Principal locomotiva do agronegócio brasileiro, a soja foi, entre as commodities agrícolas que o país mais exporta, a de maior valorização no mercado internacional em 2020. E, no que depender da demanda da China, principal motor dessa escalada, o elevado patamar poderá se manter em 2021, de acordo com indústrias e analistas – a menos que a produção americana dispare na próxima temporada (2021/22).
Segundo cálculos do Valor Data, na bolsa de Chicago os contratos futuros de segunda posição de entrega do grão aumentaram 37,2% no ano. Em dezembro, a média mensal, que cresceu 30,9% em relação à de um ano antes, foi a mais alta desde junho de 2014.
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A ascensão começou em junho e ganhou força em setembro, quando a colheita desta safra 2020/21 teve início nos Estados Unidos. Com a demanda chinesa pela soja americana aquecida, as cotações primeiro romperam os US$ 9 por bushel (medida equivalente a 27,2 quilos), passaram por cima das barreiras de US$ 10, US$ 11 e US$ 12 e, na semana passada, chegaram a US$ 13.
A China lidera a importação global do grão, e os EUA são os segundos maiores exportadores. O Brasil encabeça produção e embarques. Além de terem sido beneficiados pela alta dos preços, os sojicultores brasileiros contaram com o câmbio favorável para obter margens polpudas e ampliar investimentos.
Com a conjunção favorável, o valor bruto da produção (da porteira para dentro) bateu recorde em 2020 (R$ 328,6 bilhões, segundo o Ministério da Agricultura) e as exportações do grão voltaram a crescer (US$ 28,8 bilhões, conforme a Abiove). Para 2021, novas máximas são esperadas nas duas frentes.
A produção recorde prevista para esta safra 2020/21 (134,5 milhões de toneladas, de acordo com a Conab) começará a ser colhida em janeiro, e a pressão sobre as cotações internacionais será inevitável.
Segundo Luiz Fernando Roque, analista da Safras & Mercado, o foco do mercado está no clima no Brasil e eventuais adversidades terão reflexos sobre os preços. Ainda temos um período importante de desenvolvimento de lavouras e estamos em um ano de La Niña em que pode faltar chuva, afirmou.
Do lado da demanda, as importações da China ainda aquecidas na temporada (o total chegará a 100 milhões de toneladas, nas contas do USDA), alavancadas pela demanda da indústria de aves e suínos por rações, tendem a ser um colchão para os preços – a Abiove, que representa exportadores brasileiros, prevê preço médio de US$ 410 por tonelada em 2021, ante US$ 350 em 2020.
Essa forte demanda também fez a diferença no mercado de milho em 2020 e continuará a sustentar as cotações em 2021. Apesar de ser um grande país produtor (serão 260 milhões de toneladas em 2020/21, segundo o USDA), a China começa a se tornar um importador relevante do cereal (16,5 milhões de toneladas em 2020/21).
E foi o aumento de suas compras do produto americano que turbinou as cotações em Chicago. De acordo com o Valor Data, os papéis de segunda posição do milho subiram 22,4% na bolsa em 2020 e fecharam dezembro com média mensal 13,1% maior que a do mesmo mês do ano passado, no maior nível desde junho de 2019.
Ainda que não venda milho à China, o Brasil é um grande exportador (33,8 milhões de toneladas em 2020, conforme a Anec) e poderá se beneficiar da suspensão dos embarques da Argentina até março. Os produtores brasileiros ganharam, ainda, com o aumento das vendas domésticas para a indústria de frango e suínos, também grande exportadora – sobretudo à China.
A expectativa é que esse cenário perdure, para atender à já robusta produção chinesa de frango e à recuperação de sua indústria de suínos, que está se levantando do tombo provocado pela peste africana em 2018, 2019 e parte de 2020.
Se, como se viu, esses grãos básicos para a alimentação humana e animal já passaram vacinados pela pandemia, a expectativa é que a retomada da economia global também tenha reflexos altistas sobre os preços. O mesmo efeito é esperado nos mercados das soft commodities, que também resistiram à crise da covid-19 e encerram 2021 com preços sustentados.
Na bolsa de Nova York, a soft que mais subiu no ano foi o suco de laranja, considerado por consumidores de diversos países, sobretudo dos EUA e da Europa, como um bom escudo contra o novo coronavírus – embora não existam evidências científicas sobre isso.
Conforme o Valor Data, os contratos de segunda posição do suco de laranja concentrado e congelado (FCOJ), cujos embarques mundiais são dominados pelo Brasil, subiram 25,8% de janeiro a dezembro. O valor médio no último mês do ano foi 22% superior ao de dezembro de 2019.
O algodão, por sua vez, subiu 12,1% em 2020 e registrou, em dezembro, média 11,1% maior que a do mesmo mês de 2019. A recuperação do petróleo colaborou, e agora a retomada da indústria têxtil global pode oferecer suporte.
Para açúcar e café, que também têm o Brasil como maior exportador, as chuvas escassas nos últimos meses no Centro-Sul do país podem maximizar altas caso as demandas sigam firmes, e os sinais atuais indicam que isso deverá ocorrer.
Os papéis de segunda posição do açúcar avançaram 8,4% em 2020 e atingiram em dezembro valor médio 4,4% maior que um ano antes. No café, houve queda de 1,3% no ano e a média de dezembro foi 5,3% menor que a do mesmo mês de 2019.
Receita nos EUA
Em 2020, ano marcado pela crise da covid-19, recursos concedidos pelo governo foram responsáveis diretos pelo bom desempenho financeiro das propriedades rurais nos EUA. O apoio de Washington respondeu por quase 40% da receita líquida das fazendas – que cresceu 43% ante 2019, para US$ 119,6 bilhões, segundo o Departamento de Agricultura do país (USDA). Os recursos que os fazendeiros receberam do governo, na forma de pagamentos diretos, chegaram a US$ 46,5 bilhões, montante 107% maior que o de 2019. Os dois programas de segurança alimentar criados para contrabalançar os efeitos da crise do novo coronavírus responderam por US$ 24,3 bilhões. Já o Paycheck Protection Program (PPP), lançado para evitar demissões em micro e pequenas empresas, assegurou aos produtores mais US$ 5,9 bilhões.
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