A pandemia impactou fortemente o setor de transportes, com inevitáveis reflexos sobre a receita operacional de operadores de serviços e concessionárias de infraestrutura. Pedidos de reequilíbrios econômicos previstos em contratos e outras formas de compensação das perdas sofridas já estão na pauta das conversas de representantes setoriais e autoridades públicas federais e estaduais.
A pandemia é um evento de força maior, que muda a equação financeira da concessão. É preciso uma adequação às novas condições,diz Dyogo Oliveira, presidente da Associação Nacional das Empresas Administradoras de Aeroportos (Aneaa).
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Entre as possibilidades de reequilíbrio nos contratos de concessão está o aumento de tarifas, uma ação descartada diante da conjuntura econômica. Outras possibilidades são o aumento do prazo de concessão, que permitiria uma compensação gradual das perdas, aporte de recursos públicos ou o desconto no valor das outorgas – o pagamento ao governo pela concessão, normalmente feito em prestações anuais.
O governo já flexibilizou o pagamento em 2020, calculado em R$ 2 bilhões, para o conjunto das concessionárias de aeroportos, transferindo o vencimento do meio para o final do ano. Mas não cancelou os valores.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) também prorrogou em seis meses os prazos de pagamentos de financiamentos contratados.
O transporte aéreo foi um dos mais afetados pela pandemia. A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) informa uma queda de 93% nos voos domésticos e de paralisação total nos voos internacionais. Os voos diários, que somavam 2700 em dezembro, caíram para 180 em abril, com um ligeiro crescimento para 353 voos por dia em junho. O valor médio das passagens aéreas domésticas caiu 4,5% no primeiro trimestre.
Para julho, a expectativa da Abear é chegar a 391 voos diários. Há uma recuperação em curso, mas será lenta, diz Eduardo Sanovicz, presidente da Abear. O cenário para o mercado de viagens não é promissor em 2020. Há queda de poder aquisitivo do consumidor e muita incerteza em relação a novos surtos do coronavírus, afirma.
O governo federal já sinalizou com uma capitalização nas companhias aéreas brasileiras por meio do BNDES. O valor estimado é de R$ 6 bilhões. As negociações, porém, ainda não foram concluídas.
A falta de celeridade do governo gera apreensão. O governo federal e o governo de São Paulo já sinalizaram disposição de promover o reequilíbrio econômico previsto em contrato, mas não há ainda negociações ocorrendo de fato, afirma César Borges, presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR). Será difícil manter a qualidade dos serviços e os investimentos previstos sem um socorro rápido ao setor.
Em abril a redução no fluxo de veículos nas estradas foi de 43,8% em relação a abril do ano passado e em maio, de 34,2%. Segundo Borges, as concessionárias perderam 35% de suas receitas em abril e 30% em maio. Em valores, o conjunto das 64 concessionárias rodoviárias deixou de arrecadar perto de R$ 500 milhões mensais.
O impacto não foi igual para todos. Nas rodovias onde o fluxo de veículos de passeio é maior, a queda na receita chegou a 60%. Ao mesmo tempo, nas estradas pelas quais trafegam principalmente caminhões, a retração foi de 15%. O ideal é adotar soluções pensadas caso a caso, afirma Borges.
Pesquisa realizada pela Confederação Nacional do Transporte (CNT) com 619 empresas de cargas e passageiros em todos os modais concluiu que 80,6% das transportadoras registraram queda na demanda de seus serviços em maio e 74,8% estimam que a pandemia do coronavírus afetará negativamente os negócios por mais quatro meses. Entre os entrevistados, 63,8% declaram que estão com sua capacidade de pagamento comprometida e 27% dizem que só conseguem operar mais um mês sem apoio financeiro.
O impacto da crise não é igual entre os modais de transporte e segmentos de atuação das empresas. Cesar Meireles, diretor-presidente da Associação Brasileira de Operadores Logísticos (Abol), diz que o transporte aéreo de carga e rodoviário foram mais afetados, mas o transporte ferroviário de carga, que movimenta principalmente minérios, combustíveis, produtos siderúrgicos e do agronegócio, não sofreu grandes alterações. Na cabotagem houve até mesmo um crescimento de 12,8% no primeiro trimestre, antes que as restrições fossem maiores.
Entre os operadores logísticos, os mais impactados foram os que prestam serviços para clientes das indústrias automobilística, eletroeletrônicos, linha branca e para o varejo, com perdas que chegam a 40%. Mas empresas que operam com alimentos, higiene e e-commerce até registraram crescimento de atividades, afirma Meireles.
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