Uma área ainda desocupada no Porto de Santos tem sido alvo de disputa entre grupos interessados em construir novos terminais no local. Duas empresas privadas já estão no páreo, a Triunfo Participações e a Evolve Empreendimentos. Além delas, a própria Santos Port Authority (SPA), responsável pela gestão do porto, quer incluir a região em sua zona de influência.
As duas companhias já protocolaram pedidos para ficar com a área. Porém, ambos processos estão parados, à espera do avanço dos estudos de desestatização do porto, que ainda estão em fase inicial. Ainda assim, nas últimas semanas, as empresas têm trocado acusações nos bastidores.
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A área em questão é a Ilha de Bagres, na margem esquerda do porto. A ideia de construir um terminal no local não é nova: esse mesmo terreno já foi centro de um escândalo de corrupção envolvendo o ex-senador Gilberto Miranda, em 2012, que detinha o direito de exploração – à época, houve uma acusação de tráfico de influência para a obtenção dos pareceres favoráveis ao empreendimento portuário.
Com as investigações, Miranda acabou perdendo o direito de explorar o terreno, que ficou novamente disponível. A partir daí, os grupos passaram a pleitear ao governo a cessão do espaço, para a construção de terminais de uso privado (TUPs).
Empreendimentos, uma empresa desconhecida no setor que tem como sócio Emerson Conrado. Um dos responsáveis que assina do projeto é Delvan Monteiro – ele foi consultor exclusivo da Santos Brasil entre 2001 e 2009 e, desde então, já atuou com outras empresas do segmento, como a Ageo.
O projeto do grupo seria construir um complexo portuário com quatro terminais – de contêineres, fertilizantes, grãos e combustíveis -, além de novos acessos rodo e ferroviários. As obras exigiram investimentos de ao menos R$ 5 bilhões.
O plano da empresa é, primeiro, conseguir o contrato de adesão junto à Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), que dá o direito a explorar a área. Na sequência, buscariam investidores no mercado. Pessoas próximas à Evolve dizem que já haveria conversas engatilhadas com fundos estrangeiros.
O grupo chegou a obter licenças ambientais e administrativas, mas travou no Ministério de Infraestrutura, devido aos planos de privatizar o Porto de Santos. A pasta alegou à companhia que seria preciso esperar a modelagem da desestatização para então dar uma resposta ao pleito.
Em paralelo, em setembro deste ano, a Triunfo também entrou com um pedido para utilizar a área. A ideia do grupo é fazer um terminal de contêineres no terreno, que é vizinho a outras duas áreas que já são da empresa.
Com as três áreas, o plano da Triunfo seria montar um complexo portuário, formado pelo terminal em Bagres, o Terminal Brites (um projeto que está travado há anos por conta de uma ação civil pública) e o TPL (Terminal Portuário Logístico).
Em outubro, a Triunfo recebeu a mesma resposta dada à Evolve – de que o processo ficaria suspenso devido aos estudos de desestatização do porto.
Ainda assim, o surgimento da nova proposta acendeu um alerta na Evolve, que tem feito acusações de que a outra companhia estaria sendo beneficiada.
A empresa se queixa de ter protocolado seu projeto com meses de antecedência em relação à Triunfo, e que só não conseguiu avançar por falta de um aval do Ministério de Infraestrutura. Agora, a vantagem será zerada, e as duas propostas terão que passar por uma concorrência.
Quando há mais de um pedido de implantação de terminais privados para uma mesma área, cabe à Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) fazer um processo seletivo. Os critérios adotados podem incluir a maior capacidade de movimentação, o menor preço, entre outros fatores definidos pela agência.
Com a perspectiva de concorrência, a Evolve já se prepara para judicializar o pleito, caso o projeto da Triunfo seja aprovado, segundo uma fonte.
De outro lado, pessoas próximas à Triunfo rebatem as acusações de favorecimento, e apontam que a Evolve seria uma espécie de fachada de outro grupo, que teria o intuito de barrar o novo terminal de contê ineres.
A Evolve também nega que seja representante de qualquer companhia ou investidor oculto.
O Ministério de Infraestrutura afirma que os processos da Evolve e da Triunfo encontram-se na mesma situação, suspensos até que haja uma análise quanto a eventuais reflexos na desestatização do porto, e que não há qualquer tipo de distinção entre as duas propostas.
Na verdade, o próprio governo hoje é um candidato a ficar com a Ilha de Bagres. Em paralelo a essa disputa, há planos para que a área seja entregue à SPA e que a autoridade portuária desenvolva seu próprio projeto de novos terminais no local, afirma uma fonte do governo.
Esse movimento poderá ser feito no âmbito da desestatização da companhia docas. A proposta, porém, ainda não está madura. Inclusive porque os próprios estudos de modelagem da privatização, conduzidos por uma equipe contratada pelo BNDES, estão em fase muito inicial.
Além disso, para efetivar a incorporação da ilha, seria preciso alterar a poligonal do porto (traçado que define quais áreas estão sob influência da companhia docas). Hoje, o terreno está fora dessa zona e, por isso, disponíveis a possíveis terminais privados. Além da Ilha de Bagres, o Largo do Caneu também poderá ser alvo da expansão do porto organizado, segundo a fonte.
Por fim, na SPA tampouco há clareza sobre qual tipo de carga poderia ser transportada na área. Uma possibilidade seria fazer um terminal de contêineres, uma carga considerada adequada à geografia do local. Porém, a percepção é que hoje, até por conta da pandemia, é muito difícil traçar projeções de demanda para o longo prazo. Há ainda uma miríade de possibilidades para a área, que ainda seriam alvo de estudos pela equipe.
Em relação a esses planos, o ministério e a SPA afirmaram que a autoridade portuária tem participado ativamente das discussões técnicas e se manifestará oportunamente com relação a uma eventual expansão das áreas do Porto de Santos considerando a política pública de desestatizações em andamento.
Fonte: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/11/16/ilha-no-porto-de-santos-e-alvo-de-disputa.ghtml
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