Artigo vencedor da categoria 03 do 10º Prêmio Tecnologia & Desenvolvimento Metroferroviários ANPTrilhos-CBTU, apresentado na 29ª Semana de Tecnologia Metroferroviária da Associação dos Engenheiros e Arquitetos de Metrô (Aeamesp). Autores: Álvaro Diego Bernardino Maia, Joelson Messias de Moura, Lucas Victor Resende Oliveira, Marcos Renan Nonato da Silva e Marcos Vinicius de Souza Apolinario.
INTRODUÇÃO
A crescente demanda por soluções tecnológicas que priorizam a análise de dados tem se tornado crucial para empresas em todos os setores. O avanço da tecnologia está tornando trabalhos manualmente intensivos mais autônomos, levando a um desempenho melhorado e redução significativa no tempo de análise e gestão de informações. Este artigo explora os benefícios da aplicação da Ciência de Dados no sistema metroferroviário, destacando como a comunicação constante dos equipamentos embarcados permite a identificação de informações importantes para otimização de desempenho e conforto. O foco está no aperfeiçoamento do serviço prestado, cruzando dados dos passageiros e sistemas da malha metroferroviária, implementando a aprendizagem de máquina para análise histórica e prospecção de dias futuros, visando um modelo com ganho de desempenho e aumento da produtividade do sistema como um todo.
DIAGNÓSTICO
O trem é o ativo que transporta de fato o passageiro de um ponto a outro da linha, sendo ele, o lugar em que o cliente fica mais tempo dentro do sistema, então, “ouvir” o que a composição tem a dizer é importante para definir as melhores estratégias a serem adotadas para aumentar o conforto do usuário. Considere o exemplo a seguir:
Na análise do carregamento no pico da manhã na Plataforma 2 de Vila das Belezas da Linha 5 Lilás, mesmo com o impacto da pandemia em 2021, o carro 4 permanece como o mais carregado.
Embora as análises fiquem abaixo dos limites permitidos, os passageiros dos carros 1 e 2 têm mais conforto em comparação com o carro mais carregado. Essa situação é observada também em um trem da Série 8500, no sistema Ferroviário da Linha 9 Esmeralda.
A análise mostra que em uma das figuras todos os espaços estão preenchidos, impossibilitando que os passageiros deixem a composição sem contato físico, enquanto na outra há distanciamento entre as pessoas, permitindo evitar o contato físico ao desembarcar do trem. Com base nisso, estratégias podem ser adotadas para melhorar a distribuição do fluxo nas plataformas, incluindo alteração do sentido de escadas rolantes e uso de direcionadores. A análise foi realizada com dados das bolsas de ar dos trens, que auxiliam a manter o equilíbrio do carro e incluem uma célula de carga para medir o peso dos trens, ajudando o sistema na tomada de decisões para aceleração e frenagem.
Para obtenção da quantidade de pessoas nos trens, ao angariar a informação de peso registrada, é necessário remover a “Tara do Trem” que é o valor da massa da composição sem passageiros, subtrair do valor total obtido do trem, e após, dividir pela média do peso das pessoas.
Por fim, após obter o número médio de pessoas, para saber a lotação, basta subtrair o número de assentos do interior de todo trem e/ ou de cada carro, e dividir pela área útil disponível para transporte.
Este diagnostico, foi apenas uma porção pequena, de toda a Ciência de Dados que é possível aplicar, considerando como premissa as informações que os sistemas transmitem o tempo todo.
ESTUDO DE CASO – IMPLANTAÇÃO DO SISTEMA E ANÁLISE OPERACIONAL NA LINHA 5 LILÁS.
A obtenção de dados sempre requer uma metodologia de coleta e um método de análise para fornecer resultados. Anteriormente, em 2019, na Linha 5 Lilás, o carregamento e conforto eram obtidos por meio de pesquisa de origem e destino interna e observação em campo. Essa pesquisa foi combinada com dados de bloqueios, que, para a maioria das estações, não eram em tempo real, mas obtidos manualmente no final do dia como um valor consolidado. Isso exigia também uma pesquisa para identificar o horário de maior uso do sistema, conhecido como “Pico”.
