) para pagamento de cupons de juros de bônus que vencem este ano, de cerca de US$ 40 milhões. Além disso, tem pagamentos de acordo de leniência.
Também levando tudo isso em consideração, no fim de abril, a Fitch Ratings rebaixou os ratings de emissor de longo prazo (IDR, na sigla em inglês) da Andrade Gutierrez Engenharia em moeda estrangeira e local de ‘CCC+’ para ‘CCC-‘. A Fitch também rebaixou para ‘CCC-/RR4’ o rating das notas seniores com garantia e vencimento em 2021 e 2024 da Andrade Gutierrez International.
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A agência citou o elevado risco de refinanciamento da empresa e a forte pressão em sua liquidez, em meio a um cenário de forte de desaceleração econômica. Apontou uma posição fraca de caixa, de R$ 400 milhões, para sustentar amortizações de dívida, pagamentos de cupons e multas ao longo de 2020. Para a Fitch, a empresa está altamente exposta à decisão de amortizar pagamentos de dívidas e cupons de juros de cerca de R$ 400 milhões em 2020 ou preservar caixa de forma estratégica para sustentar suas operações, conforme relatório. Procurada, a Andrade Gutierrez não deu entrevista.
Apesar desse cenário delicado traçado pelas agências, os bônus da empresa tiveram alta de quase 30% em um mês. Segundo investidores ouvidos pelo Valor, a questão é que as agências estão olhando uma fotografia da empresa do fim do ano passado. Mas, de lá para cá, ela vem divulgando notícias que alimentam a expectativa de que ela não terá problemas de liquidez no curto prazo. O resultado do primeiro trimestre saiu no início de junho.
Nos últimos meses, 65% da carteira de contratos da empresa se concentrou no exterior. Como ela tem receitas crescendo em euros e dólares, a desvalorização do real não vai afetar sua capacidade de pagar o cupom. Por essa razão ela teria optado por não arcar com os custos de hedge do pagamento.
A empresa está atuando em projetos de infraestrutura em Moçambique, Angola, Gana, República Dominicana e Portugal. No primeiro trimestre, fechou contratos que somam R$ 1,5 bilhão – 80% desse valor em moeda forte. Esse montante é superior à receita do período, que foi de R$ 1,1 bilhão, com crescimento de 300%. Para investidores, se o que foi contratado supera a receita, a sinalização é de que a companhia vai entregar crescimento à frente.
A pandemia afeta as operações pois ela teve de paralisar obras. Isso significa parar a produção e receber menos, mas também gastar menos – 80% do custo é variável, se não tem obra, ele não acontece. As multas de leniência também estão sendo pagas em dia.
A tese dos investidores que apostam no papel e na liquidez da empresa no curto prazo será comprovada ou não no fim do mês. Dia 30 de junho a empresa tem de pagar um cupom de US$ 20 milhões; outros US$ 20 milhões vencem em dezembro. No fim do ano passado, a Andrade fez um refinanciamento da dívida, com a emissão de US$ 425 milhões, e neste ano não há nada vencendo, apenas juros.
No longo prazo, do ponto de vista da variação cambial sobre o principal da dívida da empresa, que vence em 2024, possivelmente a geração de caixa da empresa não será suficiente e deverá haver um novo refinanciamento.
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