O peso da ineficiência

O custo de exportação de uma geladeira fabricada no Brasil fica, na média, em R$ 150, o triplo da média internacional. A diferença é resultado da desequilibrada matriz de transportes, que apresenta uma defasagem de 67% em comparação a regiões mais avançadas do mundo. Para reverter o quadro atual e contribuir para a redução de custos logísticos, é essencial que o programa de concessões de rodovias, ferrovias, aeroportos e portos tenha sucesso nos próximos meses, segundo especialistas que participaram do 8º Encontro de Logística e Transportes, realizado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), nos dias 6 e 7, na capital paulista. Avançar com o programa, contudo, exige a superação de vários desafios – da melhoria dos projetos ao aperfeiçoamento de questões financeiras e regulatórias.


O maior problema nosso é a falta de competitividade, agravada pela questão logística. Precisamos mudar esse quadro, precisamos melhorar a gestão, o planejamento, criar maior concorrência e reduzir custos, destacou o presidente da Fiesp, Paulo Skaf. O peso da ineficiência da matriz de transportes chegou ao limite, a atração do capital privado é importante, disse o diretor de infraestrutura da entidade, Carlos Cavalcanti. O Brasil tem um déficit de 30 anos na área de transportes, o que deve somar cerca de R$ 500 bilhões a R$ 600 bilhões em gargalos logísticos, por isso queremos um choque na área com a atração de capital privado para reduzir custos nos próximos anos, disse o presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), Bernardo Figueiredo.


Para isso, o governo deverá lançar nos próximos meses o maior programa de concessões da história do setor de transportes, que deverá contemplar R$ 242 bilhões em investimentos em diferentes modais. Queremos duplicar os principais trechos rodoviários do Centro-Oeste à região Sul e criar uma nova malha ferroviária que permitirá velocidades de 80 km/h afirmou Figueiredo. O ministro-chefe da Secretaria de Aviação Civil, Moreira Franco, ressaltou que o capital privado assumiu um novo papel no cenário. Não discutimos mais a questão do capital privado. Se possível, devemos, sim, mobilizar outras fontes de investimento além da pública, avaliou.


Para avançar com os projetos de infraestrutura, Moreira Franco afirmou que será preciso aperfeiçoar alguns pontos. No aeroporto do Galeão (RJ), em dois anos, houve progresso de 5,23% de algumas obras executadas. Em Fortaleza, chegou-se a 12% de obras realizadas. A lentidão é facilmente explicada. A razão é falta de projetos de engenharia, que não são adequados, exemplificou. Outro problema é o processo licitatório feito sob o regime da Lei 8.666, que, segundo ele, impõe empresas que não têm condições de oferecer serviços adequados, mas têm preços mais baixos. Outra questão é o Tribunal de Contas da União (TCU), cuja função é fiscalização, mas às vezes acaba interferindo no andamento das obras, nas fases de execução.


Hoje cerca de dois terços do financiamento de longo prazo no Brasil estão nas mãos do BNDES, que financiou cerca de R$ 25 bilhões em infraestrutura no ano passado, dos quais 30%, pouco mais de R$ 7 bilhões, relacionados a projetos de logística. O financiamento de longo prazo está no BNDES, o desafio é destravar o mercado de capitais para avançar com esse programa de concessões, comentou Alexandre Rosa, gerente de infraestrutura e meio ambiente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).


Para Rosa, o desafio é fazer com que o Brasil e os outros países da América Latina invistam 5% do PIB em infraestrutura, para superar os atuais gargalos. Nos últimos anos, a aplicação de recursos tem ficado em 3% na região, com dois terços vindos do setor público e um terço dos empresários.


O diretor de infraestrutura e estruturação de projetos do BNDES, Roberto Zurli Machado, afirmou que o programa de concessões do governo federal busca combinar risco baixo com retorno elevado, o que pode atrair investidores estrangeiros e nacionais ao setor. Para esse tamanho de investimentos que estamos falando, será preciso ter várias fontes de financiamento, novos atores financeiros, mais instrumentos de renda variável e mais avanços em project finance, destacou.


As debêntures de infraestrutura, criadas sob a lei 12.341 e que contêm vários benefícios fiscais, poderão ser fonte complementar importante de recursos para projetos, acrescentou o executivo.


O vice-presidente da CCR, Ricardo Castanheira, destacou que o programa de concessões prevê um volume elevado de investimentos nos cinco primeiros anos das concessões, o que cria o desafio da estruturação financeira. Isso passa por soluções de project finance, ainda pouco usado no Brasil, onde as empresas têm dificuldade de utilizar a garantia de receita do projeto para financiá-lo. O aeroporto de Quito, no Equador, conseguimos fazer por project finance. Aqui estamos em diálogo com governo e bancos para destravar isso.


O programa de concessões traz novidades. Na área de rodovias, buscou-se criar contratos que premiam a boa gestão por meio de incentivos. Antecipação de obras pode gerar acréscimo de reequilíbrio tarifário. A redução de acidentes com vítimas, quando comparada a outras rodovias, também poderá render um acréscimo de até 3% por ano na tarifa. Isso busca incentivar a gestão, enfatizou o gerente de regulação e outorga da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Érico Guzen. Nos nove lotes a serem concedidos, o governo pretende que sejam duplicados 5,8 mil km de rodovias, sendo que o maior trecho, de 1,4 mil km, compreende o lote das BR-163, BR-267 e BR-262, que terá investimentos totais de R$ 8,7 bilhões. Há preocupação de que o prazo de cinco anos para essa duplicação é apertado, afirma o diretor de um grande grupo.



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