Disparada da moeda favorece exportadores de produtos como soja, mas muitos sofrem com custos de insumos importados e dívidas em divisa estrangeira
BRASÍLIA e SÃO PAULO – A desvalorização do real este ano, acentuada pela superposição de crises sanitária, econômica e política no Brasil, favorece a competitividade dos produtos agrícolas brasileiros e o faturamento dos exportadores do setor. No entanto, a alta do dólar também gera desafios e até prejuízos para os produtores que demandam muitos insumos importados ou têm dívidas contraídas em moeda estrangeira no exterior.
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Só neste ano, o câmbio acumula alta da ordem de 33%. De acordo com Tarso Veloso, gerente da consultoria AgResource, muitos produtores não aproveitarão o bom momento do dólar, que, depois de ter começado do ano em R$ 4,02, chegou a R$ 5,90 e agora está por volta de R$ 5,35.
– Temos visto os primeiros balanços de empresas que fizeram hedge (instrumento financeiro de proteção cambial) de forma errada. Também há muitos produtores que se endividaram em dólar e correm o risco de quebrar mesmo com cotação boa e o dólar em alta – diz Veloso.
Fertilizantes vêm de fora Muitos produtores assumiram compromissos em dólar logo após a aprovação da reforma da Previdência, estimando uma queda do dólar, e agora sofrem para pagar, diz o consultor. Veloso observa que mesmo quem não tem dívida pode perder parte dos bons ventos para os exportadores. A cotação da soja no mercado internacional sofreu pouco este ano com a pandemia – queda de cerca de 3% desde janeiro – e foi compensada pelo câmbio.
– Quem fez tudo certo, vendendo a produção com planejamento no fim de ano, não vive este boom. O cenário está beneficiando quem deixou tudo para o fim, mas mesmo estes estão com problemas para lidar com a volatilidade: a velocidade com que o dólar passou de R$ 4 para quase R$ 6, e como está variando forte, torna toda decisão arriscada.
Renato Conchon, coordenador do núcleo econômico da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), lembra que mais de 90% dos adubos e fertilizantes usados no Brasil são importados. Se as importações foram feitas ainda no ano passado, para o plantio da safra atual em setembro, o impacto da desvalorização só será sentido com maior vigor na safra de 2021.
Outro revés do dólar alto é tornar mais caro o investimento em máquinas e tecnologias importadas.
Risco ambiental Segundo o presidente da Associação Brasileira dos Exportadores de Soja (Abrasoja), Bartolomeu Braz, há muitos casos de produtores que se prejudicaram com o câmbio pelo lado dos custos.
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– O câmbio tanto beneficia quanto atrapalha. Neste momento, com o dólar nos atuais patamares, mais atrapalha que ajuda. Temos muitos produtores que têm de saldar dívidas em dólar, contraídas no ano passado ainda, e os preços da soja em dólar estão baixos. Se não houver melhora do custo de produção, isso vai aniquilar a próxima safra – afirma ele.
Além do dólar e da delicada relação do atual governo brasileiro com a China, maior comprador da soja brasileira, a crescente desconfiança internacional sobre como o governo protege o meio ambiente do avanço da fronteira agrícola é outro risco para as exportações do setor. O tema é um dos obstáculos para que o acordo entre Mercosul e União Europeia, fechado no ano passado, saia do papel.
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