Brasil vai perder competitividade e investimentos com nova tributação

Ao contrário do que se esperava, as medidas anunciadas pelo
governo federal no plano de criação de novo marco regulatório da indústria de
mineração desagradaram a maioria das empresas que atuam no país. Na avaliação
de mineradoras ouvidas pelo Valor, o resultado é a perda de competitividade no
país frente às suas concorrentes. Ao mesmo tempo, alertam que os investimentos
da multinacionais deverão rumar para outros países, como Peru, Chile, Austrália
e Canadá.

O mal-estar no setor foi agravado principalmente pelo
aumento da alíquota de royalties sobre a produção mineral, a Contribuição
Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem). E pela forma como ele
veio: por Medida Provisória (MP). Começa a incidir imediatamente sobre a produção.
Na média, o aumento é da ordem de 80% sobre os percentuais cobrados até agora.

É um momento difícil e delicado, em que a sanha
tributária, principalmente dos municípios, ameaça todo o setor mineral
afirmou Walter Alvarenga, presidente do Instituto Brasileiro de Mineração
(Ibram), que representa as mineradoras no país. Os municípios ficam com dois
terços do valor arrecado com o tributo.

Executivos da Vale, Votorantim Metais, Mineração Rio do
Norte, CSN Mineração, Alcoa, Anglo American, Anglo Gold Ashanti, Imerys, CMOC,
Kinross e Samarco foram unânimes: os aumentos de tributos sobre o setor,
aliados às dificuldades para se obter licenciamento ambiental para novos
projetos, e até para as operações existentes, vão desestimular novos
investimentos no país.

O ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, disse
ao Valor que até agora o Brasil vivia com a incerteza sobre as regras no setor.
Que a nova regulação traz uma segurança e clareza para quem vai investir. Ele
acredita que as medidas não vão afugentar investimentos, ao contrário, fazer
com que retornem ao país, que enfrenta retração nos últimos anos.

O ministro afirmou que a adoção de MP foi o caminho
encontrado para que o plano de revitalização saísse do papel, depois de anos de
discussão sem chegar a lugar nenhum. Na forma de projeto de lei, como era
antes, não sairia do Congresso, afirmou. Coelho Filho acrescentou que o
aumento do royalty já era discutido no projeto anterior. Aumento de
imposto sempre tem uma reação por parte das empresas.

Para o ministro, apesar da mudança da base de cálculo da
Cfem – de receita líquida para faturamento bruto – o novo imposto é mais justo.
Descartando o peso da Casa Civil e da Fazenda no texto final do novo marco,
informou que a proposição das mudanças foi do seu ministério, depois debatidas
nos dois ministérios e Receita Federal. Agora temos um marco regulatório,
que permitirá a volta de muitos investimentos.

Já para as empresas, a mudança de base de cálculo, por si
só, já significou aumento da tributação. Essa sanha arrecadadora não leva
em conta a perda de competitividade com a carga tributária que já temos no
país. Só a necessidade econômica de municípios, que são os maiores
beneficiários da Cfem, disse Clóvis Torres, diretor-executivo da Vale.
Segundo ele, não se pode olhar isoladamente a questão da Cfem, pois o Brasil,
entre os cinco grandes países mineradores, é de longe o que tem a maior
tributação – 14% superior à do segundo colocado.

Torres, diretor-executivo da Vale. Segundo ele, não se pode
olhar isoladamente a questão da Cfem, pois o Brasil, entre os cinco grandes
países mineradores, é de longe o que tem a maior tributação – 14% superior à do
segundo colocado.

Com o nome pomposo de Programa Nacional de Revitalização da
Indústria Mineral, o novo marco regulatório foi lançado por meio de três MPs –
uma definindo a nova Cfem, outra criou a Agência Nacional de Mineração (ANM),
que substitui o DNPM (órgão federal do setor) e a terceira regulamentou o
código mineral do país, criado há décadas. Ficaram de fora alguns temas, como a
mineração em faixa de fronteira por estrangeiros e diretrizes mais claras para
os processos de licenciamento ambiental.

Para Tito Martins, da Votorantim Metais, ao não se
considerar um série de problemas que já existiam, em discussão com o DNPM,
vão criar indisposição para todos os lados da forma como foram
apresentadas as mudanças de regras no setor. Sabe o que vai acontecer?
Judicialização. Diz que o país não está preocupado em tratar mineração
como uma indústria relevante, apesar de ser. Representa 16% do PIB da produção
industrial.

Diante desse cenário, uma empresa multinacional vai
ter preferência por outros países, afirmou Ruben Fernandes, presidente da
Anglo American Brasil, que produz minério de ferro e níquel no país, destacando
o peso do custo que o país já carrega.

No caso da Imerys, de mineração de caulim no Pará, ao se
decidir sobre dois investimentos recentemente, o board da companhia nos EUA
optou por um projeto de menor retorno na América do Norte do que por um no
Brasil, mais atraente. O que pesou, relatou Marcos Moreira, diretor de operação
da divisão global de caulim, foi a incerteza de regras. Cada dia tem um
notícia diferente no Brasil. Agora é a Cfem; qual será a próxima,
perguntou o CEO da Imerys.

Há um mar de exemplos de dificuldades relatadas pelas
empresas no seu dia a dia e que, para todas, tendem a se agravar. Um problema,
apontam, é a burocratização existente na área ambiental. Para fazermos o
EIA/Rima de um projeto nos foi exigido um estudo do próprio Estudo de
Licenciamento. E já dura mais de dois anos, com termos de referência indo e
vindo. Provavelmente vai custar mais esse estudo do que a compensação do eventual
impacto, relatou o presidente da Alcoa no Brasil, Otávio Carvalheira.

Na mineração de agregados (argila, brita e areia), insumos
utilizados na construção civil, o presidente da Embú, Luiz Eulálio Moraes
Terra, disse que o tributo triplicou, apenas com a mudança da base de cálculo.
Vai passar de 0,5% do projeto anterior para 1,5% com a nova regra. O que
se previa para baratear o custo da construção, vai encarecer.

O Ibram e as empresas afiliadas começa a se preparar para
uma batalha árdua nos bastidores do Congresso Nacional, onde deputados e
senadores vão analisar as medidas provisórias. O cipoal de emendas de
parlamentares, que querem incluir as mais diversas propostas, é imenso. Foram
apresentadas cerca de 400, segundo Coelho Filho. Em muitos casos, há pedidos de
maior aumento de tributação sobre as mineradoras.

O Valor vai publicar, em breve, a íntegra da mesa redonda
que discutiu com representantes do setor o novo marco regulatório.

 

 

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