História ferroviária paulista vira ruína e MPF cobra resgate do governo federal

SOROCABA –
No auge das ferrovias, em meados do século passado, o Estado de São Paulo
chegou a ter cerca de 500 estações ferroviárias. Com o fim do transporte de
passageiros por trens de longo percurso, durante a década de 1980 e início dos
anos 1990, parte desse patrimônio ficou abandonada e, quando não sofreu saques
e depredações, acabou ruindo por falta de conservação. Hoje, menos de 50% das
estações continuam em pé, segundo a Associação Brasileira de Preservação
Ferroviária (ABPF).

Uma ação do
Ministério Público Federal (MPF) quer agora que a União promova a recuperação
de estações ferroviárias abandonadas em seis municípios da região de Bauru,
interior de São Paulo. A ação pede ainda que sejam regularizados imóveis
ocupados indevidamente e seja dada uma destinação “eficiente, moral e legal” ao
patrimônio. O pedido, levado à 1.ª Vara Federal de Bauru, engloba estações e
trilhos das cidades de Agudos, Avaí, Cabrália Paulista, Duartina, Pederneiras e
Piratininga. Ações semelhantes já foram propostas em São Paulo, Itapeva e
Sorocaba.

Os bens, que
hoje pertencem à União, integravam o patrimônio das extintas Ferrovia Paulista
(Fepasa) e Rede Ferroviária Federal (RFFSA). Os inquéritos abertos pelo MPF
identificaram áreas e imóveis invadidos, depredados e abandonados. O procurador
da República André Libonati, autor da ação em Bauru, disse que o processo se
restringe aos imóveis sem uso pelas concessionárias. De acordo com ele, casas e
estações podem ser utilizadas pelas prefeituras, que se incumbiriam da
conservação, enquanto os terrenos se destinariam a parques e moradias populares
– ou leilão.

Em
Pederneiras, o prédio da estação da Paulista, de 1913, no centro da cidade, foi
recuperado pela prefeitura e, além de virar sede da Secretaria Municipal de
Cultura e Turismo, abriga um centro cultural. Em um antigo depósito da
ferrovia, restaurado, funciona o teatro municipal. “O conjunto estava
abandonado até 1998. Agora é o cartão-postal da cidade”, disse Joaquim Bueno,
responsável pela segurança do prédio.

Mas na
maioria das cidades o que se vê é o abandono. Na mesma Pederneiras, a antiga
estação ferroviária de Guaianás, de 1910, foi saqueada até o último tijolo.
Restou em pé parte das colunas metálicas que sustentavam a cobertura da
plataforma. A área está ocupada por 80 famílias de um movimento social. “A
gente estava em um acampamento à beira de uma rodovia e o terreno aqui não
tinha uso”, disse o lavrador Valdinei Ribamar, de 35 anos.

Em Avaí, a
estação da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, instalada em 1906, está em ruínas.
Até portas e janelas originais do prédio foram saqueadas e o interior virou
depósito de lixo. “Aqui foi o coração da cidade, com um movimento grande de
gente e de cargas. Hoje é só tristeza”, diz o aposentado Pedro Mendes Neves, de
77 anos, o último chefe da estação.

Em setembro
de 2017, a prefeitura enviou documentação ao governo federal pedindo a cessão
do prédio, mas o processo ainda tramita, segundo o assessor de gabinete
Fabrício Berbel. “Vamos reformar e instalar ali nosso museu histórico.”

Outras ações
do MPF versam sobre o abandono do patrimônio. Em São Paulo, uma ação civil
pública iniciada em 2014 pede a reativação do ramal ferroviário Santos-Cajati,
que operou com transporte de passageiros até 1997. A empresa Rumo,
concessionária da malha paulista, informou que a reativação da ferrovia não se
encaixa na concessão. Das 40 estações, restam 12, algumas descaracterizadas,
como Itanhaém e Juquiá.

Em 2015, o
MPF entrou com ação para obrigar os órgãos da União e o município a restaurar o
conjunto da Estação Ferroviária de Itapeva, no sudoeste paulista. O prédio foi
construído em 1909 pelo arquiteto Francisco de Paula Ramos de Azevedo, que
também projetou a Pinacoteca e o Teatro Municipal de São Paulo. Na época, a
prefeitura alegou falta de verba para investir no imóvel. A ação não teve
julgamento definitivo e o prédio, abandonado, ameaça ruir.

Em Sorocaba,
o Ministério Público Estadual moveu ações para a recuperação do conjunto da
Sorocabana, construído há 143 anos. No fim de 2005, o prédio da estação e os
armazéns do entorno foram cedidos à prefeitura. Um dos armazéns abriga o Museu
de Arte Contemporânea de Sorocaba. O prédio principal continua abandonado.

 

Turismo

A ABPF ainda
conseguiu recuperar trechos ferroviários instalando trens turísticos, como o de
Campinas-Jaguariúna. No Estado, 45 estações e conjuntos ferroviários foram
tombados pelo patrimônio estadual. Mais 27 estão em estudo.

 

No País, há
55 mil imóveis sob análise

A Secretaria
do Patrimônio da União (SPU) informou que tem interesse em dar destinação
eficiente aos imóveis não operacionais da extinta Rede Ferroviária Federal
(RFFSA), mas ainda esbarra na falta ou precariedade de documentos relativos a
essas antigas estações. Conforme o órgão, o processo de desmembramento e
identificação, que precede a destinação, foi iniciado, mas é complexo e envolve
55 mil imóveis no País.

Leia mais: Desenvolvimento
nos trilhos foi essencial para crescimento populacional em MS

Fonte: https://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,historia-ferroviaria-paulista-vira-ruina-e-mpf-cobra-resgate-do-governo-federal,70002472306


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