Particularmente sensível à oscilação da atividade econômica e à retração nos fluxos comerciais, o setor de transporte e logística enfrenta momentos difíceis desde o fim do ano passado. O cenário é de queda no volume de carga transportada em ferrovias, nos portos e diminuição do fluxo de veículos nas rodovias.
Apesar de haver pouca expectativa de uma melhora considerável até o fim do ano, representantes do setor continuam otimistas devido à manutenção da maioria das previsões de investimento na área. Importantes projetos públicos e privados continuam de pé a despeito da crise, garantindo um panorama mais favorável para os negócios quando os fluxos comerciais voltarem. Apesar das altas cifras envolvidas, o ritmo das novas obras não agrada tanto: excesso de regulamentação, burocracia e problemas com o licenciamento ambiental seguem como vilões na conclusão dos projetos.
O Programa de Aceleração do Investimento (PAC), lançado em 2007, previu gastos de R$ 58 bilhões em logística e transportes até 2010. Segundo o último balanço do governo, 83% dos projetos estão correndo no prazo previsto, mas apenas 8% das obras foram concluídas, e entre os projetos mais importantes apenas uma pequena parte será entregue em 2009. O governo de São Paulo corre para finalizar o trecho Sul do Rodoanel até o fim do ano, e entre os projetos federais de maior vulto, apenas alguns trechos da BR 101 nas regiões Nordeste e Sul ficarão prontos.
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Na área de ferrovias, a Norte-Sul mantém-se no prazo e parte dela será entregue antes de 2010, mas a Transnordestina arrasta-se em meio a procedimentos burocráticos. Os portos contam com projetos de melhorias, e novos terminais chegam financiados pela iniciativa privada.
Paulo Fernando Fleury, diretor-executivo do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos), entende que há um “emaranhado” de problemas burocráticos que dificultam a implantação dos projetos do PAC. Ele inclui na lista de dificuldades a adequação dos projetos às exigências do Tribunal de Contas da União (TCU), questões ambientais e de patrimônio histórico.
Na visão de Fleury, o problema não está na área financeira, embora alguns projetos possam perder relevância com a crise, mas na execução dos projetos que fazem parte do PAC.
Pesquisador do núcleo de logística da Fundação Dom Cabral, o professor Paulo Tarso de Resende diz que uma parte importante dos projetos do PAC, voltados à melhoria das malhas de transporte rodoviário e ferroviário nas novas fronteiras agrícolas, está subdimensionada para as necessidades do setor, e nenhum dos grandes projetos rodoviários previstos no Mato Grosso, Pará e Bahia deverá sair em menos de três anos. O impacto é sentido no custo: “São cargas pesadas, com tráfego intenso e concentrado na época da safra”, afirma Resende.
Distante da nova fronteira agrícola, o setor ferroviário hoje depende do minério de ferro, que corresponde a quase 80% da carga transportada sobre trilhos. Com a retração no mercado internacional, as previsões do setor foram redimensionadas para baixo. Antes da crise, a previsão para 2009 era de um crescimento de 13% no movimento de carga, diz o presidente da Associação Nacional dos Transportes Ferroviários (ANTF), Rodrigo Vilaça. A projeção foi revista para 7% no início do ano e uma nova revisão deve ocorrer em julho. “Se repetirmos o resultado de 2008, já será um bom desempenho”, afirma. No novo cenário, diz Vilaça, o transporte de carga geral e contêineres deverá segurar o nível de atividade.
No setor rodoviário, os dados de movimentação divulgados pela Associação Brasileira de Concessionárias Rodoviárias (ABCR) revelam retração na movimentação. No mês de março deste ano, a queda no fluxo de veículos em relação ao mesmo mês de 2008 foi de 1,7%.
Segundo o presidente da ABCR, Moacyr Servilha Duarte, o setor já teve que conviver com queda no movimento de veículos entre 1999 e 2003, e deverá superar a fase ruim. “O risco faz parte do negócio”, diz.
Ele ressalta que, por outro lado, o setor está mais maduro e conta com um risco regulatório bem menor. Depois da segunda “leva” de concessões entre 2007 e 2008, que elevou o número de rodovias sob administração privada de 36 para 48, haverá novas oportunidades. Para 2009, ele diz que há chances de concessão do trechos da BR 040 e BR 116 no estado de Minas Gerais – a despeito de rumores no mercado quanto a um adiamento.
Um índice animador no ramo rodoviário é o aumento no número de emplacamentos de caminhões este ano, após uma retração no fim de 2008.
Números do BNDES também confirmam a recuperação: o desembolso do banco com o financiamento de caminhões totalizou R$ 2,16 bilhões no primeiro trimestre de 2009, um crescimento de 1,4% sobre igual período de 2008. Cláudio Bernardo Guimarães de Moraes, superintendente da área de operações indiretas do BNDES, diz que em 2008 o banco desembolsou R$ 11,8 bilhões para financiar a compra de caminhões, número 45% acima dos R$ 8,1 bilhões de 2007. “Se em 2009 mantivermos o mesmo número do ano passado estará ótimo”, disse Moraes.
A recessão nas principais economias mundiais também reduziu os volumes de movimentação nos portos brasileiros. A Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres de Uso Público (Abratec) prevê queda de 25% no volume de contêineres movimentados este ano em relação a 2008. Este ano a previsão é de que o Brasil movimente 3,62 milhões de contêineres, o que significará redução de 25% sobre os 4,84 milhões de unidades do ano passado.
Sérgio Salomão, presidente da Abratec, diz que apesar da redução de volume, os 14 terminais ligados à entidade vão investir este ano US$ 200 milhões que foram programados em 2008 e estão mantidos, concluindo a construção de novos berços para atracação de navios e compra de equipamentos. Investimentos novos, porém, não serão realizados, diz Salomão.
Richard Klien, vice-presidente do conselho de administração da Santos Brasil, principal terminal de contêineres do país, disse que a previsão para o ano é de uma queda de 20% a 25% nos volumes de contêineres movimentados no país.
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