O Congresso Nacional já pressiona por mudanças relevantes
nas medidas provisórias que aumentam os royalties da mineração e alteram o
marco regulatório do setor. Deputados e senadores apresentaram quase 350
emendas – número alto para os padrões legislativos – aos textos enviados
originalmente pelo governo. Muitas buscam elevar a fatura imposta às
mineradoras, com aumentos ainda maiores das alíquotas e cobrança de
participações especiais sobre jazidas de alta produtividade, como já ocorre na
indústria de petróleo e gás.
A pressão por mais receitas é encabeçada pela bancada
paraense. O senador Flexa Ribeiro (PSDB) e o deputado Arnaldo Jordy (PPS),
ambos da base aliada, resgataram a ideia de uma tributação adicional sobre
projetos de minério de ferro com “grande rentabilidade” para reforçar
os cofres públicos. Flexa sugere uma taxa extra de até 2,6% do faturamento
bruto para jazidas com produção a partir de 6 milhões de toneladas por
trimestre, como aquelas localizadas na Serra dos Carajás (PA) e no Quadrilátero
Ferrífero (MG), dependendo do volume extraído e do teor médio de ferro. Em
outra emenda, Jordy propõe mais uma alíquota de pelo menos 5% sobre minas que
tenham “lucros extraordinários”.
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A cobrança de participações especiais era um desejo da
ex-presidente Dilma Rousseff ao elaborar sua proposta de reforma do código de
mineração. Ela foi dissuadida do mecanismo na reta final de discussões pelo
então presidente da Vale, Murilo Ferreira, e retirou essa previsão do projeto
de lei encaminhado à Câmara dos Deputados em 2013.
A Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais
(Amig) defende uma alíquota fixa de 4% como royalties sobre o minério de ferro
e também se diz a favor das participações especiais. Lembra que outro grande
produtor global, a Austrália, tem royalties de 5% a 7,5%. Hoje o Brasil cobra
2%. “Não somos loucos de matar a galinha dos ovos de ouro. Só estamos
falando em dar tratamento mais justo a negócios que são absolutamente
extraordinários”, argumenta Waldir Salvador, consultor da Amig, em
referência à proposta de participações especiais. Ele acredita, porém, que a
ideia tem pouca chance de prosperar. “O lobby contrário das empresas é
pesadíssimo.”
O senador Flexa Ribeiro também propõe uma tabela de
royalties com alíquotas progressivas, de 3% a 6%, variando conforme a oscilação
de preços no mercado internacional. Trata-se do mesmo sistema desenhado pelo
governo, mas com uma diferença essencial: o Palácio do Planalto sugere uma
faixa entre 2% e 4% para a Compensação Financeira pela Exploração Mineral
(Cfem).
Na tabela elaborada pelo Ministério de Minas e Energia, os
royalties são mais baixos quando a cotação do minério estiver em menos de US$
60 por tonelada e mais altos quando ultrapassar a casa de US$ 100. Existem ainda
três alíquotas intermediárias. Em outra emenda, o deputado José Priante
(PMDB-PA) sugere a manutenção do sistema de royalties variáveis, mas diminui o
valor de entrada em cada faixa. Ele quer 2% de tributação com o minério abaixo
de US$ 50, 3% de US$ 50 a US$ 80, 4% acima de US$ 100. Na prática, essa mudança
resultaria em taxação extra das empresas.
“As empresas não suportam mais o aumento da carga
tributária no Brasil”, lamenta o presidente do Instituto Brasileiro de
Mineração (Ibram), Walter Alvarenga. Para ele, comparar apenas os royalties
cobrados no Brasil e em outros países gera distorções.
De acordo com o executivo, só a carga tributária atinge
entre 35% e 40% das receitas, mas outras despesas – como taxas estaduais de
licenciamento, taxas municipais de uso da água, custos logísticos e
trabalhistas – têm que ser considerados em uma conta perversa: a perda de
competitividade do Brasil na comparação com outros fornecedores. Diante desse
quadro, é preciso discutir com prudência o aumento dos royalties: “Vemos
isso com grande preocupação”.
O prazo para a apresentação de emendas terminou às 18h de
ontem e 344 propostas de mudanças eram contabilizadas até esse horário no
sistema de acompanhamento do Senado. Agora serão montadas as comissões
especiais das três medidas provisórias enviadas pelo governo e designados os
relatores. Uma MP trata especificamente dos royalties, outra modifica 23 pontos
do código de mineração em vigência desde 1967 e a terceira cria uma agência
reguladora para o setor – em substituição ao Departamento Nacional de Produção
Mineral.
No ano passado, a arrecadação com royalties alcançou R$ 1,8
bilhão. O governo espera um aumento de 80% nas receitas anuais com a Cfem. Isso
significa, se forem mantidas as atuais cotações, um acréscimo em torno de R$
1,5 bilhão por ano. A divisão das receitas é feita da seguinte forma: 65% para
municípios onde estão as jazidas, 23% para os Estados produtores e 12% para a
União.
Várias emendas de parlamentares de grupos políticos
diferentes – como Soraya Santos (PMDB-RJ), Luiz Sérgio (PT-RJ) e Cleber Verde
(PRB-MA) – defendem uma parcela minoritária das receitas para municípios
“indiretamente” afetados pelas atividades minerais. São
principalmente cidades com infraestrutura ferroviária ou portuária, com
embarque e desembarque de minérios, e impactos como partículas atmosféricas e
poluição sonora.
Algumas propostas de mudança estão em linha com os
interesses das mineradoras. Uma delas, da deputada Gorete Pereira (PR-CE),
prevê o uso dos direitos minerários sobre as jazidas como garantia real das
empresas na obtenção de financiamento.
Outra sugestão importante, apresentada por Aelton Freitas
(PR-MG), deduz gastos com transporte e seguro do cálculo de receita bruta das
mineradoras. O tema é delicado porque, além de mexer nas alíquotas, o governo
resolveu mudar a cobrança de faturamento líquido para total. Isso inclui, por exemplo,
as despesas com frete para o escoamento da produção. “Conforme a redação
vigente, há um tratamento igual para situações absolutamente desiguais, pois as
minas que estiverem mais próximas do local de embarque ou do ponto de
beneficiamento pagarão aos cofres federais valor diferente pelo mesmo bem
minera”, diz Aelton Freitas em sua justificativa.
Além das participações especiais, outro mecanismo usado na
indústria de petróleo pode ser replicado na mineração: a política de conteúdo
nacional. O deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) pretende incorporar ao texto de
uma das medidas provisórias a exigência de um índice “não inferior” a
60% para a nacionalização de equipamentos utilizados “nas instalações de
voltadas às atividades de lavra, beneficiamento e transporte de minério”.
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