Em dois artigos anteriores, apresentei argumentos comprobatórios da inviabilidade financeira do trem-bala Rio-São Paulo, para investimentos estritamente privados, devido à inexistência de demanda suficiente de passageiros para sustentar esse projeto, com a tarifa desejada de US$ 60. Entretanto, para comprovar minha posição favorável à ferrovia, vou colocar em discussão o esboço de uma factível modelagem financeira para a viabilização desse trem-bala, desenvolvida no mestrado em transportes do Instituto Militar de Engenharia (IME), sob minha orientação.
Em todo o mundo, mesmo nos países com forte demanda, não há transporte ferroviário de passageiros sem subsídios governamentais. Na verdade, isso não significa perda de dinheiro público, ao contrário, o governo promotor consegue ganhos financeiros com o aumento da arrecadação de tributos na construção das linhas e na sua operação, na economia de combustíveis e na diminuição dos custos com acidentes, manutenção de vias e poluição. Além disso, há os retornos intangíveis – como a melhoria da qualidade de vida da população e do meio ambiente.
O modelo aqui proposto é um misto de financiamento público e PPP, baseado sobre três pilares: 1) a subestrutura, parte não operacional da ferrovia, que inclui a aquisição e desapropriação de terrenos, construção da plataforma, túneis, pontes e linhas elevadas, deverá ser fornecida exclusivamente pela União e Estados envolvidos, sob a forma de contratação tradicional e posteriormente concedida ao setor privado para exploração comercial. O custo dessa subestrutura corresponde a cerca de 60% do custo total do projeto;
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2) A infra-estrutura (via permanente, oficinas, sinalização, telecomunicações, rede aérea e subestações), aquisição do material rodante e operação de todo o sistema, que representam 35% do total do projeto, deverão ser entregues a um único consórcio de empresas privadas, sob um contrato de PPP;
3) As estações serão individualmente outorgadas ao setor privado, para construção e operação, por meio de PPPs isoladas, tendo como parceiros o setor público local (municípios e Estados). Elas representam 5% do investimento total do sistema e poderão ser exploradas como centros comerciais e pontos de integração com outros modos de transporte.
Com o objetivo de assegurar o interesse do setor privado no negócio, a União terá de garantir uma demanda mínima para complementar as receitas do concessionário, em função da modicidade tarifária. O governo também deverá monitorar a construção e a operação do sistema, de forma a garantir o alto padrão de qualidade do mesmo, bem como o lucro social do dinheiro público investido e o retorno financeiro exigido pelo parceiro privado.
O dispêndio de recursos financeiros por parte do governo se concentrará no fornecimento da subestrutura e no pagamento de subsídios ao parceiro privado.
Parte desses recursos, principalmente o destinado aos subsídios, poderá retornar à União por meio das arrecadações tributárias durante a construção e operação da ferrovia e das receitas não-operacionais geradas pelo sistema, como, por exemplo, a alienação de áreas nos arredores das estações (esses locais são extremamente valorizados com a abertura da estação e são comumente usados para empreendimentos comerciais, hotéis e edifícios de escritórios).
A presença do Estado como promotor e, principalmente, como empreendedor majoritário do trem-bala Rio-São Paulo será fundamental, uma vez que não há como estruturar uma parceria de tamanha envergadura sem investimento oficial. Por fim, independentemente do modelo a ser adotado, cabe a recomendação de um imparcial estudo de demanda e uma convincente avaliação econômica desse projeto, especialmente no que diz respeito aos aspectos socioambientais e impactos sobre os sistemas de transporte urbano de ambas as metrópoles envolvidas. O trabalho completo encontra-se disponível no site:
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