O Ministério Público Federal (MPF) em Piracicaba recomendou à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) que declare imediatamente inválido um contrato firmado entre a agência e a América Logística Latina (ALL). O contrato prevê a troca de 2.375 vagões, que pertencem ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), por 1.116 oferecidos pela ALL. A Procuradoria alega que não houve autorização do Dnit e, apesar disso, a ALL informa que a troca já foi efetuada.
Tal contrato entre a ALL e a ANTT pode envolver quase R$ 600 milhões em bens. Os vagões pertenciam à antiga Rede Ferroviária Federal. Este acordo foi descoberto recentemente pelo procurador da República Fausto Kozo Matsumoto Kosaka, que é responsável por um inquérito civil público e um procedimento investigatório criminal que resultaram na Operação Fora dos Trilhos, que apura a destruição e a venda ilegal de patrimônio ferroviário federal.
Na Operação Fora dos Trilhos, o MPF e a Polícia Federal obtiveram uma estimativa que o valor de mercado de um vagão pode chegar a R$ 250 mil, valor que, multiplicado pelo total de vagões que passariam a fazer parte do patrimônio da ALL, indica que o negócio envolve a cifra de R$ 593,7 milhões, quase R$ 600 milhões.
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Por estes motivos, a ALL também é destinatária da recomendação do MPF e à empresa foi recomendado que não disponha (venda, doe, alugue ou troque) ou dê qualquer outra destinação aos vagões “substituídos” por meio do termo aditivo ao contrato de arrendamento.
Sem consulta
Um dos maiores problemas na transação entre a ANTT e a ALL, na avaliação do MPF, foi a realização da operação sem a prévia concordância do Dnit, responsável pelo material rodante da antiga Rede Ferroviária Federal, o que pode, inclusive, causar uma grande perda patrimonial à União.
Em nota, a ALL informou que “o processo de substituição dos vagões é regular, validado pela ANTT, e está amparado nos Contratos de Concessão e Arrendamento, que preveem a substituição dos ativos em condições de equivalência”.
A empresa informou que os vagões tinham capacidade para transportar 43 toneladas, eram obsoletos e não tinham condições de circular. Segundo a nota, os novos vagões tem capacidade para até 120 toneladas e já estão em plena circulação com “um ganho de capacidade de aproximadamente 10% na frota substituída, agregando expressivo valor ao patrimônio da União”.
Dnit
O Dnit informou ao MPF que, em agosto deste ano, enviou um ofício à ANTT informando que “a substituição de material rodante (…) não obteve a aprovação da área jurídica e administrativa” da autarquia. Segundo o Dnit, no mesmo documento, o órgão alerta a ANTT que “a substituição demanda atribuições de ordem patrimonial que somente podem ser desenvolvidas pelo Dnit, real proprietário dos bens”.
Para o MPF, o acerto entre a ANTT e a ALL não é uma mera substituição, mas uma substancial mudança no objeto do contrato de arrendamento, o que não seria competência da ANTT, órgão regulador do setor, mas do Dnit, real proprietário dos bens substituídos. “Não obstante os valores envolvidos na transação, a ANTT sequer teve o cuidado de vistoriar os vagões do DNIT cuja substituição autorizou, desconhecendo qual o real estado de conservação desses bens”, disse Kosaka.
Agência
À ANTT, o MPF recomendou ainda que declare imediatamente inválidos também todos os atos que dependam ou decorram dos aditivos viciados e que eventuais anulações deverão ser comunicadas ao Dnit e às concessionárias, que deverão ser proibidas de dispor de eventuais bens “substituídos” nos aditivos. Também foi recomendado que a ANTT não realize qualquer ato fora de sua esfera de competência.
A recomendação foi expedida na quarta-feira (30) e o MPF deu prazo de cinco dias para que a ANTT e a ALL prestem as informações sobre as providências adotadas a respeito. Cópia da recomendação foi encaminhada ao Dnit, ao inventariante da Rede Ferroviária Federal (RFFSA) e à Delegacia de Polícia Federal de Piracicaba, responsável pelo inquérito policial da Operação Fora dos Trilhos.
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