Após ʽboomʼ, reabertura da China deve determinar preços de commodities em 2023

Valor Econômico – Passado o “boom” das commodities, puxado pela retomada das economias de diversos países após a fase mais dura da pandemia, as matérias-primas mergulharam em um mar de volatilidade em 2022. Primeiro, a invasão russa à Ucrânia, que jogou os preços das mercadorias energéticas, metálicas e agrícolas para o alto. Na época, o minério de ferro e o petróleo ultrapassaram o patamar de US$ 100.

Depois, a partir do segundo semestre do ano passado, a desaceleração da economia chinesa, provocada pela rígida política de covid zero e pela crise no setor imobiliário, voltou a colocar a demanda por commodities em cheque, dada a participação relevante da China no mercado, em especial de minério e petróleo. Consequência disso, houve uma forte correção de preços.

Ainda, em um terceiro momento, já no fim do ano passado, uma onda de protestos contra as medidas de isolamento levou o governo chinês a afrouxar a política de covid zero. Mais uma vez, as cotações, em especial do minério de ferro, subiram com a boa fé de que a demanda chinesa por commodities voltaria pujante.

Diante de tal otimismo, o mês de janeiro de 2023 foi marcado pela continuidade do rali das matérias-primas, com o mercado na expectativa pela reabertura da economia chinesa. Até que chegou o Ano Novo chinês. “A festividade puxou uma recuperação da atividade econômica, mas não com a mesma força que o mercado aguardava. Ao mesmo tempo, o dólar se fortaleceu e segurou a guinada das commodities, em especial as relacionadas à China”, explica Lucas Brunetti, analista de commodities da Garde Asset Management.

A expectativa era a de que a diminuição das restrições melhorasse a mobilidade na China e, consequentemente, o aumento do consumo de combustíveis elevasse a demanda por petróleo e derivados. “Estamos vendo isso, em certa medida, mas não na velocidade que o mercado esperava. Houve uma euforia com o anúncio da reabertura, mas agora já deu uma esfriada”, complementa Brunetti.

Mesmo assim, pondera o analista da Garde, ainda existe um otimismo por parte do mercado para as commodities neste ano. Os investidores estão apostando no crescimento da economia chinesa para aumentar a demanda por matéria-prima e, assim, puxar os preços para cima.

Parte da confiança também está relacionada à mudança nas projeções para as economias dos Estados Unidos e Europa. Isso porque, acrescenta Brunetti, havia antes um temor generalizado de recessão nos países desenvolvidos em razão do ciclo de alta de juros, que ainda está em curso. Mas os indicadores econômicos mais recentes têm levado o mercado a rever as expectativas para um cenário de desaceleração mais branda de ambas as economias.

No que diz respeito à retomada da China, Gabriela Joubert, analista-chefe do Inter, é um pouco mais cética e avalia que, passado o Ano Novo chinês, o mercado agora começa a entrar em modo de cautela para entender melhor para onde a economia chinesa vai caminhar.

“A produção siderúrgica continua patinando, a crise no setor imobiliário não dá sinais de arrefecimento, então a produção de aço na China deve ser menor do que em 2022. E isso faria com que os preços do minério caíssem até o final do ano”, diz. Atualmente, ela espera que o preço do minério de ferro chegue a US$ 90 a tonelada até o final de 2023.

Mineração e siderurgia
Entre as empresas de mineração e siderurgia listadas na bolsa, Gabriela mantém preferência pelas ações da Gerdau (GGBR4). “É a nossa favorita, bastante diversificada e bem administrada. Os papéis estão sofrendo agora, mas por um movimento de realização de lucros porque subiram muito”, destaca.

Nas recomendações fornecidas por analistas de bancos, corretoras e casas de análise ao Valor PRO, oito instituições têm recomendação de compra para as ações da Gerdau, enquanto uma tem recomendação neutra, com preço-alvo médio de R$ 36,25. Para a Metalúrgica Gerdau (GOAU3; GOAU4), são duas recomendações de compra e uma neutra, com preço-alvo de R$ 16,5.

Ainda, para os papéis da CSN (CSNA3), são cinco recomendações de compra e duas neutras, com preço-alvo médio de R$ 19,55. No caso da CSN Mineração (CMIN3), são seis recomendações de compra e uma neutra, com preço-alvo médio de R$ 5,88.

As ações da Usiminas (USIM5) têm, ao todo, nove recomendações, das quais quatro são de compra e cinco são neutras. A média das estimativas de preço-alvo dos papéis da companhia é de R$ 10,21.

Para as ações da Vale (VALE3), o consenso de analistas aponta oito recomendações de compra, uma neutra e uma recomendação de venda. Na média de estimativas, o preço-alvo para os papéis da companhia é de R$ 98,7. Gabriela diz ter uma visão cautelosa para os papéis da mineradora, dado o patamar de preço atual das ações da empresa na bolsa.