A seguir um exemplo de resultado obtido com a metodologia de 2019.
Os dados de demanda das estações eram transferidos para uma base no Excel para calcular estimativas de lotação. Com a pandemia de COVID-19 em 2020, as análises precisaram ser refinadas para garantir o distanciamento social. Isso levou à observação de que as composições já transmitiam informações relevantes. Por isso, uma tecnologia foi desenvolvida para obter e armazenar os dados do trem, usando um dispositivo com memória flash e um aplicativo para coletar esses dados sem precisar acessar a cabine do trem.
As variáveis do trem, incluindo o peso das bolsas de ar, são fundamentais para compreender o carregamento e o perfil operacional da linha. Essas informações são essenciais para a manutenção eficiente do sistema. O tratamento desses dados permitiu entender o comportamento real da linha e identificar oportunidades de melhoria. A seguir, apresentamos um exemplo de carregamento de março de 2021.
A análise desses dados permitiu compreender a distribuição por carro e determinar os trechos mais carregados, contribuindo para a reorganização do fluxo nas plataformas e garantindo o distanciamento social. Observou-se um aumento significativo na qualidade das análises realizadas apenas com os dados dos trens, mostrando uma diferença explorada entre o método de pesquisa de 2019 e o método baseado no peso do trem, considerando dados de 2023.
Há desvios de até 2,44 pass/m², ou 422 passageiros entre as metodologias, isso ocorre, pois o peso do trem identifica o comportamento real, respeitando a sazonalidade do dia, o perfil do dia tipo dentre outras premissas, já a pesquisa, adota apenas o perfil estabelecido para o dia em que ela foi concebida, ou seja, se considerar uma pesquisa realizada em um sexta-feira, todo os parâmetros obtidos deste modelo, terão características daquele dia tipo pesquisado.
A seguir é apresentado na pratica o impacto na mudança de metodologia do peso entre 2020 e 2022.
A partir de 2020, houve ajustes na oferta de transporte conforme a demanda real de clientes, com a distribuição dos passageiros pelos carros sendo compreendida a partir de abril de 2021 para garantir o distanciamento social. Mesmo após o fim das restrições em março de 2022, o modelo de oferta e demanda da Linha 5 Lilás foi mantido, graças à análise unificada dos sistemas, incluindo dados dos trens, demanda dos bloqueios e informações operacionais diárias.
A análise revela que o trecho mais carregado do dia foi entre Largo Treze e Santo Amaro, atingindo uma média máxima de lotação de 5,21 pass/m², com um carro do trem ultrapassando os 6 pass/m². Além disso, identifica-se um padrão sazonal de carregamento, com o pico por volta das 18h55. Ofertas e demandas do sistema também foram destacadas. A análise com os dados do trem permite examinar o perfil de velocidade da composição mais carregada no horário de pico, comparando com padrões anteriores.
Os dados do trem foram apenas o ponta pé inicial, após, passou- se a observar também outros sistemas, a fim de aperfeiçoar ainda mais o serviço prestado, com isso, vieram outras informações de forma centralizada numa única tela de análise, como, registros diários para eventos de Portas de Plataforma, Dispositivos de Via, Sinalização e entre outros, que anteriormente eram analisadas de forma separada e sem considerar a correlação entre algumas das variáveis. A seguir uma análise mais detalhada de todo o sistema para o dia 13/07/2023.
O maior índice de viagens canceladas foi devido a problemas no Material Rodante, seguido por questões relacionadas às Portas de Plataforma. Além disso, foi feita uma análise para identificar se as ocorrências estavam mais relacionadas à operação ou à manutenção. Com base nesses dados históricos, é possível projetar estimativas para o futuro, como custos de energia de tração, desgaste de trilho, número esperado de trens circulando e passageiros. A projeção de tráfego para julho de 2023 é mostrada abaixo.
O visual oferece projeções detalhadas, incluindo oferta de trens, viagens previstas, uso de equipamentos e custos variáveis. Essa base robusta permite comparação entre resultados realizados e projeções, melhorando a precisão do modelo.
