BNDES busca ampliar fontes para alavancar empréstimos

Valor Econômico – O plano da nova gestão do Banco Nacional de Desenvolvimento e Social (BNDES) de diversificar as fontes de financiamento para as empresas se justifica pelo objetivo de dobrar os empréstimos concedidos como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) nos próximos quatro anos, indicou o diretor de planejamento da instituição, Nelson Barbosa. Ele também afirmou que a medida busca conferir autonomia ao banco em relação ao Tesouro Nacional. Entre especialistas há, porém, dúvidas sobre o alcance e efetividade das medidas propostas pelo banco e que estão sob análise do Ministério da Fazenda.

Os desembolsos do BNDES representam atualmente cerca de 1% do PIB e a meta é chegar a 2% até o fim do mandato do atual governo, disse Barbosa. Desde 2018, o banco utiliza a Taxa de Longo Prazo (TLP), uma taxa de mercado, como indexador das operações de crédito. E o instrumento, que tem um componente atrelado à inflação (IPCA), vem sendo criticado. Agora a administração do BNDES propõe a criação da Letra de Crédito de Desenvolvimento (LCD), um título semelhante à LCA e à LCI, usadas para financiar, respectivamente, os setores agropecuário e imobiliário.

“Essa agenda faz parte de um projeto de tornar o BNDES mais autônomo. Vem para complementar o funding do FAT [Fundo de Amparo ao Trabalhador, principal fonte de recursos do banco] e tornar o BNDES cada vez mais independente do Tesouro”, disse. A ideia é que o título permita captar recursos para investir em infraestrutura, inovação, transição energética, preservação ambiental, além de capital de giro para micro, pequenas e médias empresas.

Como o novo mecanismo prevê isenção do Imposto de Renda, terá que ser aprovado pelo Congresso e regulamentado pelo Banco Central. “O ministério da Fazenda está analisando se essa proposta se encaixa na agenda deles e a gente espera que sim.” Como a LCD é inspirada na LCI e na LCA, a expectativa é que pessoas físicas possam investir no novo título, que ajudaria a compor o funding do BNDES juntamente com os recursos do FAT e de captações externas que o banco também considera fazer.

Especialistas do mercado financeiro, ouvidos pelo Valor, mostram cautela com a iniciativa. Uma fonte disse que a captação de varejo tem alcance limitado. Faria mais sentido dar incentivo fiscal ao emissor, afirmou. “Com o BNDES sendo financiado por pessoa física, o mercado não vai longe, é algo modesto. Mas se envolver investidor institucional, gestores de fundos, a escala muda.” Um argumento é que o BNDES poderia esbarrar na distribuição uma vez que depende de bancos privados para vender o título. “Bancos privados vão distribuir primeiro os seus produtos.”

O BNDES também pretende ir a mercado fazer captações no exterior. É algo que o banco sempre fez, embora essas linhas tenham custo mais alto e sirvam para atender a clientes específicos, como exportadores, que podem casar dívida em dólar com as receitas também em moeda americana, por exemplo. “Captação externa boa é a do Fundo Amazônia, que é não reembolsável e tem causa nobre”, disse uma fonte. Os especialistas consideram, no entanto, que faz sentido para o BNDES diversificar as fontes de recursos para emprestar.

O resultado do BNDES em 2022, a ser divulgado nos próximos dias, deve mostrar um desembolso da ordem de R$ 90 bilhões, acima dos cerca R$ 64 bilhões que emprestou em 2020 e 2021. Apesar do aumento, o banco vem tendo dificuldade de emprestar mais dado o custo da TLP, taxa que tem um componente fixo atrelado à NTN-B de cinco anos e uma parcela ligada ao IPCA. Como a inflação foi alta em 2021, o custo do empréstimo do banco subiu junto. Essa conjuntura criou uma situação curiosa. Fontes dizem que há disponibilidade de recursos do FAT no BNDES que o banco não consegue repassar devido ao custo da TLP.

O atual governo e a nova administração do BNDES têm uma visão crítica da TLP, criada no governo de Michel Temer para substituir a antiga Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP). A medida buscou criar uma taxa mais próxima do custo de mercado para o BNDES e o banco terminou sendo substituído, em grande medida, por fontes de financiamento privadas como a emissão de debêntures por empresas. O presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, já descartou a volta da TJLP, mas disse que há um “leque” de opções no lugar da taxa.

Barbosa foi na mesma linha. Disse que o BNDES apresentou proposta ao Ministério da Fazenda prevendo mudanças na TLP. “Na remuneração dos recursos do FAT, solicitamos à Fazenda a a possibilidade que o repasse [dos empréstimos] seja feito com diferentes indexadores de acordo com destino dos recursos.” Se o ministro Fernando Haddad der aval, as alterações precisarão ser feitas via lei no Congresso. Trata-se de uma espécie de “cardápio”, que Barbosa prefere chamar de “vértices”. Ele diz que, pela proposta, a TLP atual continuará a existir, mas junto com ela haverá outras opções.

Caberia ao Conselho Monetário Nacional (CMN) definir a alocação dos recursos do FAT destinados ao BNDES. “O CMN poderá definir quanto o BNDES repassa por Selic [taxa básica de juros], TLP de 3 anos e 5 anos, taxa pré-fixada”, disse. No capital de giro, instrumento muito usado pelas micro, pequenas e médias empresas, Barbosa disse que é melhor captar do FAT pagando Selic. A medida facilitaria o financiamento de capital de giro sem subsídio para essas empresas. “Isso vai facilitar que o BNDES faça administração melhor entre a captação e o desembolso dos recursos do FAT.” Uma questão é se nos recursos do FAT poderia ser aplicado um redutor (subsídio). Se o redutor valer, microempreendedores individuais (MEIs), por exemplo, poderiam ter uma redução em relação à taxa cheia e o autonômo pagaria 80% a 90% da Selic. Em projetos de transição energética, o redutor chegaria a 70%; o mesmo previsto para projetos de inovação.

Fonte: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2023/03/07/bndes-busca-ampliar-fontes-para-alavancar-emprestimos.ghtml

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