Perto de terminar o mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pôs a culpa na Justiça, no Ministério Público, nos ambientalistas e nas pessoas de olho gordo por deixar no papel boa parte do trecho da ferrovia Transnordestina, projetada para ligar Eliseu Martins, no Piauí, ao Porto de Suape, em Pernambuco. É um verdadeiro inferno concluir um projeto desta magnitude, reclamou hoje, num canteiro de obras em Salgueiro, a 518 quilômetros de Recife.
Foi a quarta viagem de Lula para participar de festa de início de obras da ferrovia. Ao lançar o projeto em Missão Velha (CE), em plena campanha pela reeleição, em junho de 2006, ele disse que a Transnordestina seria a redenção do Nordeste. Hoje diretores do consórcio de construção da ferrovia informaram ao presidente que apenas 30% das obras de terraplenagem foram concluídas. A obra não ficará pronta antes de dezembro de 2012.
No ano passado, ele chegou a afirmar que iniciaria as obras de todos os lotes ao longo dos 2.278 quilômetros de ferrovia. O maior atraso está no trecho final em Pernambuco, entre Belém de Maria e Escada (55 quilômetros) e de Escada a Suape (64 quilômetros). Nestes dois lotes, os contratos para início das obras não foram assinados. Durante a visita, o presidente conheceu uma máquina importada que produzirá os dormentes de concreto para dar suporte aos trilhos. A visita de inauguração da fábrica de dormentes, como o Planalto divulgou, estava programada para março último, mas foi cancelada porque a máquina não chegou a tempo.
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A uma plateia formada por trabalhadores do canteiro em Salgueiro, o presidente se queixou de juízes, que teriam aceito pedidos de interrupção das obras por parte de quem reclamava indenização de terras. Não pensem que é fácil fazer as coisas, disse. Vocês não sabem que a inveja é uma doença, completou. Não tem nada pior do que olho gordo.
Mais tarde, ao visitar uma escola técnica em Salgueiro, Lula aproveitou para criticar os tucanos e até dom Pedro II. Sem poder inaugurar a obra dos seus sonhos, como ele mesmo chama a ferrovia, Lula disse que os governantes anteriores não priorizarem obras na região. O presidente afirmou que o governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) não investiu em ensino profissionalizante. Já dom Pedro II foi atacado por não levar à frente a obra da transposição das águas do São Francisco. Por que dom Pedro II, o todo poderoso, não conseguiu fazer o canal e um torneiro mecânico conseguiu?, esbravejou Lula. As obras de transposição também estão com cronograma atrasado.
Saia-justa
Criticado pelo governo por não ter se empenhado nas obras da ferrovia Transnordestina, o executivo Benjamin Steinbruch, que comanda o consórcio do projeto, enfrentou saia-justa na viagem com o presidente Lula ao canteiro no semiárido pernambucano. Em cima de um trecho de trilho montado apenas para a produção de fotografias, Lula olhou para Steinbruch e perguntou: Você sabe quem me disse que pode fazer trilhos?. E emendou: O Roger Agnelli, da Vale. Ele disse que vai fazer trilhos na siderúrgica que está construindo em Marabá. Depois de ouvir o nome do rival no mundo dos negócios, Steinbruch, desconcertado, disse: Aí, é covardia.
Lula não esconde o desapontamento com Steinbruch, a quem acusa de ser um dos principais responsáveis pelo atraso das obras da ferrovia. O presidente foi num ponto fraco do executivo, observaram integrantes da comitiva. Há mais de uma década, Steinbruch vive às turras com Agnelli.
A rivalidade de Steinbruch, da Companhia Siderúrgica Nacional, e Agnelli, da Vale, é famosa no mercado do aço. A briga começou em 2000, com o descruzamento de ações da Vale e da CSN. Steinbruch, que comandava o grupo, foi substituído por Agnelli. Vaidosos, eles travaram brigas até nos tribunais. Há uma série de processos judiciais por causa de minas e negócios das duas empresas. Com a última crise financeira internacional, os dois deram uma trégua.
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