*Por Antonio Pastori
Há muito tempo venho pregando (no deserto) sobre a necessidade urgente de o Município de Petrópolis elaborar um PDMU – Plano Diretor de Mobilidade Urbana, coisa que até então era somente obrigatória para cidades com mais de 500 mil habitantes.
Nesse período em que estaremos comemorando a Semana Nacional do Trânsito, tive uma grata surpresa ao descobrir que o governo federal poderá aprovar em breve o PLC-166, Projeto de Lei da Câmara, que institui uma nova Política Nacional de Mobilidade Urbana, que está há mais de quatro anos em discussão no Congresso Nacional. Esse novo dispositivo conta com 28 artigos e tem o mérito de (tentar) ser claro o bastante nos seus preceitos evitando que se torne letra morta como tantas outras leis.
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O PLC-166 tenta ir além dos aspectos intervencionistas no espaço urbano, como assim eram os antigos dispositivos, pois ignoravam a dimensão estratégica da sustentabilidade, não estimavam corretamente os custos dos investimentos e não resolviam os conflitos sociais das ocupações do espaço público pelos diversos modos. Vale lembrar que o grande paradigma presente nos planos de mobilidade urbana anteriores – para as cidades que os tinham – era que a fluidez do trânsito somente poderia ser melhorada através de grandes obras viárias – vias expressas, viadutos, túneis – quase sempre de custo muito elevado e de eficiência duvidosa, pois os veículos eram o centro do universo, e não o homem e seu ambiente.
Desta vez o novo PDMU, além de estar afinado com os princípios de integração entre os modais, parece estar realmente preocupado em facilitar a acessibilidade e a mobilidade das pessoas, e não só os veículos. Também aparenta estar em linha com o desenvolvimento sustentável das cidades, ao atentando para a importância deste estar em consonância com leis correlatas (Plano Diretor e LUPOS), observando cuidadosamente suas dimensões ambientais e socioeconômica. A lei captura um antigo anseio: priorizar os modos coletivos, os veículos não motorizados e os que utilizam de tecnologia limpa. Indo direto aos pontos, vou destacar alguns conceitos e méritos desse PLC:
1)A grande simplificação está na hierarquização que prioriza, por exemplo, o não motorizado sobre o motorizado (modos); os passageiros sobre as cargas (objetos); o coletivo sobre o individual (característica do serviço), e a ascendência do transporte público sobre o privado (natureza do serviço);
2)Há um estímulo para o desenvolvimento de novas tecnologias limpas de transportes. Nesse sentido, o veículo experimental de levitação magnética – o Maglev, ora em desenvolvimento na UFRJ – cai como uma luva;
3)São bem-vindos os projetos de transporte público coletivo de alta e média capacidade que sejam estruturadores do território e indutores do desenvolvimento integrado de novas áreas, estimulando à descentralização urbana. O Trem Expresso Imperial Rio Petrópolis se encaixa perfeitamente nessa condição ao oferecer uma nova rota de acesso a Petrópolis, via Rua Tereza;
4)A contratação de serviços públicos de transporte coletivo deverá ser feita somente por licitação, e as receitas alternativas (fretamento os ônibus para uso particular, turismo, passeios escolares, etc.) deverão compor a tarifa;
5)O cidadão comum terá o direito – e o dever, digo eu – de participar do planejamento, da fiscalização, e da avaliação da política local de mobilidade urbana;
6)O artigo 15 reforça a importância de estimular a atuação de Órgãos Colegiados atuantes – os COMUTRANS da vida – como forma de pleno exercício da cidadania (será que vai pegar por aqui?);
7)Um aspecto extremamente interessante é quanto as atribuições da União (artigo 16) que deve contribuir para capacitação técnica dos envolvidos, prestando assistência técnica e financeira além de fomentar a implantação de transportes coletivos de média e grande capacidade, como VLTs, Trens Regionais, BRTs, etc.;
8)Da mesma forma, cabe ao governo estadual garantir o apoio e promover a integração dos serviços nas áreas que ultrapassem os limites do município (olha o Expresso Imperial ai de novo, pois o trem cruza os municípios de Magé, Duque de Caxias e Rio de Janeiro);
9)O PMDU deve estabelecer objetivos e metas de curto, médio e longo prazo; tem de assegurar os meios para sua implantação; deve prever mecanismos de controle, monitoramento e avaliação; deve estabelecer padrões de emissão de poluentes; pode estabelecer horários, locais restritos de circulação, espaços exclusivos para cargas, modos não motorizados, e outras;
10)Por derradeiro, vem a melhor de todas, no artigo 24: para os municípios com mais de 20 mil habitantes, o PDMU deverá ser elaborado juntamente com o Plano Diretor e no prazo legal, findo o qual o município ficará impossibilitado de receber recursos da União (essa foi genial, pois terão de fazer aquilo que venho falando há muito tempo).
Bom, o recado está dado. Esta na hora de o cidadão petropolitano cobrar dos vereadores e das autoridades municipais, que seja iniciada a elaboração do PDMU em conjunto com o Plano Diretor para que, com esses instrumentos de planejamento, tentar por um pouco de ordem no estado de permanente improviso em que vive Petróville City há anos. Não dá mais para ficar brincando com os graves problemas de (i)mobilidade. Bobagem pensar que de cada um isoladamente acha que sabe como melhorar a nossa mobilidade urbana. O dia mundial sem carro (22/09) foi reservado para a reflexão sobre a forma altamente irracional que o nosso sistema de trânsito & transportes chegou: 38 mil mortos ano, sem contar com o enorme desperdício de combustível fóssil em constantes congestionamentos, stresses, etc., causando danos por vezes irreparáveis aos bens materiais, às vidas das pessoas e ao meio ambiente.
Sei, contudo, que é difícil para muita gente, não somente deixar o carro em casa nesse dia, mas também em qualquer outro. Tudo seria mais fácil se já tivéssemos um sistema civilizadamente decente trânsito e de transportes coletivos implantado. Para tanto, bastaria que os governos – nas suas três esferas – tivessem real vontade de fazer aquilo para o qual foram eleitos e pagos, mas não o fizeram: pensar, planejar (conjuntamente com a sociedade) e implementar os melhores planos, projetos e soluções para as cidades, para os cidadãos, e para o meio ambiente.
Sim, a culpa é “deles”, diria o leitor. Mas boa parte também é nossa, pois somos tão culpados quando nos omitimos nos processos participativos, nas cobranças e na pressa cívica da cumprir com a nossa obrigação eleitoral, elegendo alguns políticos erradamente todos os anos.
Tenho fé que um dia a gente acerta, apesar de todas as evidências em contrário. Creio que um dia Petróville City poderá se tornar novamente uma exemplar cidade de invejável padrão ambientalmente sustentável, como assim planejava o Major Köeler, cujo pensamento pioneiro de 160 anos atrás, ainda muita falta nos faz.
*Antonio Pastori é presidente da AFPF – Assoc. Fluminense de Preservação Ferroviária
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