Faltando pouco mais de 250 dias para o início da Olimpíada de 2016, o governo federal resolveu priorizar o pagamento da obra do VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) do Centro do Rio de Janeiro prometido para o evento. O interesse da União na conclusão do projeto olímpico é tanto que ela está disposta segurar verbas que seriam destinadas a projetos nacionais de saneamento e habitação para custear a construção do trem urbano.
Essa decisão foi oficializada pelo governo numa resolução do CG Olimpíada (Comitê Gestor dos Jogos Olímpicos de 2016), publicada no Diário Oficial da União há uma semana (veja abaixo). O CG Olimpíada é grupo que reúne autoridades de várias áreas atuantes na preparação para os Jogos de 2016.
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No último dia 4, o CG Olímpiada reuniu-se em Brasília. Nesse encontro, seus membros decidiram declarar a obra do VLT do Rio como de “interesse público” e prioritária. Fizeram isso considerando compromissos do Brasil assumidos com o COI (Comitê Olímpico Internacional) para os Jogos de 2016, a urgência para o cumprimento dos prazos de construção, entre outras coisas.
Pelo fato de o VLT ser de “interesse público”, o grupo de empresas contratado para implantar as linhas de trem urbano no Rio já não precisa entrar fila de pagamentos existente no Ministério das Cidades. Agora, qualquer ordem de pagamento referente ao VLT deve ser a primeira a ser liquidada pela pasta. Como o ministério também é o grande responsável pelos investimentos federais em habitação social, saneamento básico e mobilidade urbana, por exemplo, todos os projetos dessas áreas terão seu ritmo de pagamento alterado.
A mudança na fila de pagamentos foi confirmada pelo Ministério das Cidades. Representantes do órgão não estiveram na reunião do CG Olimpíada que determinou a decretou a prioridade sobre o VLT. A resolução do comitê, contudo, é resultado de uma decisão de governo e vai ser cumprida.
O ministério informou ainda que, em 2016, a quantia do Orçamento Geral da União disponível para obras será “muito menor” do que em 2015. Por isso e para garantir que o VLT do Rio receberá seus repasses em dia, é necessário que o pagamento da obra seja priorizado em detrimento de outros projetos. “Para 2016, os recursos de Orçamento são muito menores que os deste ano, e as obras [do VLT] estão em ritmo mais acelerado, o que significa que exigirá mais recursos num espaço de tempo menor”, explicou a pasta, em comunicado ao UOL Esporte.
Legado não essencial
O VLT do Rio é uma obra de R$ 1,18 bilhão viabilizada por uma PPP (parceria pública privada) estruturada pela prefeitura. Desse valor, R$ 656 milhões vêm das empresas responsáveis pela implantação e operação do trem urbano (Odebrecht, Invepar e outras). Outros R$ 532 milhões vêm do governo federal.
A construção das linhas do VLT começou em fevereiro de 2014. A primeira fase da obra está prevista para terminar no segundo trimestre do ano que vem, ou seja, meses antes do início da Olimpíada.
Essa etapa da obra do VLT ligará o Centro, a região portuária, a rodoviária e o Aeroporto Santos Dumont. Como ela facilitará o transporte de turistas no Rio durante os Jogos de 2016, foi incluída no plano oficial de legado do evento. Ela, entretanto, nunca foi considerada uma obra essencial nem esteve em promessas específicas feitas pelo governo ao COI.
O próprio prefeito do Rio, Eduardo Paes, já declarou que o VLT está sendo construído visando a melhorias gerais no sistema de transporte público do Rio. Segundo Paes, o primeiro trecho da obra vai ser entregue até a Olimpíada. Caso isso não fosse possível, porém, o evento não seria prejudicado por isso.
Interesse público duvidoso
Especialistas em direito administrativo e contas públicas questionam a priorização dos pagamentos ao VLT em detrimento de outras obras, de diferentes áreas. “Uma exceção na fila dos pagamentos é justificada quando há uma emergência, como no caso do rompimento da represa em Mariana (MG). Priorizar uma obra como a do VLT pode romper com os princípios de isonomia e impessoalidade”, afirmou o presidente da Comissão de Controle Social dos Gastos Públicos da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo), Jorge Eluf, ao UOL Esporte.
O consultor e auditor Inaldo Soares, especialista em administração pública, acredita que a medida precisaria de uma justificativa melhor. “Ela deve demonstrar que a mudança atende ao interesse público. Só essa obra é de interesse público? E as outras da Olimpíada? E as obras em execução?”, questionou.
A Prefeitura do Rio não se pronunciou sobre a decisão do governo federal de priorizar os pagamentos da obra. O Ministério das Cidades reforçou que a decisão é do CG Olímpiada. O grupo é coordenado pelo ministro do Esporte George Hilton. O Ministério do Esporte foi procurado para explicar a priorização. Não comentou.
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