Valor Econômico – O Ministério dos Transportes acusa a Vale de descumprir prazo definido nos novos contratos de concessão da Estrada de Ferro Carajás e da Estrada de Ferro Vitória-Minas. O alerta foi feito em ofício da Secretaria Nacional de Transportes Ferroviários enviado na quarta-feira ao comando da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
A interação entre os órgãos federais é mais um desdobramento da briga travada pelo ministro dos Transportes, Renan Filho, com as concessionárias que assinaram a renovação antecipada dos contratos no mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro. O ministro tenta acordo com as concessionárias para recalcular — e aumentar — o valor das outorgas cobradas na assinatura dos novos contratos. O montante, alega, foi estimado em patamar reduzido por ter sido aplicado desconto de todo o investimento não amortizado no prazo da concessão antiga.
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Em entrevista ao Valor, o ministro dos Transportes disse esta semana que, diante do desinteresse da Vale em rever os termos da renovação antecipada, considera levar o caso à Justiça, com a possibilidade de responsabilização criminal de gestores públicos e executivos que assinaram os novos contratos.
O Valor apurou que o movimento da Secretaria Nacional de Transportes de junto à ANTT visa antever qualquer influência que a mineradora possa tentar exercer sobre o comando da agência, formado em grande parte por indicações do governo anterior.
O envio do ofício à ANTT ocorreu às vésperas do julgamento do processo relacionado ao tema pela diretoria. Na próxima semana, o comando da agência analisará o caso em “reunião deliberativa eletrônica”, marcada para ocorrer entre os dias 4 a 12 de dezembro.
Conforme a pauta divulgada pelo órgão regulador, a decisão da diretoria envolverá a “celebração de aditivo aos contratos” das duas ferrovias da Vale. O objetivo é “formalizar a prorrogação dos prazos para cumprimento das obrigações não financeiras pela concessionária”.
O ofício do Ministério dos Transportes pondera que o prazo de 18 meses para a Vale apresentar informações econômicas vinculadas ao contrato acabou no dia 19 de junho. A secretaria também contesta o fato do processo na ANTT fazer referência ao “cumprimento das obrigações não financeiras”, o que permitiria o alongamento do período definido para para cumprimento das obrigações contratuais.
“A obrigação contratual de apresentação do detalhamento da base de ativos e passivos tem caráter eminentemente financeiro, visto que a sua apresentação ou não apresentação tem o condão de impactar diretamente o valor da outorga”, informou o documento, assinado pelo secretário nacional de transportes ferroviários do Ministério dos Transportes, Leonardo Ribeiro. O ofício é endereçado nominalmente ao diretor-geral da ANTT, Rafael Vitale.
Se a decisão for desfavorável à Vale, a companhia pode perder o argumento de não aceitar a revisão dos termos da renovação, proposta pelo governo atual, por estar cumprindo 100% das obrigações.
O ministério tem buscado o respaldo jurídico de procuradores da União nas decisões sobre as ferrovias. O documento ressalta que a “secretaria realizará tratativas e assessoramento jurídico com a Conjur/MT, unidade da AGU [Advocacia-Geral da União] junto ao Ministério, para avaliar a necessidade de adoção de providências ulteriores, que visem a resguardar o interesse da política pública desta Pasta dos Transportes”.
Ainda de acordo com o documento, o Ministério dos Transportes, com órgão definidor de “diretriz de política pública” no setor, recomendou que a ANTT “suspenda qualquer deliberação acerca de aditamento contratual referente à obrigação de apresentação da base de ativos por parte da Concessionária”. Para a Pasta, “dado o caráter financeiro” da decisão, existe “risco de prejuízo ao erário”, além de que a agência só de nova diretriz de política pública ministerial”.
Questionada sobre o ofício do Ministério dos Transportes, a Vale informou que “continua cumprindo com as obrigações decorrentes da renovação antecipada das ferrovias Estrada de Ferro Vitória a Minas e Estrada de Ferro Carajás”. De acordo com a empresa, já foi entregue 100% do “compromisso cruzado” de investir na Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol). Isso inclui a entrega de 56 mil toneladas de trilhos e 32 mil toneladas de dormentes, além da aquisição dos equipamentos para expansão da oferta de trem de passageiros. A mineradora ressaltou que “seguem em implantação” mais de 470 obras de mobilidade urbana, que irão beneficiar 33 municípios a partir de investimentos previstos de R$ 2,8 bilhões, e a obra da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (FICO), com desembolsos de R$ 10,7 bilhões.
Procurada, a assessoria de imprensa da ANTT informou que, no momento, a agência “não vai comentar sobre o tema”.
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