A mobilidade
urbana é um nó a ser desfeito nas maiores cidades brasileiras, onde a população
experimenta excruciante rotina de vias congestionadas, ônibus lotados, escassas
alternativas de transporte sobre trilhos e demoradas viagens entre bairros
afastados e regiões mais centrais que concentram a oferta de emprego.
Embora
iniciativas relevantes tenham surgido nos últimos anos, parte delas em torno da
realização de grandes eventos, como a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016, as
deficiências se acumulam.
POD NOS TRILHOS
- Investimentos, projetos e desafios da CCR na mobilidade urbana
- O projeto de renovação de 560 km de vias da MRS
- Da expansão da Malha Norte às obras na Malha Paulista: os projetos da Rumo no setor ferroviário
- TIC Trens: o sonho começa a virar realidade
- SP nos Trilhos: os projetos ferroviários na carteira do estado
Além de
insuficientes, nem todas as propostas de melhoria saíram do papel, e algumas já
apresentam problemas de conservação.
O drama do
transporte público brasileiro tem origem em fatores socioeconômicos e em
decisões duvidosas tomadas pelo Estado ao longo de décadas.
No século
passado, o forte crescimento demográfico e o processo de urbanização fomentaram
uma vertiginosa expansão das cidades sem a necessária infraestrutura e com
planejamento precário.
Simultaneamente,
os esforços de modernização e de desenvolvimento industrial, que se renovaram
no pós-Guerra, levaram o Brasil a optar pela predominância do modelo
rodoviário, com o uso intensivo do automóvel.
Nesse
quadro, coube ao ônibus, muito mais do que ao trem e ao metrô, assumir a função
de principal meio coletivo, numa disputa ferrenha pelo espaço viário com a
frota de carros em contínua ampliação.
Foi apenas
na década de 1970 que o Brasil deu início, em São Paulo e a seguir no Rio de
Janeiro, à construção de linhas de metrô —que já existiam em cidades europeias
desde o final do século 19.
Mas os
custos elevados e a morosidade do poder público não têm permitido que a malha
de trilhos, subterrâneos ou não, cumpra o papel desejado pela população.
Como mostra
caderno especial publicado no sábado (21) por esta Folha, carro e ônibus
continuam a ser os principais meios de transporte, cada um proporcionando cerca
de 16% dos deslocamentos, enquanto trens e metrôs respondem por apenas 2,4%.
Para
combater os transtornos causados pelo excesso de automóveis nas cidades e a
carência de investimentos em meios coletivos, mostra-se imperativo conter a
primazia do transporte individual.
Em
contrapartida, os centros mais populosos precisam desenvolver seus sistemas de
modo eficiente e racional. Parece recomendável, nesses casos, a atuação de uma
autoridade metropolitana capaz de planejar e harmonizar as redes de municípios
conurbados.
A questão
mais espinhosa diz respeito ao financiamento da expansão do transporte num país
de renda média —que atravessa, ademais, período de grave sangria nas contas
governamentais.
Na quase
totalidade das cidades brasileiras, depende-se basicamente do valor arrecadado
com as tarifas paga pelos passageiros, que nem sempre são suportadas pelas
camadas mais pobres.
Estudo do
Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, ligado ao Planejamento) estima
que cerca de 30% das famílias na base da pirâmide social deixam de usar os
meios coletivos por falta de dinheiro.
Em termos de
subsídios ao setor, São Paulo é a grande exceção entre as capitais do país. O
usuário paulistano arca com 50% dos custos, e a prefeitura, com 38%. O restante
é coberto por vale-transporte (10%) e outras receitas (2%).
Essa equação
representa um alívio para a população e as empresas do setor, mas é opção que
retira investimentos de outros setores e onera as contas municipais.
Um caminho a
ser estudado é o da busca de outras fontes de recursos. Faz sentido, em tese ao
menos, que parte delas provenha do transporte individual.
Além da
implantação de pedágios urbanos e da redução da oferta de vagas gratuitas para
estacionamento nas vias, é preciso considerar uma revisão criteriosa de
incentivos tributários concedidos à indústria de veículos.
Outra possibilidade
é a aplicação de uma alíquota sobre a venda de combustíveis usados em
automóveis —tramita na Câmara dos Deputados uma proposta de emenda à
Constituição com esse objetivo.
Interessada
na medida, a Frente Nacional de Prefeitos estima que um aumento de 6% no preço
do litro de combustível poderia proporcionar uma queda de até 25% nas tarifas
de ônibus ou metrô. Esta serviria também para compensar eventual impacto
inflacionário do encarecimento da gasolina.
Também podem
ser mais bem planejadas as gratuidades oferecidas a idosos, estudantes e outros
segmentos, que não atendem a critérios de renda —nesse modelo, usuários mais
pobres acabam por financiar grupos que poderiam pagar ao menos parte da
passagem.
* Artigo da seção “O que a folha pensa”.
Leia mais: Governo
paulista ‘refina’ estudo sobre trem entre capital e interior
– Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2018/07/mobilidade-travada.shtml?loggedpaywall
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