Com esta análise, é possível identificar o distanciamento, aplicando correções ao método, viabilizando uma assertividade maior para os próximos meses. Observa-se a seguir como ficaram os ajustes aplicados ao mês de julho de 2023.
Durante um período de 2 anos e meio de estudo, observou- -se um acompanhamento próximo entre o que foi realizado e o que foi planejado. Isso foi possível devido à capacidade do modelo em identificar possíveis impactos, considerar o mês anterior e ajustar a projeção com base no perfil do ano de 2022. Essa habilidade resultou na integração bem-sucedida de informações de diversas fontes em bancos de dados consolidados, transformando fontes inicialmente desconexas em um conjunto coerente de informações de maneira visualmente atrativa e interativa.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
Pelo exposto, nota-se que, com o levante das informações obtidas dos sistemas que compõem a malha metroviária da Linha 5 Lilás, foi possível cruzar os dados, para gerar análises mais precisas e detalhadas do comportamento do sistema como um todo. Essas ações auxiliam e muito nas tomadas de decisões, bem como, alimentam outras frentes, como por exemplo o estudo de fluxo e multidões, que através da simulação computacional, traz resultados análogos ao cenário real, possibilitando ajustes sem impactar negativamente a rotina do passageiro.
As informações obtidas têm uma vasta gama de aplicações, desde a avaliação da frota futura e estudos de oferta e demanda até a simulação de cenários de extensão da linha. A análise desses dados permite projetar alterações na lotação, influenciando na elaboração de uma nova tabela horária e na programação de oferta de trens (POT) para dias específicos da semana. Um modelo semelhante foi aplicado na Linha 4 Amarela, utilizando o mesmo método de análise mencionado neste documento.
O mesmo parâmetro foi aplicado nas linhas do Metrô Bahia e Linha 5 Lilás, permitindo a identificação de padrões de uso específicos ao longo da semana. Com informações mais precisas, foram observadas variações significativas nos padrões de demanda, incluindo menor utilização nas segundas-feiras em comparação com os dias de terça a quinta-feira, e um pico mais espaçado nas sextas-feiras. Essa análise detalhada foi viabilizada pelo cruzamento de dados de demanda, carregamento dos trens e ocorrências operacionais, contribuindo para o aprimoramento do planejamento das linhas mencionadas.
CONCLUSÕES
A aplicação da Ciência de Dados no sistema metroferroviário nos últimos dois anos e meio resultou em benefícios significativos, incluindo a melhoria na gestão operacional e o conforto dos passageiros. Isso foi possível graças à consolidação de dados de diversas fontes, que permitiram decisões mais informadas e precisas. A análise operacional possibilitou identificar áreas de melhoria, otimizar o conforto dos passageiros e projetar cenários futuros para uma melhor tomada de decisão. No geral, a utilização inteligente das informações provenientes de diferentes fontes contribuiu para impulsionar a eficiência e aprimorar a experiência dos usuários do transporte público, podendo servir como modelo para outras linhas e sistemas de transporte.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FRUIN, John J. (1970) – “Designing for Pedestrians: A Level of Service Concept” – polytechnic University of Brooklyn
CONCESSIONÁRIA DA LINHA 4 DO METRÔ DE SÃO PAULO S.A – VIAQUATRO. Subsistema Central de Controle de Arrecadação e Passageiros (SCAP). 2023a. Acesso restrito.
CONCESSIONÁRIA DA LINHA 5 DO METRÔ DE SÃO PAULO S.A – VIAMOBILIDADE. Subsistema Central de Controle de Arrecadação e Passageiros (SCAP). 2023a. Acesso restrito.
PORTAL MOBILIDADE – CCR ENGEMOB. Análise Opr. De Trens. Disponível em: http://engemob.grupoccr.com.br/operacional/engenharia.asp#. Acesso em: 10 jul. 2023a. Acesso
restrito.
TRAINTIC, CAF (2009) – COSMOS DIAGNOSIS SYSTEM, “Timon User Manual”.
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