Valor Econômico – A Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (MPF) defendeu que é necessário realizar uma “consulta prévia, livre e informada” dos povos indígenas e comunidades tradicionais atingidos pelo projeto da Ferrogrão, ferrovia com 933 quilômetros que pretende ligar Sinop (MT) e Miritituba (PA).
Em nota técnica, o órgão aponta que relatórios da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), publicados no ano passado, indicam que há 48 terras indígenas e Áreas de Especial Proteção Ambiental no entorno da Ferrogrão e que a obra irá produzir impactos socioambientais em uma região importante para a conservação da biodiversidade.
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Segundo o Ministério Público, apesar da “grandiosidade do empreendimento e dos impactos socioambientais decorrentes da sua implementação”, os povos indígenas não foram consultados sobre o projeto, conforme prevê Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil.
“A instalação da Ferrogrão e do complexo de infraestrutura multimodal, assim como das obras necessárias para a sua instalação, ao pressionarem e ameaçarem terras indígenas, incorrem, necessariamente, no dever de observância ao direito à consulta”, diz o órgão.
De acordo com o MPF, o processo da ferrovia foi enviado pela ANTT e pelo Ministério da Infraestrutura ao Tribunal de Contas da União (TCU) para emissão de parecer para apreciar a concessão sem implementar o direito à consulta.
“Ressalta-se que a consulta é uma oportunidade para a reflexão intercultural entre o Estado e os povos indígenas. Desse modo, a participação pressupõe a boa-fé, imprescindível para a constituição dos meios válidos para se chegar a um consentimento ou a um acordo. O que significa que, antes de iniciado um processo decisório, as partes devem se colocar em um diálogo que permita, por meio de revisão de suas posições iniciais, chegar à melhor decisão”, diz a nota técnica.
O MPF afirma ainda que a região é historicamente caracterizada por conflitos ambientais e fundiários e já é afetada por outros empreendimentos, como a BR-163. Para o órgão, a obra “ocasionará o aumento da pressão sobre os recursos naturais em razão do incremento do garimpo ilegal, da grilagem de terras e do desmatamento”.
O Ministério Público lembra também que a medida provisória de 2016 que alterou os limites do Parque Nacional do Jamanxim, unidade de conservação que será afetada pela Ferrogrão, foi contestada no Supremo Tribunal Federal (STF) e que o ministro Alexandre de Moraes suspendeu a validade da norma.
No mês passado, nota técnica elaborada pela Câmara de Consumidor e Ordem Econômica do MPF defendeu a importância da Ferrogrão, levando em conta aspectos concorrenciais e de ordem econômica.
Segundo o documento, o projeto representa um avanço no desenvolvimento e integração da infraestrutura de transporte do país. Além disso, contribui para ampliar a concorrência no setor, com possível diminuição nos preços do frete.
A manifestação gerou reação da Rede Xingu+, que criticou o fato de o texto por não fazer “nenhuma menção” ao direito à consulta dos povos indígenas.
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