O papel crucial da COP28 e um Plano Diretor das Ferrovias 2024-2054

Sérgio Avelleda
é sócio-fundador da Urucuia: Mobilidade Urbana e coordenador do Núcleo de Mobilidade Urbana do Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper

A Conferência das Partes (COP) é um evento global que desempenha um papel fundamental na discussão e implementação de medidas para combater as mudanças climáticas. A COP28, que acontece enquanto escrevo este artigo, será um marco crucial para o Brasil, não apenas em termos de compromissos ambientais, mas também em relação aos investimentos necessários para atingir metas sustentáveis. Uma área particularmente relevante é o setor de transportes sobre trilhos, cujo desenvolvimento pode desempenhar um papel significativo na redução das emissões de gases de efeito estufa no país. Nos últimos quatro anos, o Brasil se posicionou como pária do palco da mobilização global em torno da descarbonização e dos investimentos para a sustentabilidade. Basta lembrar que o Fundo Amazônia foi desprezado e imobilizado.

A COP28 oferece uma plataforma para o Brasil reafirmar seu compromisso com a redução das emissões de gases de efeito estufa e a transição para uma economia de baixo carbono. O país enfrenta desafios significativos relacionados ao desmatamento, queimadas e emissões provenientes do setor de transportes. Nesse contexto, a conferência representa uma oportunidade crucial para o Brasil apresentar políticas e projetos inovadores que abordem essas urgentes ações em favor da sustentabilidade.

Os transportes sobre trilhos têm sido reconhecidos como uma alternativa sustentável e eficiente em comparação com os modos de transporte tradicionais, especialmente no que diz respeito à redução de emissões de carbono. O Brasil, um país vasto e diversificado, pode se beneficiar significativamente ao investir em sistemas ferroviários modernos e ambientalmente amigáveis.

Sistemas ferroviários são conhecidos por serem mais eficientes energeticamente e produzirem menos emissões por passageiro transportado em comparação com veículos movidos a combustíveis fósseis. O Metrô de São Paulo, sozinho, economiza por ano 618 mil toneladas de CO2 na atmosfera. Cada passageiro contribui com uma redução de 3g de CO2 por quilômetro percorrido.

Investir em sistemas ferroviários urbanos pode contribuir para a redução do congestionamento nas grandes cidades, melhorando a mobilidade e diminuindo o número de veículos individuais nas estradas. A operação das linhas do Metrô de São Paulo economiza 136 milhões de reais por ano em sinistros de trânsito.

O transporte de carga por ferrovias é uma opção mais sustentável em comparação com o transporte rodoviário, reduzindo a pegada de carbono associada à logística de mercadorias. Apesar das vantagens evidentes, a expansão dos transportes sobre trilhos no Brasil enfrenta desafios, como a necessidade de investimentos significativos em infraestrutura, a superação de obstáculos regulatórios e a integração eficiente com outros modos de transporte.

Ainda não temos um Plano Diretor das Ferrovias, onde deveríamos planejar a expansão e modernização de nossa malha ferroviária, tanto de passageiros como de cargas, de longa distância e urbana, para os próximos 30 anos, por exemplo. Que sonho seria, nos próximos meses, o governo federal, os estados e grandes cidades, aliados ao setor produtivo, à sociedade civil e à academia, reunidos em um Grupo de Trabalho, elaborarem o Plano Diretor das Ferrovias do Brasil, definindo os investimentos que serão realizados nos próximos anos, reservando uma parcela dos orçamentos públicos, assim como desenhando a participação privada. Todos saberíamos os próximos passos nos 30 anos seguintes, permitindo planejamento, engajamento e execução eficientes. Que impacto soberbo isso teria na indústria, no meio ambiente, na logística e na eficiência do nosso país.

Os poucos investimentos são feitos como solavancos de carro quase sem bateria. Vamos resolvendo o que parecer ser mais urgente conforme demandas e necessidades regionais. É preciso organizar o investimento assegurando sua perenidade e enxergando as prioridades como partes de um grande plano nacional de desenvolvimento da logística de carga e do transporte de passageiros. Pode ser até que os valores a serem aplicados não sejam exatamente aqueles dos nossos sonhos. Mas ao sabermos de antemão quais os investimentos prioritários para os próximos 30 anos, de que forma os recursos serão assegurados, podermos planejar o tamanho da indústria, os ganhos de eficiência e, com resultados positivos, alavancarmos ainda mais recursos e esforços.

Precisamos olhar o problema como fez Juscelino Kubitschek ao criar o seu programa de metas. O projeto definia os objetivos (eram 30), organizados em cinco setores: energia, transporte, indústria, educação e alimentação.

O envolvimento do setor privado, por meio de parcerias público-privadas, pode desempenhar um papel vital na superação desses desafios. A atração de investimentos privados não apenas alivia a pressão sobre os recursos públicos, mas também traz expertise e eficiência na implementação de projetos de transporte sobre trilhos.

A COP28 oferece ao Brasil uma oportunidade única para consolidar seu compromisso com a sustentabilidade ambiental e promover investimentos estratégicos em setores- chave, como os transportes sobre trilhos. Ao abordar desafios específicos e aproveitar as vantagens dos sistemas ferroviários, o Brasil pode não apenas cumprir suas metas climáticas, mas também impulsionar o desenvolvimento econômico sustentável e melhorar a qualidade de vida de sua população.

Para que a COP28 não seja mais uma grande frustração, como bem disse o Presidente da República em relação às conferências anteriores, poderia ele mesmo, por decreto, criar o Grupo de Trabalho que, com senso de urgência e prioridades, em seis meses poderia nos brindar com o Plano Diretor das Ferrovias 2024-2054. Por que não fazer?


2 Comentários

  1. Para nós que viemos do setor ferroviário, toda proposta que possa trazer mais satisfação ao usuário com o serviço prestado é benéfica. Propostas que tragam benefícios para o público, para o país e para os setores empresariais envolvidos gerando empregos.

  2. Mais um excelente tema trazido pelo mestre Sérgio Avelleda, referente a COP-28 e um futuro Plano Diretor das Ferrovias. O renascimento do setor ferroviário no Brasil não apenas seria útil na questão da mobilidade urbana e sustentabilidade, como também no fator da geração de novos empregos no setor metroferroviário. No Rio de Janeiro, por exemplo, há uma escassez total de ofertas de emprego na área metroferroviária, afinal, é um Estado onde pouco se investe nesta área, diferente do que vemos por exemplo em São Paulo e outras Unidades da Federação. Vivo essa escassez na pele: sou ferroviário, com uma pós e um MBA na área e não consigo emprego no estado do Rio. Para voltar a trabalhar no setor, serei obrigado a mudar para outro Estado. Havendo incentivo, investimento e a execução de um Plano Diretor para a Ferrovia, tudo irá girar melhor dentro do ambiente metroferroviário brasileiro. Fica aí a torcida por dias melhores para este importante modal em nosso país.

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