Fundamental para reverter a escalada do desemprego no país,
que pode chegar a 14 milhões de pessoas no fim deste ano, o programa de
concessões de infraestrutura não contará com financiamento subsidiado pelo
governo. O crédito de longo prazo terá que ser oferecido em condições de
mercado pelos bancos públicos e privados, nacionais e estrangeiros, o funding
das operações poderá contar com uma parcela de recursos dos depósitos
judiciais. O cenário é desenhado pelo secretário-executivo do Programa de
Parcerias de Investimentos (PPI), Moreira Franco, que recebeu do presidente
interino, Michel Temer, a missão de tirar os investidores privados da
defensiva.
“Vamos evitar dinheiro subsidiado. É muito difícil para
um Estado quebrado manter a mesma política que estimulou a quebradeira”,
disse Moreira.
Em entrevista ao Valor, ele comentou as ações que estão
sendo tomadas para tornar o período pós-impeachment mais convidativo aos
investimentos privados. Afastada a incerteza política, a tarefa será consolidar
um ambiente concorrencial mais oxigenado, o que passa por adequações de regras
e procedimentos, bem como atualização das competências dos ministérios e das
agências reguladoras.
O modelo de financiamento não está completamente definido.
Segundo ele, os detalhes estão sendo discutidos com o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que nos últimos anos garantiu o
sucesso de vários leilões com taxas de juros generosas. Dessa vez, a
instituição irá participar, mas de forma bem mais cautelosa.
“As taxas praticadas pelo BNDES no passado, que
afastaram os bancos privados do processo de financiamento, gerando toda essa
insegurança entre o empréstimo-ponte e o longo prazo, isso é uma situação
extremamente inconveniente para um processo de financiamento e não vai ocorrer
mais”, garantiu o secretário.
Além do BNDES, o governo conseguiu atrair para o programa de
concessões a Caixa Econômica Federal, que também oferecerá linha de
financiamento – de menor fôlego. Moreira quer que o Banco do Brasil e as
instituições financeiras privadas também participem. Entre as opções de funding
avaliadas até agora estão o FI-FGTS, braço de infraestrutura do Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço, e uma parcela dos depósitos judiciais.
Polêmico, o uso dos depósitos judiciais já é comentado no
mercado, mas a operação enfrenta resistências dentro do governo, sobretudo no
Ministério da Fazenda. Moreira afirmou, no entanto, que o assunto está sendo
discutido e que a decisão será dada por Temer no dia 13 de setembro, data
marcada para a primeira reunião do conselho do PPI.
No encontro serão avaliadas as primeiras propostas de
concessão de serviços à iniciativa privada. A lista inclui aeroportos,
ferrovias, rodovias, terminais portuários e blocos de petróleo, além de
projetos de saneamento. Moreira Franco informou que haverá mais empreendimentos
do que os já conhecidos, mas não quis nomear quais as empresas ou setores
poderão ser incluídos nas privatizações.
“Temos que cumprir um rito para que as coisas possam
ser feitas. É necessário que nós tenhamos capacidade de esperar, até porque não
é objetivo ter pacote e nem um grande evento publicitário. Vamos ter um
conjunto de iniciativas de parcerias de investimento para gerar os empregos
necessários”, disse o secretário.
Além dos empreendimentos, vão ser discutidas na reunião
mudanças de natureza regulatória. Será anunciado, por exemplo, o novo prazo de
100 dias entre a publicação dos editais e a realização dos leilões. Outras duas
propostas estão na pauta: que os editais só sejam publicados após a emissão da
licença ambiental prévia e uma padronização das regras para realização de
audiências públicas.
Moreira Franco também comentou as mudanças previstas na
atuação das agências reguladoras. Ele afirmou que ainda não há uma proposta
definida, mas que a ideia é que haja uma redefinição do processo decisório
tanto das agências quanto dos ministérios setoriais, no intuito de fortalecer
todos os órgãos.
“Para que haja segurança jurídica, é fundamental que o
papel de cada ente esteja bem definido. O papel do poder concedente, do
concessionário e das agências. Não havia muita clareza sobre isso, porque desde
que Dilma (Rousseff) assumiu a Casa Civil [em 2005] iniciou-se um processo de
‘infantilização’ do poder político dos ministérios e do poder técnico das
agências”, disse.
Segundo Moreira, a centralização das decisões em Dilma
desorganizou a divisão de competências. “As decisões eram tomadas de
maneira absolutamente anárquica. Isso gerou todo esse processo confuso que hoje
temos que consertar”, afirmou. Entre as mudanças principais está a
retomada da competência dos ministérios setoriais para funções como elaboração
de editais, leilões e celebração de contratos.
“Pela regra, a responsabilidade é do poder concedente.
Ele pode e deve usar a experiência das agências, mas não deve transferir para a
agência a responsabilidade que é dele. O mesmo vale para a elaboração do
contrato. É o poder concedente que faz isso”, explicou.
Um dos auxiliares mais próximos de Temer, Moreira Franco
disse que a crise econômica e a escalada do desemprego no país realça a
prioridade dos investimentos em infraestrutura, que são intensivos em mão de
obra. Se até pouco tempo atrás o objetivo principal das concessões era a
redução dos custos de produção, agora é, também, a geração de empregos.
“O presidente Temer recebeu um país com mais de 11
milhões de desempregados e todos os números estão a indicar, as projeções
mostram, que estamos caminhando para 14 milhões até o fim do ano. Então temos
urgência em gerar emprego”, disse Moreira. “No passado, quando
tínhamos situação mais confortável de emprego, o objetivo principal era
diminuir o custo Brasil. Agora não. Agora é gerar emprego, pois é extremamente
doloroso conviver em um ambiente com este número de brasileiros sem trabalho”,
completou.
Questionado sobre a confiabilidade de que o ajuste fiscal do
governo Temer será bem-sucedido, ele afirmou a força do ministro da Fazenda,
Henrique Meirelles, é que pode garantir o êxito. “A experiência que nós
temos no Brasil é de que quando o ministro não é fortalecido, as consequências
são terríveis.”
Seja o primeiro a comentar