Petróleo
Em relação ao cenário para o petróleo, Gabriela vê a oferta bastante limitada. Além dos impactos na cadeia produtiva causados pela pandemia, ela lembra que a guerra afetou ainda mais a commodity, uma vez que a Rússia, que é um grande produtor de petróleo e gás, reduziu a produção por causa dos embargos feitos pelos países do Ocidente. Ao mesmo tempo, tem também a Opep, que ainda não retomou o patamar de produção de antes da crise de covid-19.

“A Ucrânia em um cenário ainda delicado de guerra e sem previsão de solução deve continuar pressionando o petróleo, que deve ver um aumento na demanda por causa da retomada da China. Com uma oferta limitada e uma demanda maior, os preços da commodity devem permanecer em patamares significativos “, contextualiza. Ainda assim, a analista-chefe do Inter projeta o preço do barril entre US$ 80 e US$ 90 ao longo deste ano, um patamar considerado lucrativo para as empresas do setor, diz.

Olhando para as empresas de petróleo, Gabriela tem as “juniores” como preferidas para se beneficiar do preço da commodity no mercado internacional. Em relação à Petrobras, a analista-chefe afirma que a casa está fugindo de estatais federais neste primeiro ano de governo Lula. Assim, as ações de Prio (PRIO3), 3R (RRRP3) e PetroRecôncavo (RECV3) ganham mais espaço diante da possibilidade de interferência política na Petrobras (PETR3; PETR4).

Das companhias “juniores”, a 3R é a única que tem 10 recomendações de compra entre os analistas de bancos, as corretoras e casas de análise da base do Valor PRO. O preço-alvo das ações da empresa é de R$ 85,62.

Para os papéis da Prio, são nove recomendações de compra e uma recomendação neutra, segundo as informações fornecidas ao Valor PRO, com preço-alvo médio de R$ 47,52. No caso da PetroRecôncavo, são oito recomendações de compra e uma neutra, com preço-alvo de R$ 38,87.

As ações da Petrobras se diferem entre os pares setoriais por terem mais recomendações neutras do que de compra – são cinco contra quatro, respectivamente. O preço-alvo para os papéis da estatal é de R$ 33,04.

Proteína animal
Olhando para as commodities agrícolas, em especial a proteína, Manuela Granja, analista de frigoríficos do Inter, destaca que o cenário para a exportação de carne bovina continua favorável para o Brasil, uma vez que o país está entrando no ciclo positivo do gado, o que deve aumentar a oferta em 2023. Um obstáculo é que recentemente identificou-se um caso de vaca louca na carne brasileira. No entanto, tudo que se sabe é que deve ser um caso pontual, o que não deve prejudicar o cenário de exportação brasileiro.

Um contrapeso, porém, diz respeito ao consumo doméstico. Com a inflação e os juros pesando no orçamento dos brasileiros e no nível de endividamento das famílias, muitas pessoas acabam optando pelo consumo de frango, suíno e ovos.

Mas apesar da maior procura pela carne de frango, o momento é de atenção para a proteína animal. Nos últimos dias, a Argentina e o Uruguai confirmaram os primeiros focos de gripe aviária de alta patogenicidade em seus territórios. A doença foi verificada em aves silvestres, que apareceram mortas em parques nacionais.

A aproximação desses países com o Brasil, maior exportador global de carne de frango, coloca o mercado em compasso de cautela em relação às empresas do setor. Depois que a contaminação nos países vizinhos foi divulgada pela imprensa, as ações da BRF foram impactadas negativamente, com investidores avessos ao risco de a gripe aviária chegar em território brasileiro pelas rotas migratórias.

E é com este pano de fundo que os papéis da BRF (BRFS3) têm hoje cinco recomendações neutras e quatro de compra, com preço-alvo de R$ 15,63. “A BRF tem a questão operacional da companhia, que está em fase de reestruturação, então tem muito o que acompanhar ainda, além da perspectiva incerta para a carne de frango”, ressalta Manuela.

Na visão da analista, a única companhia com possibilidade de aproveitar o cenário positivo para a oferta de gado e de proteínas em geral é a Minerva (BEEF3), em razão da diversificação de plantas na América do Sul, que tem custos inferiores em relação às empresas que atuam em outras regiões. Conforme análises fornecidas ao Valor PRO, a Minerva tem oito recomendações de compra e duas neutras, com preço-alvo de R$ 18,94.

No entanto, é importante o investidor acompanhar os desdobramentos em torno da confirmação do caso de “vaca louca” no Pará, que levou o Ministério da Agricultura a suspender as exportações de carne bovina à China. Isso porque o embargo pode interferir no desempenho das ações da empresa.

Ainda entre os frigoríficos, a Marfrig (MRFG3) tem cinco recomendações de compra e três recomendações neutras, com preço-alvo médio de R$ 19,02. Para as ações da JBS (JBSS3), por sua vez, são oito recomendações de compra e duas neutras, com preço-alvo de R$ 41,86.

Fonte: https://valorinveste.globo.com/mercados/internacional-e-commodities/noticia/2023/02/27/apos-boom-reabertura-da-china-deve-determinar-precos-de-commodities-em-2023.ghtml

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