Valor Econômico – Especialistas viram avanços na estratégia de descentralização dos recursos do Novo PAC Seleções, com parte da verba destinada a projetos municipais e estaduais de mobilidade e saneamento, mas reforçaram pontos de atenção relacionados à execução e fiscalização das obras – “sombras” dos PACs anteriores.
Fernando Camargo, sócio-diretor da LCA, destaca que, no processo de escolha dos projetos, será importante envolver ministérios e atores como Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e Caixa Econômica Federal para acelerar a liberação dos recursos e evitar conflitos com iniciativas locais que estejam ocorrendo nos setores contemplados.
POD NOS TRILHOS
- Investimentos, projetos e desafios da CCR na mobilidade urbana
- O projeto de renovação de 560 km de vias da MRS
- Da expansão da Malha Norte às obras na Malha Paulista: os projetos da Rumo no setor ferroviário
- TIC Trens: o sonho começa a virar realidade
- SP nos Trilhos: os projetos ferroviários na carteira do estado
Eric Brasil, sócio da Tendências Consultoria, avalia que a iniciativa contribuirá para melhorar a qualidade de informação recebida pelo governo federal. “Há questões que sozinho ele não poderia identificar. Se Estados e municípios defendem projetos, será mais fácil para o governo federal entender nuances, impactos e efeitos positivos de projetos espalhados pelo Brasil”.
Ele pontua, contudo, que talvez fosse melhor definir o volume de recursos destinado a cada temática após a apresentação dos projetos. “Para ver quais são os que têm melhor justificativa em relação à necessidade e impacto que vão gerar. As necessidades regionais são distintas.”
Segundo a Casa Civil, parcela de R$ 17,5 bilhões será destinada à mobilidade urbana de médias e grandes cidades e à renovação de frota. Outros cerca de R$ 19 bilhões terão foco em projetos de abastecimento de água urbano e rural, esgotamento sanitário e drenagem urbana para prevenção de desastres naturais.
“Saneamento e mobilidade urbana são as maiores brechas em infraestrutura, então as prioridades parecem estar bastante corretas”, avalia Claudio Frischtak, presidente da consultoria Inter.B. “Mas há ponderações importantes: quais serão os critérios para a seleção dos projetos, de que forma o governo [federal] vai fiscalizar as obras para que não se repitam os problemas dos PACs anteriores? E é preciso calcular as taxas sociais de retorno.”
Para Frischtak, a gestão do PAC deveria passar para a pasta do Planejamento, porque a Casa Civil vive uma “hipertrofia” de tarefas. Além disso, ele sugere que o Tribunal de Contas da União (TCU) tenha um papel de fiscalização nesse cenário.
Os entes públicos poderão inscrever os projetos entre 9 de outubro e 10 de novembro. Além de saneamento e mobilidade urbana, o Novo PAC Seleções contemplará projetos em educação, ciência e tecnologia, infraestrutura social e saúde.
Apesar de atender a critérios de urgência na pauta econômica e de desenvolvimento socioambiental, em temas com relevante efeito multiplicador de investimentos e geração de emprego e renda, continua Camargo, da LCA, a pulverização dos recursos – que ele também avalia como um pontos positivo da iniciativa – pode ser um problema.
“A principal preocupação é quanto aos projetos nos níveis que precisam ser mobilizados, estadual e municipal: estarão associados a projetos bem elaborados, que envolveram a sociedade e o público usuário? São compatíveis com outras políticas e modelos de negócio?”, pondera.
Em saneamento, diz Camargo, é preciso observar se os recursos não beneficiarão municípios e respectivas concessionárias que precisam acertar-se com as regras do novo marco legal de 2021, por exemplo, sob pena de atrasar o já apertado prazo da universalização desses serviços. Metade dos brasileiros ainda não tem acesso a serviços de coleta e tratamento de esgoto.
Esses serviços trazem efeito direto em qualidade de vida, saúde e consequentemente produtividade da população. Um estudo recente do Instituto Trata Brasil mostra que as pessoas que vivem em locais onde esses serviços não chegam têm salários 5% mais baixos do que outras com mesmas condições de empregabilidade (educação e experiência).
Luana Pretto, presidente do instituto, diz que o volume de recursos destinado ao setor é baixo se comparado à necessidade. Por ano, os investimentos são de R$ 20 bilhões – e para alcançar as metas da nova lei será preciso dobrar o valor.
Já em mobilidade, a renovação de frota não é questão apenas de fluxo de pessoas. É problema de meio ambiente, acrescenta Willian Rigon, sócio-diretor de Novos Negócios da plataforma Connected Smart Cities. “Em São Paulo, por exemplo, ninguém pode negar o aquecimento. É nítido. O fim do inverno foi atípico, o que comprova mudança climática”, diz. “Descarbonização é fundamental para o aquecimento global.” Para ele, é importante que o projeto entregue recursos às cidades de menor porte, para que elas deixem de “viver da sucata” da frota das cidades maiores.
Seja o primeiro a comentar