BNDES vê ritmo menor no crédito com alta da Selic

Valor Econômico – Com expectativa de continuidade de alta da Selic em 2025, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) vê mais dificuldades para manter o ritmo de crescimento das operações de crédito este ano. Ocorre que o aumento da taxa básica de juros tende a desacelerar planos de investimento das empresas, muitas das quais se financiam no BNDES.

A possibilidade de retração da demanda por crédito, em função da alta da Selic, pode prejudicar a meta da atual administração, de elevar os desembolsos da instituição ao patamar de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2026, na visão de analistas e fontes do BNDES ouvidas pelo Valor.

Os números de desembolso do banco em 2024 ainda não são conhecidos, mas o diretor financeiro e de mercado de capitais do BNDES, Alexandre Abreu, adianta, sem entrar em detalhes, que vão superar os do ano anterior. Até setembro de 2024, dado mais recente disponível, o banco havia desembolsado R$ 87 bilhões, alta de 15% ante igual período de 2023.

Naquele ano, o BNDES emprestou R$ 114,3 bilhões, o equivalente a 1% do PIB. O número foi superior ao registrado em 2022, quando o banco desembolsou R$ 102 bilhões, o equivalente a 0,97% do PIB, a valores constantes (corrigidos pela inflação).

Abreu avalia que os indicadores operacionais do último trimestre de 2024 devem refletir os efeitos da alta da Selic: “Os juros ainda não haviam impactado as operações de forma muito forte até setembro, mas é provável que haja impacto a partir do último trimestre [de 2024] porque foi quando o efeito do aumento das taxas de juros começou a ser sentido”, disse sem antecipar o resultado financeiro da instituição, ainda sem data para ser divulgado.

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central começou em setembro o atual ciclo de alta dos juros. Na última reunião, em 11 de dezembro, o Copom acelerou a alta da Selic, para 12,25% ao ano, e sinalizou que deve elevar a taxa em um ponto percentual em cada uma das próximas duas reuniões. “À medida em que se aumenta o custo de financiamento, é lógico que se reduz a proporção de projetos que têm condições de sustentar taxas mais elevadas. Então, em princípio, isso representa um efeito negativo sobre o volume de financiamento”, diz Carlos Antonio Rocca, coordenador do Centro de Estudos do Financiamento das Empresas Brasileiras da Fipe (Cefeb-Fipe).

Como efeito, o BNDES projeta um cenário de mais dificuldade para emprestar em 2025, caso os juros continuem subindo. “As empresas vão pensar melhor antes de tomar crédito. Até porque o recurso do BNDES é praticamente todo em juros de mercado. Então ele é afetado pela alta da Selic”, diz Abreu. A taxa de referência para os empréstimos do banco é a Taxa de Longo Prazo (TLP), que reflete a média da NTN-B de cinco anos, apurada sempre ao fim de cada mês para o período seguinte. Esse título é um dos que mais têm subido no atual ciclo de alta da Selic, dizem fontes do mercado.

A diretora de infraestrutura, transição energética e mudança climática do BNDES, Luciana Costa, diz que há um cenário desafiador para o setor: “Neste momento, alguns investidores estão revendo a decisão de investimento porque o aumento das taxas de juros tem um impacto negativo no retorno. É um cenário adverso para a área de infraestrutura.” No começo de dezembro, o Valor já havia mostrado que os projetos de infraestrutura têm captado no mercado três vezes mais do que com o BNDES, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima)

O Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) é a principal fonte de recursos do BNDES. Desde 2018, o FAT é remunerado pela TLP, que tem como base os juros de mercados vinculados à NTN-B mais a variação do IPCA, o que eliminou os subsídios nas operações do banco. A implementação da TLP substituiu a TJLP e fez parte de uma guinada no papel do BNDES iniciada no governo Michel Temer (MDB). Desde então, os desembolsos do banco também registraram uma trajetória de queda, que continuou no governo de Jair Bolsonaro (PL).

Sob o novo governo do PT, a diretoria comandada pelo presidente Aloizio Mercadante definiu como meta elevar os desembolsos do BNDES para 2% do PIB até 2026. Abreu diz que o banco tem condições técnicas de atingir o objetivo, devido aos indicadores de inadimplência e basileia, mas depende essencialmente da demanda: “E a demanda vai existir à medida em que as taxas de juros caírem. Se a taxa de juros estivesse menor, principalmente a real, a gente estaria caminhando para atingir essa meta.”

Rocca diz que apesar de o FAT ser a fonte de recursos majoritária, o BNDES pode priorizar linhas que não sofrem um impacto tão forte da Selic. Para ampliar o crédito e oferecer condições mais vantajosas, a atual gestão do banco tem recorrido a captações externas e fundos públicos, estratégia que deve ser mantida em 2025: “A gente espera conseguir alguma coisa mais em conta e ter condição de suprir um pouco melhor a  necessidade de recursos através desses fundos e linhas mixadas com recursos de mercado ”, afirma Abreu.

“Além disso, houve no fim de 2024, a regulamentação da Letra de Crédito de Desenvolvimento (LCD), que é mais uma fonte de captação que pode ser explorada pela instituição”, diz Guilherme Almeida, analista da Suno Research.

Para Sérgio Lazzari, professor do Insper, o destino dos desembolsos é mais importante do que o volume em si. “Mesmo com um volume menor, o impacto social dos desembolsos pode ser relevante se suprirem empresas com alta restrição de crédito e buscarem projetos com externalidades [efeitos] positivas, como ambientais e tecnológicos”, afirma. E completa: “Volume de desembolsos é produto, e não resultado.”

Fonte: https://valor.globo.com/financas/noticia/2025/01/09/bndes-ve-ritmo-menor-no-credito-com-alta-da-selic.ghtml

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