Automóvel é mais uma vítima da pandemia

O despertador toca, a operadora de fábrica pula da cama, escova os dentes e veste seus trajes de trabalho. Pode ser um macacão ou calça e camiseta confortáveis, desde que já saia vestida de casa.

O vestiário da empresa não é mais uma alternativa segura. Se tem o hábito, faz um desjejum reforçado, senão, engole rápido a xícara de café. E sai de casa, não sem antes medir sua temperatura, nova tarefa incorporada à rotina das manhãs.

De todos os impactos causados pela pandemia do novo coronavírus, a repetição enfadonha desse nome é o sintoma mais leve.

A vida da trabalhadora – ou do trabalhador – que abre este texto mudou radicalmente, e não apenas na fábrica de veículos ou autopeças onde trabalha. Depois de encarar um período de isolamento, todos começam a sair de suas casas para um mundo diferente.   O fato é que a operadora de fábrica, que possivelmente teve seu salário reduzido por um período, não terá um colega sentado ao seu lado no ônibus da empresa, ou no refeitório na hora do almoço. Nem sequer a conversinha rápida no banheiro. Abraços e beijos nos amigos foram trocados por acenos. O cenário no local de trabalho é de prudência e prevenção. Há cartazes por todos os lados, recomendando o uso de máscara, cuidado ao espirrar e tossir e manter distância dos colegas.

Na Alemanha, a Volkswagen adotou um plano com cem pontos a serem observados no cuidado para evitar a disseminação do vírus. Onde é possível, materiais antes transferidos de pessoa para pessoa agora são coletados em contêineres.

Ao menos lá, será considerada parte da jornada de trabalho um tempo para limpeza de máquinas, ferramentas, telefones, teclados e superfícies usadas na montagem de componentes.

Essas medidas terão impacto nos custos e na produtividade da indústria, admite fonte da Anfavea, a associação das montadoras. A baixa produção, no momento, não será um problema.

O ritmo mais lento compensa a pequena demanda e reduz a pressão dos pátios lotados de carros à espera de compradores. Abril registrou queda de 76% nas vendas com relação ao mesmo mês do ano passado.

A produção teve queda de 99% no mês, e retrocedeu aos números de 1957, início das atividades da indústria automobilística no país.

E os efeitos da pandemia sobre esse setor da indústria vão além dos portões das fábricas. As instalações muito grandes de concessionárias foram perdendo o sentido com a redução de visitas de clientes.

Se o fenômeno já chamava a atenção por causa dos recursos digitais, o necessário distanciamento social esvaziou as lojas. E espaço custa caro. Interessados em comprar um carro podem assistir a vídeos, consultar opiniões de especialistas e consumidores e ir à revenda apenas para dar uma olhada final no modelo de sua escolha e fechar negócio. Ou nem isso: as empresas já se adaptam para entregar o carro na casa do cliente.

Mesmo as cidades começaram a discutir mobilidade com outro enfoque, ao se preparar para o pós-pandemia. O carro particular é visto como um casulo de proteção individual por muita gente, mas o transporte público ainda é a melhor alternativa – senão a única – para a maioria.

Bogotá, na Colômbia, Milão, na Itália, Berlim, na Alemanha, Budapeste, na Hungria, e Paris, na França, são algumas cidades que criaram ou ampliaram ruas exclusivas para pedestres e vias para bicicletas. A ideia é oferecer alternativas para quem pode caminhar e pedalar, deixando o carro em casa.

A mobilidade pós-pandemia, embora ninguém afirme com segurança quando e em que condições esse momento chegará, pode trazer o horizonte mais desafiador para a indústria automobilística em seus pouco mais de 130 anos de história.

Fonte: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/06/19/automovel-e-mais-uma-vitima-da-pandemia.ghtml

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*