Queda de repasses estaduais faz Metrô mudar pagamentos para evitar despejo

Levantamento do Estado no Diário Oficial encontrou comunicados
do Metrô publicados desde abril com indicações de mais de 50 pagamentos a
fornecedores fora da ordem cronológica, como prevê a Lei de Licitações. A
maioria se refere a contratos de ocupação temporária de terrenos para a
construção de linhas ou estações e de aluguel de imóveis usados pela companhia.
A prática é prevista em lei, desde que haja “relevantes razões de interesse
público” e “mediante prévia justificativa da autoridade competente”.

Em julho, por exemplo, a companhia publicou comunicado dizendo
que pagaria a Lacônica Brasil Participações fora da ordem cronológica pelo uso
de um terreno nas obras do pátio de manobras da Linha 17-Ouro (monotrilho), na
zona sul da capital, “em função do recebimento parcial dos recursos financeiros
da Secretaria da Fazenda, insuficientes para quitação dos compromissos”. A
Lacônia chegou a mover uma ação judicial de despejo contra o Metrô em março, no
valor de R$ 951 mil, por falta de pagamento, mas o processo foi extinto em
junho, após acordo. O contrato foi assinado em dezembro de 2013 no valor de R$
1,8 milhão – aluguel de R$ 77 mil por mês –, com prazo de dois anos, mas acabou
sendo prorrogado até novembro de 2018 por atrasos e paralisação parcial das
obras da Linha 17 (Congonhas-Morumbi).

O presidente da Comissão de Direito Administrativo da Ordem
dos Advogados do Brasil em São Paulo, Adib Kassouf Sad<, explica que a lei exige que órgãos e empresas públicos paguem seus fornecedores em ordem cronológica para evitar que haja vantagens a determinadas empresas nas transações. “A inversão da ordem cronológica dos pagamentos é a exceção da exceção. Só é admitida em casos de extrema relevância para o interesse público e a justificativa precisa ser comprovada e fiscalizada pelos órgãos de controle, como o Tribunal de Contas do Estado”, diz.

Segundo o especialista, a dificuldade nos pagamentos de
fornecedores é reflexo da crise econômica do País, que tem afetado a
arrecadação dos Estados e comprometido os investimentos. “A crise enxugou os
recursos da administração pública e o primeiro setor a sofrer cortes é o de
investimento. Quando você corta recursos e paralisa obras acaba sendo obrigado
a priorizar pagamentos.”

Dados divulgados pelo Metrô mostram que os repasses do
governo Alckmin para a companhia entre janeiro e agosto deste ano tiveram queda
real de 32,4% na comparação com igual período em 2015, de R$ 2 bilhões para R$
1,4 bilhão. Além disso, a empresa perdeu até julho cerca de 300 mil passageiros
por dia, afetando a receita tarifária – perda estimada em R$ 60 milhões no ano.

Sem crise. O secretário de Transportes Metropolitanos,
Clodoaldo Pelissioni, disse que teve de “privilegiar alguns pagamentos menores”
relativos a desapropriações para não afetar as obras, mas negou que tenha
faltado recursos do governo de São Paulo, como o Metrô informou em comunicado.
“É evidente que existe uma crise, mas o governo está mantendo os
investimentos.”

O secretário disse que, além da dívida de R$ 41 milhões com
um consórcio na Linha 1, repactuou um débito com outro fornecedor da Linha
3-Vermelha, mas o valor não foi informado. Em julho, o Metrô também lançou
programa de demissão voluntária de funcionários para reduzir a folha salarial.

Canteiro de obras. O Metrô de São Paulo informou, em nota,
que os pagamentos fora da ordem cronológica estão de acordo com a lei e foram
feitos para “preservar os canteiros de obras das linhas em construção ou
expansão e evitar qualquer possibilidade de desmobilização destes e de prejuízo
aos empreendimentos”.

Segundo a estatal, a redução dos repasses do governo “é
reflexo direto do status ou estágio de andamento das obras”, como as
paralisações das obras das Linhas 4 e 17 e a fase de acabamento da Linha 5, que
demanda menos dinheiro. “Quando analisados períodos anteriores, registramos
aumentos. Entre janeiro e agosto de 2013/2014, os repasses cresceram 46%, de R$
1,9 bilhão para R$ 2,8 bilhões. ”

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