Valor Econômico – O governo federal fechou parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para estudos de viabilidade relacionados a 10,7 mil quilômetros de ferrovias sem operação. A estatal Infra S.A., ligada ao Ministério dos Transportes, firmou contrato de R$ 29 milhões com o banco para levantar as informações que vão nortear os modelos de exploração dessa malha.
Os trechos estudados são da Rumo Malha Sul, Ferrovia Centro-Atlântica (FCA) e Ferrovia Transnordestina Logística (FTL) e passam por 17 Estados e o DF, correspondendo a um terço de toda malha ferroviária do país.
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A devolução dos ativos envolverá o pagamento de indenização pelas concessionárias, por não manterem as linhas em operação. A precificação feita pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) aponta para o pagamento acima de R$ 20 bilhões. A conta considera o valor de R$ 2 milhões por cada quilômetro devolvido.
O contrato com o BID prevê a elaboração dos estudos de pré-viabilidade e dos chamados Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (Evteas), que ficarão prontos dentro de seis e 12 meses, respectivamente.
“São vários os modelos que podem ser apresentados a partir do estudo. Uma concessão de um trecho menor, uma autorização pública para alguém que tem interesse naquele trecho. Podem transformar o trecho que talvez tivesse um perfil mais para o transporte de carga para o de passageiros, em virtude de um eventual adensamento das cidades”, exemplificou o ministro dos Transportes, Renan Filho, ao Valor.
O especialista principal de PPP do BID, Pablo Pereira dos Santos, ressalta que não é possível falar de modelos de exploração antes de concluir o Evtea. “O que a gente espera é que os estudos indiquem caminhos para potencializar o uso dessas ferrovias que, afinal de contas, elas já estão lá”, disse, em entrevista ao Valor. Segundo ele, o banco oferecerá sua experiência internacional no desenvolvimento de projetos.
“O Brasil é o país que mais faz infraestrutura com participação privada no mundo em desenvolvimento – arriscaria dizer que no mundo como um todo. Ao longo do tempo, o país foi percebendo os ganhos que esse modelo traz, tanto para a qualidade para os serviços como para a população em geral”, disse Santos.
A Infra S.A. entrará com a base de dados do Plano Nacional de Logística (PNL) e do Observatório Nacional de Transporte e Logística (ONTL) para auxiliar na elaboração dos estudos. Serão feitas reuniões com o setor produtivo e visitas de campo para avaliar o estado da malha ferroviária e as demandas locais.
Em nota, o diretor-presidente da Infra S.A., Jorge Bastos, se referiu aos trechos como “ativos valiosos que, com os investimentos certos, podem gerar retornos expressivos em termos de eficiência logística, competitividade econômica e desenvolvimento regional”. Para ele, muitas dessas linhas podem “integrar pequenos produtores ao mercado global”.
Técnicos do governo avaliam que produtores de celulose ou cooperativas de produtores agrícolas podem, por exemplo, reativar trechos que demandam menos investimentos ligados a grandes troncos em operação.
O diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Rafael Vitale, alerta para o risco com os prazos para concluir as negociações, pois as concessões encerram entre 2026 e 2027. Se a renovação de contrato ou acordo não sair em tempo, todo o esforço pode ser perdido.
“É importante estudar as ferrovias de maneira integrada”, afirmou Vitale, ao se referir à necessidade de buscar outras soluções para a malha ociosa “no caso das negociações serem frustradas”.
Os trechos não operacionais da FCA, relacionado à Malha Centro-Leste, somam 4.652 quilômetros, da FTL, mais 3.055 quilômetros da FTL e da Malha Sul, outros 2.972 quilômetros.
Procurada, a VLI informou que a devolução está sendo tratada no âmbito do processo de renovação antecipada da concessão da FCA. “Essa alternativa é prevista no marco regulatório e visa à proteção e à melhor utilização do bem público que eventualmente não esteja em uso pela concessionária e que pode receber novos usos.”
A Rumo informou que mantém “diálogo constante” com o governo e explicou que os trechos não operacionais são resultado da mudança, ao longo das décadas, da dinâmica dos ciclos econômicos do país e da migração geográfica das cadeias produtivas que alteraram origem e destino das cargas. A FTL informou que não iria comentar.
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